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Contos Bastardos • "Apareceu brilhando"

Apareceu brilhando

Chegou maio e com ele as flores. Os lírios brancos já cobrem o vale - pelo menos aqueles a que as ovelhas não conseguiram chegar para lhes chamar um figo. Profético, ou não?
Não está frio nem calor e isso poupa-me a alguns embaraços, logo à partida - nem preciso de trazer o corta-vento nem levo os ombros descobertos como uma qualquer.
A claridade angelical da paisagem inspirou a minha indumentária: vou de branco e levo um manto pelos ombros, não vá o Diabo tecê-las e começar a pingar - que estas primaveras já foram mais certas e lá de onde venho somos ensinados a andar prevenidos.

De manhã, antes de sair, falhou-me a coragem.
Duvidei de tudo: das palavras que tinha escolhido, do lugar, de ti, de mim mesma.
Depois assaltei a garrafeira do meu pai e tomei um cálice de vinho - daquele especial para ocasiões. Cada um tem a Estrela-Guia que merece.
Senti-me momentaneamente mais corajosa.
Saí sem dizer onde ia. Há muito que não tenho a quem dar justificações - nem quem mas peça, quanto mais.

Combinámos ao meio-dia e apareci mais cedo. Burra.
Só me causa nervos, esta espera.
A extensão de campo vazio faz-me olhar para o horizonte e desejar com tanta força que apareças que me dói o estômago de excitação só de te imaginar a surgir.
O Sol já não está no seu ponto mais alto e isso quer dizer que te atrasaste. Que mundano da tua parte. Encosto-me a esta azinheira filha única e espero - mas só mais uma hora.

O que me deu na cabeça para trazer o fio de ouro ao pescoço? Só me vais achar mais ridícula e inexperiente nestas andanças.
Começo a achar que não vais aparecer.

É inútil, vou voltar para cima.
Volto no dia 13, se tiverem sorte.

Texto: Sónia Costa
Ilustração: Filipa Contente