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“Glória”: Conhece a história real que dá o mote à primeira série portuguesa da Netflix

Foto: Direitos Reservados

Com texto de Pedro Lopes e realização de Tiago Guedes, Glória é o pontapé de saída da Netflix em Portugal, sendo o fruto da parceria entre a RTP e a produtora SPi. A produção chega com a promessa de dar que falar em todo o mundo inspirando-se na nossa história para fazer uma viagem até aos anos sessenta, com o nosso país a servir de cenário improvável aos eventos da Guerra Fria. O Fantastic conta-te os factos reais que vão servir de fio condutor ao projeto que estará disponível para mais de duzentos milhões de utilizadores em vários pontos do globo. 

O antigo posto de transmissão da RARET que colocou durante vários anos no ar a emissão da rádio Free Europe é o dado verídico que serve de guia à história de João Vidal, o personagem central da narrativa. O jovem engenheiro que tem no seu passado ligações ao regime fascista do Estado Novo, é recrutado pela KGB, a principal organização dos Serviços Secretos da União Soviética nos anos sessenta, para executar missões de alto risco que podem colocar Portugal numa posição delicada e, até, tem consequências à escala mundial. 

A disseminação de mensagens anticomunistas para os países de Leste é apenas um dos pontos de partida para as funções de João, enquanto agente da organização em solo português, colocando-se em risco para se envolver numa Guerra para a qual o governo português demonstrava uma posição neutral nos registos oficiais.

Em 1951, a vida no pequeno vilarejo de Glória do Ribatejo, localizada em Salvaterra de Magos, foi virada do avesso com a instalação de um posto da RARET, sigla para o original inglês Radio American Retransmission, levado a cabo pelos Estados Unidos da América que ao longo de um período que se estendeu por mais de quarenta e cinco anos revolucionou a vida de quem vivia naquela terra, dividindo a população em grupos completamente distintos entre si. 

De acordo com os registos da época chegaram a ser mais de quinhentas pessoas empregadas no complexo, sem que inicialmente tivessem plena noção do que estavam a fazer. Para quem liderava o posto o objetivo ditado pelas altas patentes era claro, e tinha como alvo a chamada Cortina de Ferro, com mensagens transmitidas que confundiam o Leste Europeu, dominado pelo comunismo iniciado anos antes por Lenin.

O projeto da RARET nasceu de um acordo firmado entre Portugal e os Estados Unidos com a Herdade de Nossa Senhora da Glória escolhido para acolher a rádio. Numa primeira fase a emissão restringia-se a apenas cinco horas, com direto a tradutores contratados dos Países de Leste para garantir que a mensagem pretendida sobre os factos do lado de cá da Cortina de Ferro chegava exatamente como era suposto aos seus ouvintes. 

O tempo trouxe uma evolução gigante e o projeto que arrancou como uma rede de transmissão cresceu, não só na técnica, com a aposta em vários transmissores potentes que impediam as ondas de rádio de serem superadas pela emissoras vindas da Rússia, com sinais muito mais fortes, mas também na expansão física. 

Foram construídos campos dedicados ao desporto, piscinas, uma área dedicada às habitações dos funcionários e até um colégio e uma clínica que teria uma maternidade. Um verdadeiro mundo à parte dentro daquele espaço, completamente desigual ao redor do vilarejo. A educação foi um grandes fatores desta mudança, com ensino gratuito e aulas à disposição de meninas da terra, sempre com os ideais do Estado Novo a servirem de bandeira numa formação em tudo formatada para os ideais ultranacionslistas promovidos pelo governo de António de Oliveira Salazar.

Com vários eventos a terem lugar no espaço da RARET, um dos mais marcantes talvez seja a explosão de maio de 1985, que apesar de não ter provocado qualquer ferido destruiu parte do material, em vésperas da visita de Ronald Reegan, à época Presidente eleito dos Estados Unidos da América. O fim do sonho ideológico reinvidicado pela CIA nos anos sessenta, que ingenuamente defendia que a propaganda seria a solução para promover uma revolução pela Liberdade do comunismo, acontece com a queda do Muro de Berlim. 

Apesar da vitória histórica, o fim das transmissões da RARET foi, ironicamente, livre de glória. Sem uma razão fundamental para continuar em antena, a rede de transmissão foi desmantelada e o equipamento entre à Junta de Freguesia, acabando por ser vendido a uma sucata local. Nos dias de hoje, de acordo com o jornal O Mirante, o complexo com mais de 200 hectares está deixado ao abandono.

Na ficção, Albano Jerónimo dará vida a Dassaev, um homem que de acordo com informações da revista TV7 Dias é um agente infiltrado da KGB e é forçado a deixar Portugal, sob fortes ameaças e em perigo de vida. Numa das cenas captadas pela lente da publicação do Grupo Impala, Brito, personagem entregue a Carloto Cotta tenta atirá-lo de uma varanda, colocando fim à vida do homem e assegurando os segredos escondidos na RARET. O icónico Cinema São Jorge serviu de cenário às gravações, que se iniciaram no ano passado com exteriores em Lisboa e no Ribatejo.

Miguel Nunes, João Arrais, Carolina Amaral, Afonso Pimentel, Sandra Faleiro e Gonçalo Waddington são alguns dos protagonistas dos dez episódios que compõem Glória, ao lado de um elenco que reúne alguns dos maiores talentos nacionais com nomes como Rafael Morais, Maria João Pinho, Joana Ribeiro, Ana Sofia Martins, Adriano Carvalho, Vicente Gil, Inês Castel-Branco, Laura Frederico, Leonor Silveira, Adriano Luz, Marcello Urgeghe, Augusto Madeira e Mafalda Lencastre que se juntam a nomes internacionais como Matt Rippy, que também será figura central na ação, Jimmy Taenaka, Jim Sturgeon, Soren Hellerup e Stewart Alexander, na pele do embaixador Ryan Marshal.


Na equipa de realização Tiago Guedes, que entre outros sucessos no seu vasto currículo é responsável pelo filme A Herdade, tem ao seu lado António Pinhão Botelho, que assumiu os comandos da longa-metragem Ruth, além de Nuno Casanovas, Tomás Novais Castro, Clarice Laus e Cesário Monteiro. No argumento, Pedro Lopes junta Inês Gomes, autora de sucessos como Mar Salgado ou Terra Brava, Miguel Simal, que assumiu a supervisão de Conta-me Como Foi e a nova temporada de Auga Seca, Filipa Poppe, que assinou a novela Paixão e a longa-metragem O Som Que Desce Na Terra, Rita Roberto, também nome frequente nas tramas de horário nobre da SIC, e André Tenente, que soma mais um projeto depois de integrar a equipa da adaptação de Conta-me Como Foi.

A aposta da Netflix será exibida mais tarde na RTP, co-responsável pela produção do projeto, numa aposta da Direção do canal estatal numa linha de séries que transcenda o formato televisivo e que enquadre públicos dispersos da antena generalista. “Fui assistir às filmagens que estão a decorrer para Glória, a primeira série original da Netflix realizada em Portugal e uma co-produção RTP, claro. É uma produção de grande nível, cuidada, com bom casting, bom guião, boa fotografia, e é sobretudo mais um passo para a internacionalização desta indústria", referiu Gonçalo Reis, Presidente da RTP, em entrevista ao jornal Observador.

"Uma história bem portuguesa, filmada entre o Ribatejo e Lisboa, girando à volta de operações secretas durante a guerra fria, com o antigo regime como pano de fundo, envolvendo a CIA e abrindo caminho para as mudanças que estavam a despertar na sociedade”, explicou ainda o responsável, reforçando a aposta em séries de qualidade com projeção para a internacionalização.

Enquanto produtores, este momento representa igualmente para o mercado audiovisual português o início de um novo ciclo, já que posiciona o nosso país no `roadmap` das grandes produções internacionais que a Netflix tem vindo a preconizar”, referiu na apresentação de Glória, José Amaral, Diretor-Executivo da SPi, produtora da série que tem, também, em pré-produção, juntamente com a RTP, a segunda temporada de Auga Seca, que conquistou públicos em Portugal e Espanha e tem trilhado um percurso de sucesso no catálogo da plataforma de streaming HBO.