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COMING UP | Rebelde

Para muitos adultos de hoje a trama de Rebelde faz parte do imaginário, da nostalgia geral. Adaptada em tantos países, a história tornou-se, à sua maneira, num marco da ficção com um modelo que foi replicado dezenas ou centenas de vezes, tantas que se esvaziou. Depois de ter servido de inspiração a tantas histórias de adolescentes, a verdade é que já vimos bem melhor. Este novo Rebelde da Netflix é a típica série pastilha elástica que enche o olho a quem gosta de tramas juvenis mas que nada acrescenta, não inova e no fundo o que se sente é a falta de rebeldia em ir mais além para fugir do óbvio. Fica connosco neste Coming Up onde te vamos falar sobre o que não resulta neste novo reboot ao mesmo tempo que te contamos porque é que mesmo sem desenhar fora dos contornos ainda nos continua a viciar. 

Música, adolescentes irreverentes e uma diversidade colocada às três pancadas, este é o retrato geral que a nova aposta da Netflix nos apresenta à partida. São os ingredientes que durante anos colaram o público ao ecrã mas que em 2022 já não fazem o mesmo sentido. 

Nos dias que correm há discussões que têm de ser trazidas para cima da mesa com um cuidado que este reboot não tem e já deixamos, há muito tempo, de ter paciência para os romances novelescos criados por conveniência que este argumento nos tenta impingir. 

No fundo, há dois grandes problemas que saltam à vista quando falamos desta nova adaptação: A linearidade e a conveniência.

Comecemos pela linearidade. Quem é utilizador da Netflix e gosta de conteúdos young adult já passou pela experiência de ver Tiny Pretty ThingsÉliteControl Z ou Never Have I Haver, e o que têm todas elas em comum? Trazem a atmosfera dos dramas teenager ao mesmo tempo que tentam colocar em cima da mesa discussões atuais, bandeiras de diversidade, de aceitação, ou seja, conteúdo importante que o público alvo precisa de ver para se sentir representado. 


Em Rebelde o que acontece com os personagens chega a ser pecaminoso. Além de colocar cada elemento do núcleo principal com narrativas elitistas que pouco ou nada geram identificação com o público, ainda caiem no erro de trazer para esta história um drama novelesco de filhos bastardos que andam às turras, numa lógica que já vimos repetida inúmeras vezes no ecrã e que nem sequer chega a ter real impacto no argumento porque é um mistério facilmente desmontado no final do segundo episódio. 


À semelhança do que acontece com a trama original a música é o fio condutor que liga toda a história, mas aqui ganha uma proporção tão gigante que esvazia o tempo que o texto precisa para dar profundidade às personagens. 


Chegamos ao último capitulo e a sensação que dá é que tudo acontece de forma tão rápida e despropositada que não há nenhuma lição a tirar do que aconteceu até então, Dixon continua a ser o Dixon, e nada do que aconteceu mudou por aí além quem ele é, assim como Jana continua a ter os mesmos ataques de diva que tem desde o primeiro minuto. 


É como se tivéssemos estado a assistir a oito episódios de quarenta minutos para no final ficarmos na mesma. 



E já que falamos de Jana temos de dizer: Que personagem chata! Nos dias que correm apostar em um par romântico como motor de uma série traz consigo a exigência de que esse par seja carismático o suficiente para não nos deixar com a ideia de que só existem para criar um caminho fácil para os autores. 


Não é, claramente, o que acontece com Jana e Estebán, que além de terem entre si zero química ainda pecam por serem personagens altamente estereotipados a quem tudo acontece por uma conveniência absurda e chata. 


Começando pelo clichê mais que batido do amor entre a menina rica e o menino pobre até àquele encontrão pseudo romântico que replica algo que só funcionou em 2003 no Love Actually, este amor é maçador e extremamente desnecessário. Perdemos tempo a ver a paixão pré-fabricada dos dois a acontecer, sabendo de antemão o resultado porque a série não teve arcaboiço suficiente para elaborar a coisa, enquanto nada de verdadeiramente impactante acontece na vida dos personagens secundários que sirva como isco para nos deixar curiosos para a segunda temporada. 


O romance até poderia acontecer, até porque faz parte da génese dos dramas teenager, mas pedia-se mais ousadia numa série que surge depois de tanto conteúdo do género já ter sido lançado. 


Até poderiam ter aproveitado e deixado todo este enredo para a segunda temporada, dando espaço de ecrã para que o resto se desenvolvesse, para que criássemos empatia com os personagens e para que tudo acontecesse a uma velocidade mais verosímil e não ao ritmo das novelas em que depois de uma primeira troca de olhares já estão dispostos a morrer um pelo outro.


Todo este arco torna-se ainda mais chato quando vemos o potencial dos restantes personagens, que mesmo tendo sido criados à base de clichês conseguem ter dramas mais ricos e despertar mais interesse ao público. 


Luka é o típico miúdo mimado, mas também é o miúdo cheio de sonhos com vontade de ser ele próprio dentro de uma rede castradora que coloca sobre ele as expectativas de um pai que é mão de ferro. Há sumo ali para se fazer algo de diferente a curto prazo, há sumo para se ousar, e em alguns momentos da história sente-se que estão de facto dispostos a isso mas parece que o tempo lhes falta, numa gestão de ritmo que é assustadoramente má. 


Andi é outra das personagens com força para carregar a série às costas mas é, também, uma das principais vitimas da falta de foco dos autores. Temos uma introdução do que é a sua vida familiar, uma leve explicação sobre a sua personalidade mas de um momento para o outro já a temos exposta ao caminho fácil do romance como se a criatividade de quem escreve não conseguisse pensar em outros modelos para explorar a personagem. Ou seja, por mais interesse que ela nos desperte, o resultado é algo meio oco que leva a que seja mais do mesmo sem grande moral ou algo que gere a tal identificação com o público de que falamos no inicio deste Coming Up. 


M.J é o alívio cómico da história, e funciona até certo ponto, por a vermos como miúda ingénua que vem de uma realidade diferente, mas essa mesma ingenuidade é elevada a um extremo que a torna numa piada e quase que roça o irritante. 


Por último, com Dixon, acontece exatamente o mesmo que com Andi, temos leves introduções, temos ali margem de manobra, para depois, no final das contas o seu arco se resumir a meia dúzia de diálogos colocados às três pancadas.



Há outro ponto a ter em consideração aqui: O elenco. Os personagens, ou melhor, o desenvolvimento que lhes é dado, não ajuda, mas mesmo isso não justifica alguns espetáculos de má interpretação que temos em Rebelde


Jana tem uma boa voz, uma aparência típica de protagonista de série juvenil, mas é constrangedora em algumas cenas. Vemos zero emoção, zero verdade na atuação de Azul Guaita Bracamontes, e nos momentos em que a personagem tem os holofotes sobre si o que temos no ecrã é alguém a debitar um texto muito bem decorado mas sem sentimento algum, é oco. 


O seu parceiro de atuação é, em alguns pontos, melhor, e entrega alguma coisa de mais credível, mas mesmo assim com alguns momentos sofríveis que nos fazem achar que o cast de Toy Boy é quase digno de Oscars quando comparado com alguns supostos talentos que temos aqui. 


Com Luka em mãos, Franco Masini, também parece ter alguma falta de experiência para agarrar as nuances que o papel lhe dá, e fica muitas das vezes pelo facilitismo de ser o mau da fita, com a mesma expressão em todas as cenas. 


Já Andrea Chaparro trouxe a sua M.J do teatro, com uma interpretação muito definida em cima da expressão facial e corporal, que funciona nos palcos mas que é estranha quando vista em grande plano, parece que não casa com a imagem que a série pretende em alguns momentos. 


Mesmo com tudo isto em conta, há que dar os parabéns à Netflix por ter apostado num casting que foge dos padrões convencionais, não temos a procura pela imagem perfeita (à exceção do que acontece com Jana), pelo contrário, temos pessoas reais, a quem pedíamos só um pouco mais de talento.


Mas com todos estes pontos baixos, Rebelde ainda consegue viciar. E porquê? Esta fórmula de contar histórias é, para muitos de nós, o nosso primeiro contacto com a ficção. É um modelo que ainda hoje é replicado vezes e vezes sem conta em quase todas as plataformas, e por isso, por mais que a história não nos acrescente em nada, temos sempre a tendência a deixar-nos levar por estas tramas leves que nos descansam a cabeça sem nos obrigar a raciocínios elaborados. 


Talvez aqui quisessem que fosse mais fácil de compreender para agarrar o publico adolescente, mas mesmo que fosse esse o requisito, talvez a Netflix esteja a menosprezar o seu público mais jovem capaz de consumir conteúdos como Never Have I Haver, que apesar de também ter essa atmosfera mais teenager consegue conversar com mais público e ser até mais educativa. 


Rebelde é a típica pastilha elástica que nos preenche o tempo livre em momentos que não queremos perder tempo a pensar nas coisas, mas talvez corra o risco de ser tão vazia que se torne facilmente esquecida. 


Não há grandes pontos de interesse que nos fazem querer voltar, e talvez algum do público regresse apenas pela nostalgia de querer reviver o tipo de argumentos que no passado nos entreteve. 


É uma estreia na mó de baixo, que se alicerça em clichês e que não nos deixa com expectativas, o que até pode ser muito bom caso a segunda temporada abane as coisas e crie alarido suficiente para nos fazer voltar. Um caso típico em que temos de esperar para ver, com Gossip Girl funcionou, mas será que a bola entra duas vezes na mesma baliza?