Header Ads

Entrevista DOP - Rita Pacheco

Fotografia: Carlos Alves

Rita Pacheco é a primeira convidada da quinta edição da Entrevista DOP, uma rubrica entre o Dança Oriental Portugal e o Fantastic. Nesta entrevista, ficamos a conhecer melhor o seu percurso, a importância que a formação em Educação Física tem no seu trabalho enquanto professora e bailarina, as especificidades e desafios de dançar em feiras medievais e a sua opinião sobre a qualidade e evolução da Dança Oriental em Portugal.

Como surgiu a tua paixão pela Dança e, em particular, pela Dança Oriental?
A minha paixão pela Dança começou, precisamente, com a flauta do “Aladdin” da Disney naquele início do filme. A fumaraça que dá origem ao lettering inicial foi algo extremamente revelador para mim. Senti que já conhecia aquelas ondulações, aquele estilo característico de notas musicais... Depois veio a era das Spice Girls e das coreografias e eu queria era dançar, além de que, quando eu tinha 11 anos, veio a minissérie “Arabian Nights”, que começa com uma mulher a dançar uma “espécie de” Dança Árabe na mão dele e, mais para a frente, a famosa Morgiana a fazer uma Dança da Espada e a matar o Black Coda, o inimigo do seu mestre, Ali Baba. Aquelas sonoridades, movimentos, vestes, ficaram-me tanto na memória que me lembro de jurar a mim mesma que ainda iria ter a minha cimitarra e fazer aquela dança... E atualmente é das vertentes da DO que mais gosto!

Fizeste Licenciatura e Mestrado em Ciências do Desporto e em Ensino de Educação Física, respectivamente. Quais os conhecimentos e ferramentas que te forneceram para a tua actividade enquanto bailarina e professora de Dança Oriental?
Todos e mais algum. Não só ao nível de motricidade e fisiológicos, mas também a própria didática e metodologia de planeamento de aulas nos planos micro, médio e macro (anual, trimestral, diário, etc). Uso os conteúdos pedagógicos e, até, curriculares para desenvolver um método de ensino aliado aos meus objetivos enquanto professora mas, ao mesmo tempo, uma espécie de mulher medicina, já que as minhas aulas de Dança Oriental não se cingem ao trabalho técnico, histórico e coreográfico, mas também ao alinhamento energético, autodescoberta e autoestima através da Dança.

Quando e como é que decidiste tornar-te bailarina e, posteriormente, professora de dança?
Eu sempre quis trabalhar com a Dança profissionalmente, sem nunca viver exclusivamente dela. Sei que se calhar sou diferente de muitas pessoas deste mundo, e de uma geração que acha que quem não é bailarina a 100% e em regime de full-time não é, efetivamente, profissional, ou é uma semi-amadora ou semi-profissional. Mas a verdade é essa: eu sempre quis trabalhar como bailarina e professora de dança E com outras coisas, que, entretanto, com as mudanças da vida também foram perdendo fogo dentro de mim. Ser Professora de Educação Física, Organizadora de Eventos, Terapeuta Holística, e agora até Gestora de Redes Sociais são coisas que tenho vindo a desenvolver com o tempo e que sinto que, quanto mais evoluo de um lado, mais evoluo nas outras áreas todas da minha vida profissional, a tal vida de Multipotentialite da qual não consigo abdicar. Ah!, p’ra quem não sabe que termo é este, “Multipotentialite é um termo educacional e psicológico que faz referência à habilidade e preferência de uma pessoa, particularmente com forte curiosidade intelectual e/ou artística, em alcançar sucesso em duas ou mais áreas” (Wikipédia).



Há vários anos que danças em Feiras Medievais acompanhada por música ao vivo. Quais as especificidades e os desafios entre dançar neste contexto e em outros eventos públicos (bares, restaurantes)?
Eu adoro o trabalho das Feiras Medievais. Ponto. É o meu tipo de trabalho preferido. Como boa aquariana que sou, adoro ouvir a música e improvisá-la. Muitas vezes nós, bailarinas, somos colocadas muitas vezes com grupos de música que desconhecemos, e estamos em contacto direto com o público, sem efeitos de luzes. Na verdade, no meu caso, não há somente improviso porque eu durante todo o Inverno ouço as músicas dos meus colegas, nos seus álbuns no Spotify ou mesmo comprados, e acabo por ter pedaços coreografados que depois aplico na prática quando nos colocam em parceria. Fora isso, é um trabalho que apenas exalto que deveria ser dignificado e sinto que não o é: as pessoas, mesmo colegas de profissão muitas vezes, não têm noção do trabalho que aquilo dá.

Como caracterizas o teu estilo de dança?
Orgânico. Não há outro nome mesmo. A verdadeira “Ghaziya”. Tenho um movimento muito simples e orgânico e uma dança ainda pouco estruturada. Apesar de ter bases de ballet e outras danças que fiz desde os meus 13 anos, noto que a minha linguagem corporal natural opta por não as incluir intuitivamente, daí ter começado a fazer mais aulas com professoras cuja arte vejo ter já uma rotina, estrutura e diversidade que gostaria de incorporar na minha.

Que impacto teve o COVID-19 no teu trabalho de dança?
No meu caso só teve coisas boas. Treinei imenso em casa, fiz imensas aulas com professores internacionais, tive imensos feedbacks, trabalhei até o meu Marketing Digital e estruturei o meu “NADI By Rita” intensivo em formato totalmente online, um produto que penso que ainda não existia em Portugal, onde trabalhamos a nossa parte energética e o alinhamento dos Chakras através de movimentos da Dança Oriental. Integramos a Arte e a Espiritualidade, que a meu ver e naquilo em que acredito, é totalmente impossível de dissociar. Obviamente que estive 2 anos sem fazer feiras medievais, mas prefiro concentrar-me nos aspetos positivos e em toda a mudança que este problema mundial me trouxe, particularmente.

Fotografia: Carlos Alves

Praticas Dança Oriental desde 2012. Qual a tua opinião sobre a evolução do ensino da Dança Oriental em Portugal nestes 11 anos?
Evoluiu imenso e acho que há muito a exaltar. Nós, aqui em Portugal, temos uma nova geração de bailarinas que não vive exclusivamente da Dança e da Arte, e mesmo assim, a trabalhar quase em regime de part-time, a acumularem funções noutros trabalhos que desempenham por necessidade ou, inclusivamente, por vontade própria porque, como eu, não têm só uma vocação, conseguem estar ao mesmo nível dos que, lá fora, só vivem disto. Isto, para mim, é o verdadeiro milagre e o verdadeiro esforço: fazer o mesmo, sem as mesmas condições que os outros têm, na maior parte das vezes. Têm um nível de qualidade reconhecido lá fora e só têm, muitas vezes, tempo para treinar como eu treino se calhar, às 2h da manhã, com o meu pijama, phones nos ouvidos e abafadores nos sagats para não chatear os vizinhos. Se pararem um pouco para pensar, o verdadeiro amor à Arte é exatamente isto: não viver dela, e mesmo assim ter o mesmo nível de disciplina, comprometimento e vontade que quem vive tem. E acho que só por aí, Portugal já venceu na taxa de evolução relativamente a muitos outros países.

Quem são as tuas maiores referências artísticas?
Mahaila El Helwa, a minha atual professora, Sílvia Brazzoli, Valquíria Hayal, Aida Bogomolova, Gitza Estrada... mas acho que a minha maior referência mesmo é e sempre será Joana Saahirah. Acho que Portugal nunca lhe deu o verdadeiro mérito e para mim o que ela diz é Lei: a Joana é uma bailarina com movimento notoriamente estudado e trabalhado, mas que vem de dentro. É a bailarina com mais conhecimento de todos nós e, no entanto, a que mais desconstrói e sai da caixa. É uma mulher que se doa, inteira, à Dança Oriental e ao Mundo. Não há NINGUÉM em Portugal que dê tanto como ela, de forma gratuita, basta estar atentos às suas redes sociais. Quando ela publica um vídeo a dançar, eu delicio-me... porque ela é diferente, sem fazer mais do mesmo. E isso para mim chega para me inspirar nela todos os dias e ouvir os seus vídeos e conselhos no YouTube até a limpar a casa.

Já fizeste formação com inúmeros professores renomados na área da Dança Oriental, Danças Populares e Folclores Árabes. O que procuras quando te inscreves em aulas, cursos e workshops?
Tudo menos aprender coreografia. Tenham lá paciência: eu quero ir APREENDER para depois, de forma autónoma, DESENVOLVER em mim, e não espetar um chapa 5 do que quer que seja onde eu for aplicar. Obviamente que tem que haver alguns workshops de carácter de repertório coreográfico, mas eu pessoalmente prefiro pagar a alguém para me desenvolver uma coreografia, e posteriormente a outro, e ir depois incorporando o repertório que aprendi noutras músicas, adaptando, por exemplo. Eu quero acima de tudo transmissão de conhecimentos quando vou a um workshop. Quero o limão, a matriz... O sumo depois eu faço sozinha.



Que características achas indispensáveis numa professora de Dança Oriental?
Ela tem que entender que ali estão seres humanos, acima de tudo. Mulheres com dúvidas, incertezas, sonhos realizados e por realizar... Tem de entender que mais do que um conteúdo de Dança Oriental a ser ensinado, há um grupo de pessoas, ou uma pessoa individual, que pode ter necessidade de outro tipo de abordagem, de outro tipo de matérias... E daí o meu trabalho como professora no meu estúdio online não girar em torno da DO, mas sim girar à volta das minhas alunas em si, sendo a DO uma ferramenta, apenas.

Qual a tua visão sobre o nível de dança das bailarinas nacionais que se dedicam à Dança Oriental?
Como já referi anteriormente, é incrível, face às condições que temos, e às outras profissões todas que a maior parte de nós acumula. Conseguimos fazer o mesmo com muito menos e isso, para mim, é de louvar.

O que achas que se pode fazer para a Dança Oriental se desenvolver mais em Portugal?
Posso estar errada, mas neste momento NADA; acho que estamos precisamente no caminho. As bailarinas já valorizam muito o seu trabalho, mandam-se para fora, têm aulas e divulgam a arte de uma forma extremamente bonita e profissional. Eu estou de fora de muita coisa atual e tendências contemporâneas, por assim dizer, mas sinto muito orgulho nas minhas colegas de profissão, e passo a vida a partilhar o trabalho delas precisamente porque acredito que ainda vamos ser reconhecidas, no futuro, como as bailarinas da “Saudade”, as que conseguiram fazer do Fado um Tarab, dando-lhe apenas outro nome.

Podes dar algumas dicas às bailarinas que querem seguir a área da Dança Oriental de forma profissional?
Vou ser pragmática: trabalhem o vosso interior, acima de tudo. Trabalhem a vossa noção de merecimento e de que são tão boas como as outras. E, sobretudo, queiram aprender mais e estar menos em concursos. É certo que os concursos são, muitas vezes, a única forma de mostrarem o vosso trabalho... Mas invistam mais em aprendizagem do que em mostras, sobretudo nestas fases mais iniciais. Acreditem que vos trará outro know how, outro background. E outro arcaboiço na hora de, POSTERIORMENTE, competirem.

Podes nomear uma atuação de Dança Oriental/Fusão que te marcou? Quais as razões que te levaram a sugerir esta performance?
Aida Bogomolova, a dançar a “Nagham” no Festival Raqs el Hob, em 2011. Eu não me canso de ver aquilo, desculpem lá! As razões? TODAS! A técnica dela, a simplicidade, a leveza, a leitura musical, e até o diabo do fato e do véu que eram lindos de morrer! Ainda hoje é a minha Mejancé preferida e eu amo dançar aquela música...


Quais são os teus próximos projectos e objectivos profissionais?
Dar cada vez mais aulas no meu Estúdio Online e incorporar cada vez mais o meu trabalho como Mulher Medicina na Dança Oriental: o “NADI By Rita” já tem aulas regulares semanais e tenho tido feedbacks extremamente positivos. O meu objetivo é levar as mulheres a entenderem que o corpo delas tem uso como é, e que podem trabalhar a sua Energia não só através de meditação, mas através do movimento. Quero mostrar como tudo, no Universo, está ligado, e que ao trabalharmos em nós acabamos por trabalhar de forma coletiva. O verdadeiro “As above... so below”.

Entrevista DOP | Rita Pacheco 
Por Rita Pereira
Fevereiro de 2023