COMING UP | Outer Banks
Muito mais empolgante, mas sem perder aquele velho clichê que nos leva a questionar onde estão as figuras parentais dos adolescentes de séries do género, Outer Banks está de regresso, com decisões mais maduras, uma trama que corre a um ritmo explosivo e um romance que por mais que seja apenas mais uma bonita releitura de um Romeu e Julieta continua a fazer-nos torcer pelo mítico final feliz. Tem acertos e defeitos, mas na essência, Outer Banks supera as expectativas e nós explicamos-te porquê na edição desta semana do Coming Up. Fica connosco que prometemos não deixar escapar nada e dar-te mais uma sugestão para ter entreteres neste verão.
Tal como na primeira season, a proposta de nos apresentar algo com as cores quentes que combina com a estação, muita ação e aventura dentro de água e um universo de personagens com poder e dinheiro, continua a ser cumprida na perfeição nesta nova sequência da narrativa de Outer Banks, onde, mais uma vez, o lado técnico está no ponto.
A fotografia carrega-nos imediatamente para dentro da despreocupação que é timoneira no enredo de Outer Banks, enquanto nos deixa respirar um pouco do calor do verão enquanto ainda continuamos num confinamento parcial. No fundo, do ponto de vista do aspeto, Outer Banks acaba por ser um bom refugio para quem se quer distrair.
Essa parte do compromisso está cumprida, sendo este um dos maiores acertos da execução da série que nesta segunda fase consegue arriscar um pouco mais, deixando claro o aumento do budget que a distanciou das séries classe B, com o dinheiro a ser investido em eventos que realmente têm um propósito e nos dão um ritmo que permite facilmente maratonar os dez novos capítulos. Os problemas só vêm depois.
As soluções narrativas são criativas para o ritmo, e em larga escala funcionam melhor do que na season anterior, porque desta vez embarcamos num estilo frenético com emoções à flor da pele e com eventos chave que em todos os episódios dão twists à vida destes jovens. Mas apesar de tudo isso, a série não consegue deixar de parte alguns clichês que já estão mais que batidos.
É quase uma dicotomia, porque ao mesmo tempo que essa fórmula frenética de uma explosão quase constante funciona para nos deixar presos aos episódios, acaba por tornar a história em algo apenas comercial sem grande espaço para dar guinadas que nos despertem grandes surpresas. Para além de que cair nesse esquema rotineiro ajuda a que o desenvolvimento dos personagens seja muito mais plano, que foi o que, de facto, aconteceu nesta segunda temporada de Outer Banks.
Antes de entrarmos na análise sobre a evolução de John B, Sarah e o restante grupo, temos de fazer a pergunta para um milhão de euros: Para que serve a justiça ou a polícia em Outer Banks? É certo que a trama estabelece rapidamente os esquemas de corrupção do poder logo desde o primeiro episódio, mas mesmo assim há demasiadas falhas no sistema policial para podermos ignorar isto por completo.
Tomemos o exemplo de John B que na temporada passada ficou à guarda de Ward, entretanto fingiu a sua morte, voltou, ficou em fuga à polícia, acabou preso e depois é libertado sem nenhum sistema de apoio, sem uma figura adulta que se responsabilize a cuidar dele como adulto que é. Por mais que estejamos habituados a que este género de produções ignore as idades dos seus protagonistas, há limites para a suspensão da crença, e neste ponto mais parece um erro de lógica, que tem como único propósito manter a guerra entre o protagonista e o vilão sem se preocupar.
O arranque desta segunda temporada está no ponto, com muita ação, aliás, os primeiros quatro episódios são os melhores da série até agora. O momento em que Sarah está às portas da morte foi orquestrado de forma excelente e quase que nos deixa de coração nas mãos, mas tornou-se sinónimo de uma oportunidade desperdiçada.
É certo que em séries adolescentes o romance é um dos pilares principais da história, e é difícil contornar isso, mas se os autores tivessem tido a coragem de matar a personagem naquele momento, talvez fosse uma forma de reinventarem as linhas narrativas e passarem uma mensagem mais impactante. Ao contrário, o caminho que seguiram foi algo fácil que deixa uma mensagem de que não há consequências reais.
Os personagens parecem viver dentro de um síndrome de super-herói, em que por mais riscos que corram nunca nada de grave lhes vai acontecer porque os argumentistas não se vão dar ao luxo de encerrar arcos. Esta acaba por se tornar numa noção muito tóxica para os restantes episódios, porque em nenhum momento de tensão voltamos a sentir que poderemos ter consequências, é quase como se tudo a partir daí se tornasse banal.
E chega a ser triste, porque os momentos de tensão em que os personagens têm as vidas em risco são muito bem escritos, conseguem apelar às nossas emoções, ou seja um desfecho diferente poderia ter aumentado e muito a nossa visão geral sobre as personagens. Ao invés disso temos vários momentos em que o agente favorito dos dramas adolescentes, o Deus Ex Machina, entra em ação. Topper torna-se na personificação desta designação, e também na prova de que há demasiadas personagens em Outer Banks e pouco tempo para lhes dar uma função digna no enredo.
Topper salva Sarah no momento em que já antevíamos que alguém iria chegar. Tudo bem quanto a isso, não fosse o facto de passarmos mais de metade dos episódios sem quase nos lembrarmos da existência dele. Quando chega serve única e exclusivamente para criar um pequeno contratempo no romance central, que até poderia ter funcionado mas passa longe de ser credível, porque desde o primeiro momento que temos a certeza absoluta que aquilo não vai dar em nada, quer pelo que conhecemos das duas personagens, quer por sabermos que se realmente quisessem que a paixão de John B e Sarah chegasse ao fim, ter-lhe-iam dado um final mais épico com a morte da protagonista em Nassau.
Topper foi um filler da série, utilizado para acrescentar mais qualquer coisa num momento em que a série precisava de parar e fazer um apanhado de tudo o que tinha acontecido até então. Uma necessidade que foi criada pela própria história, que foi ambiciosa ao ponto de introduzir mais um núcleo e uma guerra sem antes encerrar por completo o drama anterior.
O arco em torno de Limbrey e da Cruz de Santo Domingo é interessante, traz à tona as raízes de mais um personagem e um enigma que volta a funcionar e a fazer renascer a cruzada da temporada anterior que nos obrigou a puxar os nossos galões de Sherlock Holmes. Contudo, não era o momento certo para trazer um novo problema.
A dada altura parece que havia tanta coisa acontecer ao mesmo tempo, que começa a existir uma corrida para a resolução de problemas que mesmo resultando em soluções coerentes deixou-nos a desejar por mais. No fundo, poderíamos ter guardado esta nova jornada para uma potencial terceira temporada, colocando o protagonismo nos ombros de Pope, abrindo espaço para que em cada temporada as raízes de cada um dos elementos do grupo os levassem à aventura. Mais ou menos como se fosse histórias de Uma Aventura ou Os Cinco mas com um toque pessoal.
O tempo que se perde a tentar balancear todos os arcos acaba por ter consequências sérias no desenvolvimento pessoal de alguns dos personagens. JJ tem os seus dramas familiares reduzidos a uma aventura fugaz, com o pai a aparecer quase do nada, num evento que se resolve em meio episódio, longe de se tornar realmente tocante ou de ter um impacto.
Rafe, que é talvez uma das personagens com mais potencial dentro do universo de Outer Banks, fica a marinar e é puxado apenas para criar momentos de tensão sem que exista tempo para se debruçarem de facto sobre ele. Contudo, é graças às ações dele que ganhamos um outra noção de Ward. Por mais defeitos que tenha e erros que cometeu, nesta segunda temporada, é o sangue que o torna de facto num vilão. É-lhe dado um banho de humanidade que o torna num pai capaz de tudo para defender o filho, e que apesar das suas atitudes, acaba por merecer a nossa compreensão, no verdade, é a personagem que mais substancia ganhou nesta segunda leva de episódios.
Para encerrarmos esta viagem pelos personagens que ficam arrumados em prateleiras, temos de falar sobre Kiara, a chata Kiara. Enviem de uma vez esta rapariga para um colégio interno, porque já não há quem aguente os dramas dela. A personagem é um atípico constante, envolta num drama pessoal que já passou de validade e que continua a repetir-se uma e outra vez.
Quando finalmente parece que vai ganhar mais incidência na história e que o romance com Pope terá pernas para andar, os argumentistas acabam por deixá-la como mais do mesmo. É não, não é por falta de talento de Madison Bailey, porque num único episódio de American Horror Stories ela foi capaz de mostrar mais das suas capacidades como atriz do que em duas temporadas completas de Outer Banks, onde supostamente, ela seria a protagonista. Talvez faça bem à série e à personagem uma temporada longe para depois poder trazer algo refrescante quando voltar. Por enquanto é só alguém que serve para fazer número.
Mesmo com estes destaques menos bons, o que Outer Banks entrega nesta nova temporada é uma história com muito potencial, com criatividade suficiente para ir além dos seus problemas, e com momentos de ação bem trabalhados que além de convincentes ajudam a tornar a trama mais leve e fácil de assistir.
Temos de dar créditos por ao contrário da maioria das produções, esta não deixar as resoluções todas para o último episódio. Há espaço para saborearmos cada encerrar de situações, mesmo com muito a acontecer. E se ignorarmos a falta de espaço para deixar todos os protagonistas brilharem de igual forma, temos aqui uma trama que consegue gerir múltiplos eventos sem se tornar numa completa confusão e ainda manter a coerência necessária.
Claro que temos, como em quase todas as tramas adolescentes, as mesmas perguntas clichês sobre as decisões maduras que os personagens tomam, mas à parte disso, se aceitarmos embarcar nas linhas orientadoras de Outer Banks somos obrigados a aceitar que dentro do género é, no momento, uma das melhores opções que temos disponíveis no catálogo da Netflix.
Faltou aprofundar um pouco mais, faltou trazer alguma mensagem moral, mas nem tudo tem de ter uma carga social, e por isso, Outer Banks é aquele tipo de história que consegue agradar a tudo e a todos a um bom ritmo e sem correr riscos.
A primeira temporada foi boa, esta foi melhor, o que deixa o hype elevado para um terceiro ano. Por mais criativa que seja a série, o que esperamos de um terceiro ano é algo diferente, mas até que ponto é que Outer Banks consegue ir mais além sem perder o seu lado sóbrio e comercial? Esperemos que a Netflix nos deixe obter uma resposta a esta pergunta e nos deixe ver mais da história de John B. Que venha a terceira temporada, com menos Kiara e a mesma essência frenética.
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