Header Ads

COMING UP | Lúcifer

Lúcifer está de volta e no seu momento de maior lucidez. Não, não estamos a falar do estado emocional do personagem mas sim do argumento que é agora muito mais maduro, com piadas que realmente nos deixam a rir e arcos que herdam muito bem o saudoso humor de Dean e Sam Winchester. Com o final à espreita, a quinta temporada é um regresso triunfal da série que descobriu finalmente que o segredo para encantar a legião de fãs é soltar umas gargalhadas com eles num show que é, acima de tudo, sobre os prazes da vida. Com um encerramento que já deixa a nossa ansiedade nos pícaros, a nova leva de episódios do sucesso da Netflix tem as suas falhas mas nada que prejudique a experiência, o gozo, e o desenvolvimento daquele que é um dos personagens que vai ficar cravado como um dos ícones do nosso tempo. Afinal de contas, as personagens infernais continuam a preencher as nossas medidas e depois de uma leve aparição do Deus de Supernatural, já só desejamos que um dia se lembrem de juntar Lúcifer e Crowley no mesmo ecrã. Vá no fundo é só isso que falta para a loucura ser total. Longe de uma overdose de Céu e Inferno, a Warner da televisão sabe com que canas se fazem uma canoa e volta a deixar-nos viciados neste loop infinito de guerras familiares e de discussões sobre as emoções, até porque o diabo também chora. É muito bom, e porquê? É o que te vamos dizer na edição desta semana do Coming Up, fica connosco que prometemos que não te vais arrepender!

A primeira metade da quinta temporada de Lúcifer já tinha provado que a trama chegava com um novo fôlego, algo que agora é ponto assente nesta nova leva de episódios que explora muito mais da mitologia do personagem sem perder o aspeto galhofeiro, que no fundo é o que nos encanta em ver a série. Mesmo com um storytelling muito mais noveleiro do que o habitual, com menos casos e com mais foco no desenvolvimento dos personagens, a história não deixa de ter os habituais twists e volta a saber aproveitar muito bem o respiro que a redução de episódios colocada pela Netflix lhe dá. 


Ao contrário do que acontecia nas mãos da FOX, aqui os fillers limitaram-se a um único capítulo, aquele que é dedicado a Dan, mas mesmo esse que fugia um pouco na narrativa central acaba por se revelar crucial para o desenrolar da história. Bem encadeada, com diálogos muito mais ricos do que os que apresentou até então e com uma maior atenção aos traços de personalidade dos seus protagonistas, a nova sequência é prova de como até uma temática que já começa a estar gasta consegue prender-nos ao ecrã quando cai nas mãos de uma boa equipa de argumentistas. 


Outro ponto que merece destaque ainda na questão do enredo é a perda da virgindade adolescente que parecia impressa no texto de Lúcifer até ao arranque da primeira metade da quinta temporada. A série amadurecer, ao perder os fillers parece ter ganho uma maior noção do caminho que quer trilhar e ressurgiu das cinzas com a capacidade de conquistar novos públicos que tenham a coragem de passar pela travessia no deserto que é a terceira temporada. Parece cada vez mais que vamos ter um final digno a ser entregue, e é sem dúvida merecido porque depois de um percurso com altos e baixos, a trama soube revitalizar-se como poucas outras conseguiram até então.



Deus, ele é o grande plot twist desta temporada e também um belo ganho no elenco, por mais uma vez a equipa de argumentistas ser suficientemente ousada para usar o nome de Deus numa personagem descomplexada sem lhe tirar a essência de bondade que poderia dar-lhe controvérsias desnecessárias mas falível ao ponto de o aproximar mais dos restantes personagens sem criar dicotomias e linguagens que extrapolassem os limites da boa disposição que define Lúcifer. A ideia de que Deus não ouve as preces, e a ideia de um Deus que tal como todos nós também erra é uma premissa que apesar de ousada torna tudo muito mais tentador e no fundo era a cereja no topo do bolo que faltava para que a produção se tornasse ainda mais memorável. 


Não é nada que nunca tenhamos visto em Supernatural, mas há uma linha narrativa que vinca muito bem a diferença entre as duas séries: A proposta familiar. Por mais que a história de Dean e Sam assente muito na ideia da irmandade, Lúcifer acaba por ir mais longe ao explorar conceitos de família por inteiro e por trazer personagens que as narrativas ainda têm tendência a ter pruridos no tratamento como seres que erram mas que nem por isso deixam de ter na essência a sua criação bíblica. 


Mickael continua a ser um anjo com muitos defeitos, enquanto Lúcifer parece estar agora a reconstruir-se, mas sem que o texto lhe dê uma completa imagem de condescendência, no fundo é um processo de redenção que vem sendo trabalho durante várias temporadas e que agora sim, podemos confortavelmente dizer que o purgatório de Lúcifer está completo. É uma leitura que utiliza conceitos que são a base da nossa sociedade para trazer uma moral de que todos podem conseguir o seu lugar ao sol por mais erros que cometam caso conseguiam que as suas atitudes superem esses erros.


A lista de elogios já vai longa e por isso, temos agora de falar das consequências que chegam à trama por finalmente estarmos a acelerar o desenvolvimento pessoal de Lúcifer. No fundo, a falta de momentos de alívio dos dramas familiares mais pesados com investigações acaba por tornar Chloe numa personagem muito mais secundária do que aparenta. Chloe e Maze são as duas grandes perdas no total desta quinta temporada, perdendo-se em buscas pessoais que são loops infinitos até que chegam a conclusões obvias e a lugares comuns que poderiam facilmente ter alcançado dez episódios antes caso andassem ao mesmo ritmo que o restante desenvolvimento dos personagens de Lúcifer.


Convenhamos que Chloe, por si só, não é a personagem mais apelativa, chegando mesmo no limite a tornar-se chata, mas tinha nesta sequência a oportunidade de brilhar e de roubar os holofotes para os seus dramas, algo que não acontece. Parece que está sempre ali no limiar de se aproximar de um momento de protagonismo mas como o seu arco se resume à história de amor com Lúcifer acaba por se perder num nada gigante, além de nos dar momentos sofríveis em que repete os mesmos diálogos centenas de vezes. Mas pior que isso é a sensação de que a própria série já desistiu da personagem, subjugando a aparente postura de mulher empoderada a alguém que abdica dos seus objetivos em prol do homem com quem está. É certo que não é um homem qualquer, mas aquela justificação não enche as medidas de ninguém. Parece ter sido um motor para dar algum drama pessoal à personagem num momento em que o seu impacto na trama já é quase nulo.



No sentido oposto, Maze já foi uma das personagens mais queridas dos fãs, mas neste momento já está no patamar de figuração especial em que aparece como menção honrosa para fazer número e não nos esquecermos que a personagem existe. No fundo, mais valia que lhe tivessem dado um final digno com algum sacrifício grandioso ao invés de andarem a arrastar a sua procura por uma alma por mais de dez episódios para que a personagem chegasse à conclusão que todos nós já tínhamos tirado logo de início: Ela já tem uma alma. Parece que enquanto todos os restantes personagens avançaram para a Netflix e para a sua habitual construção de histórias, Chloe e Maze ficaram presas no loop de episódios intermináveis da FOX que costumam servir para dar um incremento no número de episódios e gerarem temporadas com vinte e tal capítulos em que a história avança a conta gotas. 


Mesmo com essas duas falhas no enredo, é certo que os restantes personagens se superam e fazem com que valha a pena existirem mais figuras na história além de Lúcifer. E temos de dar o mérito para a bonita homenagem que a equipa de autores fez ao seu percurso com o regresso de quase todas as figuras que em algum ponto deram o seu contributo para a série que conhecemos hoje, mesmo que nem todas sejam cruciais ou extremamente necessárias para o enredo são fan services que caem sempre bem e que nos enchem o olho, por parecer que nos estão a dar uma prenda por termos feito o percurso com estes personagens até chegarmos ao ponto em que estamos atualmente. É bonito e aquece o coração, além de ser uma demonstração de respeito profundo para com o público que, recorde-se, foi o grande responsável pela existência de uma quarta e quinta temporadas.


É inegável os paralelos que conseguimos ver, cada vez mais a olho nu, com Supernatural, mas aquilo que poderia ser uma desculpa para dizer que é algo que já vimos torna-se na solução perfeita para o público da série, ainda para mais agora, que a narrativa da CW foi encerrada depois de ter feito parte da vida de dezenas de pessoas por tanto tempo. Lúcifer está na sua melhor forma agora, em que até mesmo os episódios temáticos são ricos em conteúdo e nos deixam vidrados às viagens mirabolantes que os autores fazem, mas é também a prova de que tudo tem um tempo certo. 


Por melhor que seja o momento em que a série se encontra é assim que queremos que Lúcifer fique na nossa memória, como algo que realmente nos cativava, nos fazia rir e com personagens que fazem sentido. Longe dos esticanços e com alguma ousadia, podemos arriscar dizer que no futuro recente Lúcifer poderá ser a série com o final mais digno do público que acompanha a trama desde a primeira temporada. Consegue a maestria de nos deixar com saudades e a ligeira esperança de que não seja a última vez que assentemos olhos em Tom Ellis e na sua icónica versão do Diabo. 


Tom Ellis carregou a série nas costas, dando margem para que mais personagens brilhem, mas sem perder o brilho que retira da zona de conforto, numa leitura que ficará para a história como o casting pode ser a grande chave de um sucesso. Ele deixa-nos rendidos desde a primeira leva de capítulos, mas mesmo o ator parece estar agora num novo patamar e na sua melhor forma. Aplausos para a Netflix, também, que soube dar o fôlego que a série precisava, nós fãs só agradecemos!