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COMING UP | Fate: A Winx Saga

Primeiro que tudo, uma declaração de intenções, Fate não são as Winx, pelo menos não da mesma forma exata que as conhecemos na infância. Contudo, apesar de algumas das alterações poderem, e até deverem, ser contestadas, a droga da nostalgia continua a ser o instrumento perfeito para garantir a nossa atenção para uma produção que não se cose com as mesmas linhas mas mantém a essência do original na generalidade do argumento. Fate continua a ser uma história sobre amizade, tal como Winx Club o foi noutros tempos. E é importante ressaltarmos essa mudança de tempos, porque o paradigma agora é outro e a equipa criativa da nova aposta da Netflix chegou-se à frente com várias decisões arriscadas que mesmo que numa primeira impressão gerem alguma rejeição acabam por tornar tudo coeso e moderno. Da mesma forma que a Marvel Studios tenta dar um banho de aproximação à realidade nos seus Avengers do cinema em comparação com a Banda Desenhada, aqui a Netflix esforçou-se por fazer o mesmo com um trabalho muito mais árduo pela frente porque apesar de já termos centenas de histórias de fantasia adaptadas ao género teenager nenhuma foi ousada o suficiente para agarrar com unhas e dentes uma animação altamente infantil e trazer a mitologia da trama para a atualidade de uma forma coerente e, sobretudo, envolvente. Fate: A Winx Saga estreia com nota positiva, apesar de algumas escolhas polémicas que não a tornam perfeita. Vem descobrir tudo o que temos a dizer sobre a introdução ao universo de Alfea na nova edição do Coming Up, fica em casa e segue a nossa sugestão!

Na mesma medida que retira, a série mantém as linhas gerais que definem o enredo central do Winx Club. Um dos principais acertos da adaptação é a capacidade que os argumentistas tiveram na hora de escrever o texto sabendo de antemão para que público estariam a falar, sabendo beber da inspiração da sua principal fonte mas também de outras tramas que assentam nos mesmos conceitos, sem que exista um esforço para ludibriar o público. A referência a Harry Potter logo no primeiro episódio liderou o caminho para diálogos bem produzidos que apelar ao público teenager, sim porque convenhamos que este é o género de história que encaixa no mesmo grupo de pessoas que assiste The Vampire Diaries ou Once Upon a Time, mas é também um produto contemporâneo da juventude dos fãs que cresceram com Harry Potter. Falar de magia com um realismo, tão apurado quanto possível, não poderia nunca ignorar a maior saga de feiticeiros dos anos 2000, além de servir de indicador sobre a personalidade das protagonistas para que públicos que não tenham assistido à saga das Winx tenham uma melhor noção de quem é Bloom , ao mesmo tempo que nos apresenta uma personagem original, Aisha, uma das melhores adições, mas falaremos melhor disso mais à frente. Para já, vale a pena ressaltar a base forte construída em cima da mitologia clássica de Alfea e o bom jogo de adições, com o universo de Harry Potter a não se ficar apenas como um easter eggs mas sim a servir de base para uma versão um pouco mais séria de Alfea como instituição, Hogwarts serviu de molde em alguns pontos e, apesar da margem de erro causada por uma aproximação demasiado forçada ou por se inventar demais para se dizer diferente ser gigante, no final o equilíbrio foi perfeito e harmónico com o tom da história de Fate.


Sentindo o peso à caneta vermelha que ditou as alterações temos de ter em conta os dois lados da moeda, há modificações sem qualquer sentido ou lógica mas também há novidades altamente positivas trazidas para este universo. Comecemos pelo lado menos bom da adptação, Musa. O problema nem é a forma como os poderes da personagem foram alterados, porque convenhamos que não seria fácil fazer a transposição da energia da música para dentro da narrativa com a mesma liberdade poética que outros poderes entregam. Com Musa a grande questão, altamente condenável, é a mudança nas origens da protagonista, sem lógica aparente e que só contribuem para a fúria dos fãs. Além de a despirem do seu passado asiático ainda brincam com alguma apropriação cultural que vai desde a escolha dos cabelos semelhante às meninas colegiais dos animes até à maquilhagem. Se já era grave uma trama que aposta tanto na representatividade e igualdade de género subverter a multiculturalidade, manter o mesmo look torna tudo ainda mais incompreensível. Um erro que até pode ser leve faz com que do público perca um fator de identificação, algo crucial quando o foco da trama são camadas de audiência mais jovem, onde é importante manter a ideia de uma sociedade plural. À parte disso, há algumas subtrações em relação ao original que só ajudaram ao dinamismo da narrativa. A fusão das três escolas da animação numa única instituição foi uma jogada de mestre, que trouxe consigo a igualdade de género e oportunidades para dentro da narrativa. Já no campo das personagens, temos de aceitar que no desenho animado, por ser tão infantil, há espaço para várias dezenas de figuras porque não existe a necessidade de lhes dar camadas, aqui, com um espaço de ecrã altamente espartilhado, as escolhas da equipa criativa foram acertadas e por mais que nos custe não termos Tecna no leque de protagonistas, temos de aceitar que a história fluiu muito mais com o aumento do corpo docente com personagens como Harvey do que propriamente em ter mais um sem número de fadas principais que ao fim ao cabo iriam estar a bater o mesmo ponto e que não acrescentavam mais do que aquilo que o principal grupo já apresenta. As adições ganham às perdas, com Sam ou Dane a desempenharem um papel muito mais fundamental do que Darcy ou Stormy, que não têm nenhum tipo de enredo próprio e que estão dependentes de Icy ou Flora e Layla que juntas formaram Terra.

Sem o exagero de personagens que serviriam apenas para encher o ecrã, abre-se espaço para desenvolver cada uma das protagonistas. Por mais que exista algumas oscilações entre completas coadjuvantes e ocuparem lugares centrais da ação, à sua maneira as cinco personagens conseguiram ter momentos de profundidade e desenvolvimento, algo que dentro das séries com o selo teenager nem sempre acontece, veja-se no mais recente exemplo oferecido pela Netflix em The Chilling Adventures of Sabrina. Neste ponto também é importante estabelecermos o paralelo com o original italiano, porque apesar de muitas transformações que deram algum realismo às personalidades das Winx, na base foram mantidos os aspetos que dão moral e mote às suas versões animadas. Stella foi o melhor trabalho dos guionistas, absorvendo todo o egocentrismo inicial da Princesa de Solaria, para lhe dar algumas nuances pouco habituais dentro daquilo que é, por defeito, uma protagonista de um núcleo teenager. Essa transposição foi feita da forma mais realista possível, com especial ênfase no plot relacionado com Ricki e a sua insuficiência para a magia, num trabalho de construção bastante louvável da quase desconhecida Hannah van der Westhuysen. Terra, tenta conjugar Layla com Flora no que à magia diz respeito mas na personalidade é algo completamente novo e, inesperadamente bom. Terra é a figura que nos consegue dar sensações bipolares, tanto amamos como odiamos. No primeiro capítulo já estamos fartos dela ainda antes dela começar algum diálogo, mas a chatice torna-se numa das grandes mais valias para nos arrastar para o seu arco. Em vários momentos vem à memória a Penélope de Bridgerton, o núcleo central das duas personagens é em tudo semelhante mas a bifurcação de personalidades traz para as duas novas tramas da Netflix personagens que conseguem aproximar mais o público que tenha formas físicas diferentes das comuns representações da televisão. O percurso de Terra, por mais linear que seja, prende e deixa-nos com altas expectativas para ver a extensão dos seus poderes, que no final desta primeira season parecem estar a desenvolver-se de forma muito mais rápida do que os das suas colegas. Há uma promessa de elasticidade de feitios que a longo prazo pode elevar, ainda mais, a proposta de Fate e que será, certamente, um grande chamariz para o público.

Abigail Cowen passa de uma quase figurante na já falada The Chilling Adventures of Sabrina para comprovar que foi um talento mal aproveitado na série de Roberto Aguirre-Sacasa. Com um texto que a ajuda a sobressair, a sua versão de Bloom foge à regra. Se nos primeiros três episódios achamos que estamos perante a típica protagonista, na típica história de origem, depois disso podemos concluir que há interesse em que a fada seja muito mais que isso. Na primeira temporada já nos deixou ver defeitos na sua ação, algum egocentrismo e teimosia que contrastam com a, também típica, coragem vinda de um poder infinito. Lembram-se da estupidez de Harry Potter em Deathly Hallows? Pois bem, na primeira season Bloom voltou a aproximar-se do jovem bruxo com uma postura de adolescente revolucionaria que se acha demasiado independente para o que é. Felizmente conseguiu ter em Aisha a sua versão de Hermione para a prender ao chão e não se deixar consumir pela parvoíce. Abigail tem momentos em que soa como um upgrade de Katherine McNamara em Shadowhunters e outros em que a sua própria vontade de formar o carácter de Bloom a fazem sustentar monólogos bem trabalhados que mesmo não saindo do contexto teenager conseguem ter força para agarrar outros públicos. É como se estivéssemos a ver a vontade da atriz em agarrar esta oportunidade em cada segundo que aparece no ecrã e essa entrega convence e rende-nos momentos de grande destaque num elenco que de forma geral é bastante aceitável, apesar de ainda ter uma grande abertura para melhorias, sobretudo pela falta de entrosão que nos convença que são de facto um grupo. Ainda estamos na primeira season e por isso temos de dar esse desconto, até porque termos uma proximidade gigante para iria desvirtuar o aparente realismo, numa segunda temporada esta construção de relações tem se de ser uma prioridade para o showrunner.  

Se no início temos Bloom a justificar-nos o porquê de não termos explosões de cor e asas, no final temos o inverso na aproximação possível às míticas transformações dos desenhos animados, numa cena que é um fan service mas que nos entrega bons indicadores para o futuro. Apesar de poder não encaixar na cruzada pela veracidade que os criadores parecem entender como prioridade, podemos sempre ansiar por ver momentos em que todas as outras fadas atinjam patamares elevados. Aquela expectativa de quem via os animes ou até mesmo Winx Club a ansiar por novas mudanças de guarda roupa podem voltar ao ativo e já só podemos esperar por momentos em que os poderes especiais se convertam em efeitos especiais brilhantes para transporem para a realidade de Fate as asas das protagonistas. Está a nascer uma nova forma de contarmos fantasia baseada em desenhos animados, Fate: A Winx Saga tem o potencial para trilhar este caminho de contar diferente sem desvirtuar completamente o lado bom da infância. O medo é notório na construção da nova aposta da Netflix, que traz mais uma visão feita de fã para fã, com boas propostas que encaixam públicos que estão mais que fidelizados pela CW. As apostas para o futuro é que exista uma aproximação ainda maior com que está feito na animação, é perfeitamente plausível que Rosalind faça surgir na ação a Torre Nebulosa é que no final da segunda parte tenhamos um grande evento em que surja um real confronto entre o bem e o mal. Depois de uma sequência inicial em que estamos sempre à espera que chegue o momento de luta, agora que todos os alicerces estão construídos, a próxima season pode, muito bem trazer o espetáculo com direito aos fogos de artificio dessa aproximação ao desenho animado acaba por trazer. Altamente maratonável, Fate: A Winx Saga tem o foco e a direção certa para nos conquistar, numa produção que é o serviço público da nostalgia. Que venha a continuação!