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COMING UP | ÉLITE

Há novos episódios de Élite na Netflix, e esta é uma das séries que entra naquele grupo restrito em que a cada nova temporada a nossa expectativa só aumenta na esperança de que nos surpreenda ainda mais. Contudo, apesar do hype criado e dos teasers nos terem deixado a desesperar pela estreia, a verdade é que a quarta temporada caiu como uma bomba atómica no percurso da série. Se há algo em que podemos todos concordar é que esta não é a melhor season de Élite e nós vamos explicar porquê nesta edição do Coming Up, fica connosco. 

Há muito para dizer sobre esta quarta vaga em Las Encinas, mesmo que o conteúdo nesta temporada seja muito mais vazio do que aquele a que estamos habituados. Depois de no terceiro ano a trama se ter focado no desenvolvimento de personagens, desta vez colocaram um pé no travão fazendo com que tudo se resumisse à vida amorosa dos personagens, retirando-lhes substâncias e entregando plots mais ocos que o habitual. 

No fundo desta vez o que temos é mistério apenas pelo mistério como se não existisse uma outra forma de entrarmos no universo de Élite. Parece que chegamos a um ponto de ruptura de criatividade em que já repetimos fórmulas ignorando em grande escala os eventos que levaram os alunos até ao ponto de arranque desta quarta temporada. Mesmo que consiga conquistar-nos, a série está a sobreviver da empatia e familiaridade que já traz do passado sem procurar formas de cativar quem vê pelos novos núcleos ou arcos que façam realmente sentido. 

O caminho que Élite está a seguir é perigoso, porque por mais que o sexo funcione como um atrativo para a franja de público que acompanha Élite, o facto de desligarem a humanidade dos personagens fazendo-os saltar com alguma normalidade etapas de choque poderá matar o interesse pelo futuro da narrativa, mas já lá chegaremos.

Vamos a factos. Élite nesta quarta temporada perde alguns elementos importantes como Carla, Polo, Lucrecia e Nádia. São grandes perdas mas o que choca aqui nem é a ausência deles, é a facilidade com que a história de Élite segue em frente sem se preocupar (quase) em referir os seus nomes. 


Temos Nádia a ser utilizada tal qual como devia, mas mesmo as aparições de Nádia servem apenas para nos fazer questionar sobre o porquê de ignorarem Carla e Lucrécia. Será que Samuel realmente ultrapassou a sua paixão fulminante? Será que não teve mesmo nenhum significado? É obvio que, tal como em todas as séries, há personagens que podem desaparecer da trama, mas a forma como as saídas foram tratadas foi tão desprendida que chega a parecer desrespeitoso, sobretudo quando antes da estreia da série tivemos as curtas-metragens que evidenciaram ainda mais o peso que Carla tinha para Samuel, por exemplo. 


Parece que o background destes personagens veteranos foi apagado com uma borracha, ao mesmo tempo em que o crescimento e proximidade com os novos foi feito a um ritmo fulminante. De um momento para o outro, no espaço de poucos episódios, Ari já tinha uma importância na dinâmica dos alunos antigos que se torna completamente desproporcional. É certo que temos de criar ligações entre novos e velhos membros do casting mas também é importante que exista cuidado para que faça sentido sob pena de rejeitarmos à partida figuras que serão de agora em diante o futuro de Élite. Mas sobre estes novos personagens as criticas não ficam por aqui, até porque os autores não foram, de todo, justos com eles.



Élite sempre viveu muito da tensão sexual adolescente mas em nenhuma outra temporada teve um argumento tão perto de um enredo pornográfico em que tudo se resumia aos envolvimentos entre os alunos. E isso torna a abordagem dos novos personagens vazios. 


Enquanto Rebeka e Cayetana foram introduzidas com calma, com conteúdo, e com uma dimensão muito maior que vai para além do sexo, estes novos personagens parecem não existir para além das suas relações. Primeiro porque logo de início existe uma pressão para os emparelhar logo à partida, sem que antes conhecêssemos outras dimensões deles. 


O acidente de Patrick tantas vezes citado como uma experiência de quase morte merecia uma exploração maior no texto, mas ao invés disso tivemos uma figura que serviu para agitar outra vez as águas entre Ander e Omar e para render cenas com uma ousadia que quase passou do ponto. Mas agarrando neste mesmo exemplo há questões maiores que se levantam e que se prendem com a tal falta de criatividade. No final da terceira temporada e mesmo na curta-metragem que protagonizaram Ander e Omar passaram por uma experiência bem traumática que poderia ter mudado um pouco o comportamento dos dois ou pelo menos deveria ter dado a Ander algum crescimento mas ao invés disso temos o mesmo Ander que acompanhamos desde a primeira temporada com as mesmas discussões que chocam pela falta de ângulo na abordagem daquela que é uma das personagens mais interessantes da série. 


O mesmo com Omar que agora que finalmente abraçou a sua sexualidade parece ter ficado subjugado à sua relação e nesta temporada tem zero desenvolvimento pessoal. São apenas dois exemplos de personagens que perderam densidade e que estão perdidos no meio de um enredo que neste momento tem personagens a mais.


Por outro lado em termos de densidade temos Guzmán, que agarrou de vez o papel de protagonista mas que carrega, também ele, um arco com pouco sentido. 


Acompanhamos o relacionamento dele com Nádia crescer de forma meticulosa, romântica, cuidada, numa perspetiva que mesmo dentro do argumento de Élite passava muito para além do sexo. Mas de repente agora temos uma regressão com Guzmán capaz de fazer tudo para conquistar Ari apenas por uma questão de despeito numa luta de galos com Samuel que faz muito pouco sentido tendo em conta que as experiências do passado já lhes deveriam ter dado outras prioridades. 


No fundo, Benjamin, que é apresentado como o novo vilão da série, acaba por ser a personagem com mais razão dentro da trama. Se depois de várias mortes, assassinatos, crimes, e tudo mais, estes alunos continuam a ter atitudes tão infantis então talvez esteja mesmo na hora da educação deles se tornar mais rígida. Guzmán é capaz de fazer por Ari coisas que nem por Nádia, que todos acreditamos que seja a sua verdadeira paixão, fez. A ligação é ténue, fingida e parece tão rebuscado que nos eventos finais toda a dor e confusão se torna vazia. Não foi o melhor caminho para Guzmán e talvez tivesse sido melhor encerrar o personagem num ponto em que a sua redenção realmente nos fazia gostar dele. 


Saindo da bolha de Guzmán e passando para Samuel, a única pergunta que nos ocorre é: O que é que foi isto? Ele sempre foi impulsivo e sempre teve queda para relacionamentos peculiares mas parece que à semelhança de Ander não aprendeu nada e atinge uma nova definição sobre o que é uma personagem plana numa história, por mais voltas que dê na montanha russa, ele está no mesmo ponto desde o episódio um e por lá parece continuar.



Cayetana recebe o prémio para o arco mais interessante. Não que o relacionamento dela com Phillipe seja algo que nos cative mas não deixa de ser catártico ver a personagem que enganou tudo e todos a sofrer de problemas de confiança. 


Cayetana já tinha tido a sua própria jornada de redenção mas de um momento para o outro torna-se na única personagem entre os veteranos que realmente parece ter tirado partido do que aconteceu até então. E haja alguém, porque já estávamos a chegar a um ponto em que pareceria que as nossas expectativas enquanto fãs tinham sido atiradas por água a baixo. 


Contudo, temos de dar um elogio à forma como trataram o arco da antiga vigarista, porque a cada novo episódio existiu um esforço para a colocar em alguma das situações em que ela própria se tinha colocado durante o seu relacionamento com Polo, ou seja, no fundo, a redenção dela foi mais além provando que ela realmente aprendeu alguma coisa com o passado e mostrando ao público que ela está diferente e pronta para se tornar merecedora da confiança a partir de agora. 


Phillipe foi uma excelente adição ao elenco por ser o único que movimenta as águas sem que nos pareça como algo forçado e pela atualidade com que chega ao enredo para trazer para o centro da discussão o abuso e o assédio. É um dos arcos mais interessantes e aquele que provavelmente nos trará mais sumo na quinta temporada. Cayetana e Mencía carregaram nas costas o verdadeiro drama desta quarta temporada com duas tramas distintas que acabam por se tocar em alguns pontos e que trazem temas realmente importantes para uma trama que desta vez tem pouco conteúdo apesar de nos continuar a entreter e envolver. 


Na estética, a quarta temporada é a melhor de Élite mas é pena que o guião não tenha conseguido acompanhar a evolução técnica. É uma temporada pobre em contexto que não faz muito pelo percurso dos seus veteranos e que traz novos personagens que parecem interessantes mas que foram apresentados de uma forma tão pouco empolegante que nos fazem temer pelo futuro da série. 


Depois de um chorrilho de mistérios que nos fizeram apaixonar por Élite talvez seja hora de os autores abordarem o impacto real que tudo isso teve nos seus personagens ao invés de estarem constantemente a sobrepor mistérios em cima de mistérios. Por mais que o género seja um dos mais cativantes temos a prova com How To Get Away With Murder que nenhuma série sobrevive apenas do talento em criar mistérios, é necessário dar camadas aos personagens e sobretudo respeitá-los para não criar pontas soltas desnecessárias. 


As curtas-metragens que serviram de aperitivo à temporada foram excelentes e parecem colar de uma forma incrível com o que nos foi apresentado no passado mas ficam vários furos a cima quando comparados com esta quarta leva de capítulos que promete muito mas que bem espremida se torna numa parente pobre da Élite que conhecemos até agora. A série continua a ser uma daquelas que consumimos episódio atrás de episódio sem parar e que nos prende ao enredo mas estamos habituados a uma qualidade de texto que não tivemos aqui e que esperamos que seja corrigida durante a quinta season


Salvem Élite, porque dentro das séries que cruzam os temas adolescente e young adult, Élite é de longe a melhor do mercado e não há razões para nos deixarem com a sensação de que há falta de criatividade quando até agora provaram ser mestres na arte de nos surpreender. Venha daí a quinta temporada, estamos cá para voltar a amar Élite!