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COMING UP | Queen Charlotte

O maior desafio de um romance é fazer-nos apaixonar e o casal protagonista de Queen Charlotte consegue deixar-nos perdidos de amores nos primeiros segundos de ecrã. O universo de Bridgerton é fascinante, ao mesmo tempo que nos leva numa viagem a um mundo de contos de fadas consegue tocar em temas sérios da atualidade pela mão brilhante de Shonda Rhimes que nunca desilude na hora de colocar mensagens sociais nas suas histórias. 

Muito mais do que um spin-off, Queen Charlotte é a origem do universo Bridgerton, a peça que faltava para o puzzle ficar completo. Ao mesmo tempo que parecia só um projeto para preencher o catálogo e dar um gostinho dos rumores da Lady Wistledown enquanto não chega a hora de Pam e Colin assumirem o protagonismo da terceira season, Queen Charlotte chegou-nos como um romance de cordel ao qual dificilmente o nosso coração consegue ficar indiferente. 

Falamos de tudo isto e muito mais na edição desta semana do Coming Up. Fica connosco!

A abordagem ao romance em Queen Charlotte é um clichê? É. Mas quando um clichê é realmente bem feito o casamento é tão perfeito como comer um par de cerejas numa noite de verão. Queen Charlotte encaixou que nem uma luva no conceito e torna-se numa autodescrição do que o público que adora o género quer ver. 


Entramos no universo monárquico dos casamentos a troco de interesses do reino sempre com a visão multicultural que Bridgerton nos trouxe, reimaginando como a história de Inglaterra poderia ter sido e como a alteração desse pequeno detalhe poderia ter causado transformações profundas na forma como encaramos pessoas de diferentes etnias. 


Quando entramos pela primeira vez no mundo de Bridgerton encaramos a representação de uma mulher negra como Rainha como mais um detalhe de cunho pessoal de Shonda Rhimes, que em todas as suas tramas sempre teve voz ativa na defesa pelos direitos e representação de mulheres negras, mas Queen Charlotte vem provar que não é apenas um mero detalhe. Charlotte foi na verdade “a grande experiência” para uma nova sociedade onde todos têm um sítio à mesa.  Afinal a multiculturalidade é um fundamento da trama de Bridgerton e sabendo isso a grandeza da história que nos estão a contar só aumenta. 


Charlotte chega a Inglaterra como uma jovem obstinada escolhida pelo tom de pele, mas que nos conquista a nós público e ao Rei pela sua inteligência e comportamento fora de padrão. O momento em que ela tenta escalar um muro para fugir do seu casamento pedindo ajuda ao seu futuro marido, por mais que seja um grande clichê, é feito de uma forma tão embelezada que nos deixa embevecidos. 


Sabemos exatamente quais serão os passos seguintes, mas ainda assim não conseguimos não nos deixar levar pela maré e quando damos conta no final do primeiro episódio já estamos pregados à história.


 

Falar do final do primeiro episódio dá-nos o mote perfeito para olharmos de forma mais atenta para o grande diferencial de Queen Charlotte. Além do clichê romântico clássico, este casal tem uma peculiaridade: A solidão. 


De antemão já sabemos através de Bridgerton que o Rei sofre de algum tipo de doença, mas o que nos faltava ver era como essa doença afetou Charlotte e como isso a tornou na mulher poderosa e imponente que vemos em Bridgerton. Muitos desses traços de crescimento prendem-se com o tempo de solidão que ela atravessou. 


Longe de sequer poder manter-se a par do que se passava com o seu marido, Charlotte viu-se obrigada a ser Rainha sem Rei, Rainha sem liberdade e Rainha sem um Reino. Charlotte foi uma figura no papel, e essa primeira abordagem sobre a personagem permite-lhe crescer aos nossos olhos e fazer-nos sentir compaixão sem necessariamente tomarmos partidos. Porque esse é o truque que torna Queen Charlotte numa bonita história de amor, ela mostra os dois lados da moeda, sem nos fazer escolher lados e explicando muito bem o porquê do comportamento de ambos. 


Passamos para George e para a dor que sente alguém que não sabe exatamente o que tem e que vive eternamente na iminência de um colapso. Além de um primeiro momento de empatia, a série atira o personagem de imediato para uma “terapia” de choque que nos deixa horrorizados, mas que em simultâneo traz para este drama um realismo sobre como as doenças mentais eram vistas e tratadas à época. 


E nesse ponto o trabalho de desenvolvimento deixa-nos de queixo caído porque conseguem mais uma vez conjugar realidade com um conto de fadas mantendo o melhor de dois mundos sem nunca se perderem do foco da história que querem contar. É louvável.

 

Enquanto isso e apesar de obviamente a série se centrar muito nos dilemas e desafios de Charlotte e George temos à sua volta uma sequência de narrativas adjacentes que são, também elas, um deleite de serem vistas. 


Comecemos pelo amor dos dois pajens que tornam Brimsley numa das nossas personagens favoritas. A forma como a relação dele com Reynolds se reflete nos sucessos e insucessos de Charlotte e George é um excelente alívio cómico sem se tornar em algo forçado. É inteligente e apaixonante. Conseguimos perceber de fio a pavio a personalidade dos dois sem que nunca nos tenham sido oficialmente apresentados e são poucas as histórias que conseguem fazer isso de uma forma tão bem entrelaçada. 


Mas enquanto surgem novas figuras no nosso ecrã outras bem conhecidas dão o ar de sua graça. Lady Danbury assume aqui o papel de coprotagonista e é-nos reapresentada. A mulher que conhecemos em Bridgerton cheia de mistérios, mas respeitada por toda a sociedade é no final das contas uma verdadeira lutadora que aprendeu a defender-se na vida e fez-se mulher debaixo de uma intensa pressão política onde supostamente as mulheres não têm voz. 


Os duelos de chá entre ela e a Princesa Augusta são dotados de diálogos extremamente inteligentes que tornam tudo muito mais afiado e envolvente. São duelos de Ladys, recheados de classe e uma pitada de malvadez e interesse próprio aqui e ali. Acompanhamos o casamento pouco afetuoso dela, onde percebemos que ela se subjuga a um homem que apesar de não ter mau carácter está cheio de si, e é verdadeiramente apaixonante a forma como o guião nos mostra como essas batalhas que a vida a obrigou a travar a tornam numa mulher sábia e cheia de astúcia no futuro. 


Aliás, a forma como a série vai criando pontos de ligação entre o passado e o presente só aumenta o nosso interesse sobre os próximos desenvolvimentos da história, por isso mais um ponto ganho para este universo na Netflix.


 

Queen Charlotte é o tipo de projeto que chega sem nos levantar grandes expectativas, mas que nos surpreende pela qualidade e beleza que vai desde atuações dignas de nota até aos figurinos, passando, claro, pela habitual banda sonora irrepreensível de Bridgerton que já se tornou uma imagem de marca e que aqui se torna uma parte da narrativa ao trazer alguns dos maiores êxitos de artistas negras adaptados. São pequenos detalhes que só enaltecem a representatividade em Bridgerton e só aumenta ainda mais a qualidade de produção da qual é impossível não nos desfazermos em elogios. 


Apesar de ser uma série “girly”, Queen Charlotte é o tipo de história que vai apaixonar todos aqueles que não tiverem um coração de pedra, e à parte de todos os elementos que já citamos e que constroem esse sucesso há algo que não podemos deixar de lado: A qualidade de texto. 


Há aqui diálogos que mesmo que sejam clichês conseguem mexer com as nossas emoções, sendo que o auge da história acontece na conversa entre Charlotte e George, já em idade adulta, debaixo da cama em que Charlotte traz o seu marido de volta, num momento que deixa qualquer um de coração dilacerado. 


É, realmente, impossível não nos apaixonarmos. A beleza está lá, o cuidado está lá, e o futuro também, porque apesar de ser um spin-off temos aqui algumas luzes sobre o futuro dos personagens adultos de Bridgerton


Violet, apesar de ser a que menos tem o seu passado explorado, tem aqui um novo caminho traçado para a terceira temporada de Bridgerton, trazendo consigo uma mensagem bem feminista sobre como as mulheres lidam com a sua intimidade. Expressando, mais uma vez numa trama de Shonda Rhimes, que não há barreiras, não há idades, não há etnias, há simplesmente pessoas, e era tão bom que nos enquanto sociedade entendêssemos isso tão bem quanto o texto de Shonda Rhimes nos quer mostrar.