|
Foto: Direitos Reservados |
No cinema são poucos os que se mantêm sentados enquanto o ecrã exibe a longa lista de pessoas que contribuíram para o filme. O nome do realizador já sabemos, até porque surge logo no cartaz. Os atores também são já conhecidos. Mas quem terá escolhido Di Caprio para interpretar Jack Dawson no Titanic? E Winslet para dar vida a Rose? Talvez o próprio realizador. Ou um Diretor de Casting contratado pelo responsável máximo do filme. A resposta vem nos créditos que muitas vezes evitamos. Patrícia Vasconcelos é uma das portuguesas mais conceituadas no mundo dos castings e esteve à conversa com o Fantastic para nos contar como se processa a seleção de um determinado ator para um dado papel. Como tudo é "um pau de dois bicos", também os atores, Nuno Nolasco, Miguel Amorim, Ana Moreira e Inês Monteiro, partilham algumas histórias passadas naquele que é o momento de "avaliação" que lhes pode dar acesso à "personagem de sonho".Patrícia Vasconcelos é Diretora de Casting desde 1988. São mais de 30 anos de carreira. O tempo passa e continua a preferir que a apelidem de Casting Director. Porquê? Porque a sua função é "dirigir" e a tradução portuguesa não espelha aquilo em que consiste a sua profissão. No fundo, o Diretor de Casting é um dos responsáveis pela escolha dos atores que vão constituir o elenco para um filme, série ou novela. Lá está, um dos responsáveis. A última palavra será sempre do realizador. "É uma cadeia de profissionais", explica-nos Patrícia Vasconcelos. Após uma primeira análise, "convoco um ator, depois apresento ao realizador, ele está ou não presente, depois o realizador vai pensar e eventualmente vai querer um segundo casting, para tirar teimas".
|
Foto: Direitos Reservados |
Enquanto ator, Nuno Nolasco gosta que o realizador esteja presente no casting, sobretudo porque "se tu quiseres propor alguma coisa distinta que não seja a linha que eles querem seguir, os próprios realizadores estão ali e podem abrir essa possibilidade". Esta sua preferência pode até estar relacionada com a experiência positiva que o ator teve no casting para protagonista do filme, Mar Infinito, de Carlos Amaral. A somar à química que Nuno Nolasco teve desde o início com a outra protagonista, Maria Leite, até porque já eram amigos, "o Carlos (Amaral) quase que me pôs dentro do projeto sem eu estar dentro do projeto para me sentir confortável e confiante", avança ao Fantastic. Tudo aconteceu no âmbito de uma "leitura" para a qual o realizador de Mar Infinito o chamou. "Estávamos num escritório muito pequenino, no meio de livros, de coisas e de tralha, mas criou-se ali um ambiente mesmo especial entre mim e a Maria que eu acho que quando saímos da sala pensámos que aquilo nos assentou, houve uma aura qualquer que se criou", destaca. Também a atriz Ana Moreira, protagonista do filme Sombra, recorda uma experiência muito positiva, desta vez com a realizadora, Teresa Villaverde. "Não se ficava apenas pela leitura de um texto ou diálogo, mas antes pedia exercícios diferentes e arrojados como fazer de conta que és um camaleão ou que levaste um tiro, entre outras improvisações", partilha, destacando a disponibilidade da realizadora para que a "imaginação e inteligência" do ator também contribuíssem para a construção do personagem. |
Foto: à esq: Ana Moreira / à dir: Nuno Nolasco (Direitos Reservados) |
Apesar de não ser realizadora e, consequentemente, não ter a última palavra na escolha de um ator, Patrícia Vasconcelos procura sempre "proporcionar as melhores condições possíveis para o ator fazer o trabalho dele, portanto, pô-lo à vontade, confortável, acarinhar, cuidar, mimar, como na vida. Miguel Amorim, que integrou o elenco da série da Netflix, The One, é testemunha de que a Diretora de Casting atua da forma que nos descreveu. Estava numa longa fila para fazer o primeiro casting para o filme Nunca Nada Aconteceu, quando tentou desistir porque estava muita gente à espera e pensou que "ia entrar na sala e que ia ser despachado, sem poder demonstrar quem era". A agência dissuadi-o e o casting teve um desfecho diferente do previsto. "Quando entrei na sala fui muito bem recebido, foi a Patrícia Vasconcelos que fez o casting e foi muito simpática e acolhedora", conta. "Passado umas quantas fases, acabei por ser selecionado", acrescenta. Nunca Nada Aconteceu estreou nos cinemas a 29 de setembro.
A sensibilidade é muito importante para Miguel Amorim. "Fico muito feliz quando reconheço nas pessoas que recebem, sensibilidade de perceber que aquela situação é sempre difícil". Patrícia Vasconcelos, enquanto pessoa "fascinada pelo ser humano", procura garantir esse fator no seu espaço de trabalho. É essa sensibilidade que leva a profissional dos castings a desenvolver o Passaporte, um projeto anual que promove a internacionalização de atores portugueses apresentando-os a reconhecidos Diretores de Casting. De preferência, num ambiente leve e descontraído.
|
Foto: Miguel Amorim (Direitos Reservados) |
"É sempre bom sermos recebidos com simpatia, um sorriso, porque a situação de casting, por si só, já é um bocadinho stressante". Quem o diz é a atriz, Inês Monteiro. No entanto, sublinha que a forma com que um ator é recebido num casting "não pode afetar" a sua prestação. "O trabalho do ator é essa desconexão de fatores externos para conseguir entregar uma cena". A prestação depende, sim, da proposta previamente ensaiada pelo candidato. O sucesso de um casting também não é necessariamente medido através da resposta positiva ou negativa por parte do Diretor de Casting e realizador, sobretudo porque "às vezes o facto de não sermos escolhidos não tem a ver connosco, não tem a ver com a nossa proposta, nem com o nosso talento e imagem, mas sim com uma escolha, que, naquele caso, foi para outra pessoa".
A história de casting que Inês Monteiro partilhou com o Fantastic nada tem a ver com a sua passagem na novela Golpe de Sorte (SIC) ou Vidas Opostas (SIC). O facto de não ter sido posteriormente selecionada também não a impediu de ficar "muito satisfeita com o resultado". Tratava-se de um monólogo, "em que tinha de estar sentada, parada". Na companhia de um amigo que se disponibilizou para a ajudar a gravar a cena, depois de muitas tentativas falhadas, ponderou desistir. Até que o amigo a aconselhou a passar para a personagem o seu estado de espírito. "Eu usei a frustração que estava a sentir até porque também cabia na cena e correu super bem, fiquei muito satisfeita com o resultado", diz. |
Foto: Inês Monteiro (Direitos Reservados) |
Um casting não passa de uma "prova". Nas palavras de Ana Moreira, "todas as audições são um momento de partilha e também de treino e aprendizagem para um ator, de maneira que mesmo que não se consiga o papel, há sempre algo que podemos reter dessa experiência e das pessoas com quem nos cruzamos". De qualquer modo, Patrícia Vasconcelos deixa já um alerta a todos aqueles que querem ir a uma audição. "Acho que os atores têm de ter muito cuidado com aquilo que poem na Net", porque podes já não te identificar com uma coisa do passado e, se calhar, essa é a primeira coisa que aparece no Google".
Comente esta notícia