COMING UP | Cabaret Maxime [Globos de Ouro]
O showbiz
é muito mais que as plumas e vozes poderosas que vimos em filmes como Burlesque.
Neste longa-metragem de Bruno Almeida conhecemos o underground, o
clandestino, o menos bom, este é o ângulo do projeto que se despe de qualquer
glamour para fazer um retrato rústico e algo decadente do Cais do Sodré.
Lisboa serve de pano de fundo para uma produção ao bom estilo indie que se
centra numa história realista onde ninguém parece estar feliz e resignação
parece ser a palavra de ordem.
A melancolia acompanha
toda a trama que se passa na Capital, mas que em nenhum momento fala
diretamente dela. Tudo porque o lugar não é o mais importante, algo que se nota
até no uso da língua inglesa, mas sim mostrar a forma como os personagens se
vão autodestruindo numa narrativa que é um espetáculo de variedades numa ode aos
velhos costumes das casas noturnas. Da piada, à música e ao strip, tudo
é orquestrado e apresentado de forma subtil enquanto a história dos
protagonistas acontece à volta, sem se preocupar muito em se autoexplicar.
Michel Imperioli
dá vida ao dono do Cabaret Maxime, um espaço de espetáculo que desde a
sua construção já albergou diferentes tipos de ambientes. As semelhanças
físicas entre o ator e Al Pacino já anunciam o género de fita que podemos
esperar. O crime é na verdade a grande base da história, que nasce a partir de
um grupo de homens pouco confiáveis que prometem estragar o negócio de Bennie
Gazza. O grupo, que mais tarde se vai aliar ao senhorio do chefe promete um sítio
diferente carregado de mulheres bonitas e com espetáculos de striptease que
conseguem superar em grande escala as atrações dos seus concorrentes. Nesta luta
comercial, o gang ainda consegue tentar extorquir dinheiro ao homem e
ameaçar destruir a estrutura do seu cabaret.
Tudo acontece ao
mesmo tempo que acompanhamos a história de amor do aparente mafioso com a sua companheira.
Stella, Ana Padrão, é a jóia da coroa do lugar, mas é, também, uma mulher
perturbada que luta contra a Bipolaridade num ambiente pouco propício para o
efeito. Longe do stress dos holofotes, Bennie é o porto de abrigo e no
seu próprio turbilhão de acontecimentos consegue garantir a simpatia do espectador
pela maneira carinhosa como revela que mais do que o trabalho, a sua verdadeira
preocupação é a sua esposa. Ana Padrão merecia mais espaço de ecrã, no entanto
não deixou de entregar cenas bem marcantes. Na luta contra a doença, os seus
ataques de raiva são o grande destaque o filme e a maneira mais acertada de
fazer a história correr. Muitas das consequências do filme vêm de como efeitos
secundários das ações desta mulher, que fazem da atriz uma das grandes
protagonistas da película.
A contracena dos
dois atores contribuiu para dar um certo realismo. Apesar de poucos momentos de
romantismo, há química e muita coisa para interpretar nas entrelinhas e nos
olhares. Além de tudo, na interpretação da portuguesa vale ressaltar a forma
física que continua invejável para alguém com 52 anos. Faltou, talvez, vermos
um pouco mais de show nesta representação. Sendo que o enredo do filme se
sustenta na casa de espetáculos, pedia-se mais momentos de dança, ou de canto em
primeiro plano, como fizeram com a comédia. A música começa em grande na voz de
Manuel João Vieira, mas a partir da metade do projeto desaparece do plot.
E a dança ficou reservada para o final com protagonismo de Stella, todavia sente-se
a ausência de algo para trás que mostrasse a importância daquela performance.
Vemos o ensaio, porém faltaram pontos de comparação para encararmos aquele
momento com o devido valor.
Cabaret
Maxime é um produto artístico e passa longe de ser um filme para massas. É
um conceito mais intelectual que se sustenta em bons planos e numa realização que
mostra verdade e crueza. É fiel à sua proposta de nos mostrar um lado mais
criminoso do mundo o espetáculo, mas na balança, o lado mais “brilhante” que
podia alavancar o drama ficou demasiado suavizado. O desenvolvimento é lento, contudo
é correto para um projeto que pretende atingir um público mais erudito. Lisboa
é espaço certo e volta a conquistar nas suas peculiaridades mostrando que há
muita história por onde navegar neste país.
Ricardo Neto
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