COMING UP | The New Mutants
Se The New
Mutants fosse uma série, a história que vimos seria o plot perfeito
para uma primeira temporada. Mas estamos a falar de uma longa-metragem e por
isso o spin-off de X-Men não se livra do carimbo de ter uma
passagem de tempo abrupta apesar de o background ser extremamente rico. Ou
seja, The New Mutants seria algo excelente se tivesse cumprido a
promessa e chegado em 2018, onde se livraria do peso de ter em cima quase três
anos de expectativas de fãs, numa franja de público que já é bastante exigente
e que nestes últimos anos foi alimentado com eventos épicos vindos do universo
Marvel. O filme não falha, mas tem pontos menos positivos que talvez ressaltem
ainda mais à vista por termos esperado tanto tempo para ver estes mutantes
estrearem no cinema. Há uma clara divisão da narrativa, há ali alguns
pormenores que lembram a franquia original, e no corte e recorte perde a coesão
e fica mais perto de uma minissérie do que de uma obra apoteótica. Já que
mergulhamos no mundo das séries nesta comparação, este é mais um daqueles
cancelamentos que será difícil de superar pela audiência, porque apesar de tudo
é altamente cativante e tem os ganchos colocados no sítio certo. Mas afinal é
bom ou mau? A análise corre o risco de se tornar tão inconsciente quanto o
ritmo da fita, mas para já podemos iniciar esta edição do Coming Up por vos
dizer que The New Mutants é uma reunião dos estilos FOX e Marvel Studios
e fica exatamente no meio caminho dos dois gigantes do cinema de heróis. Fica
connosco, porque há muito para explorar neste projeto que, finalmente, chegou
ao cinema.
Tempo, esse é o
grande problema na hora de adaptar The New Mutants, ou pelo menos na
hora de montar a longa-metragem. Há uma divisão clara na forma como a narrativa
nos é apresentada. A primeira meia hora dá-nos um contexto alargado e bastante
pesado, vai ao detalhe para nos apresentar a mutante protagonista. Depois ainda
parte para um embasamento dos arcos secundários e demora a arrancar o enredo
principal. Porém, quando arranca vem de forma tão abrupta com aquele tom de
ação a que os Avengers nos habituaram que a ligação entre os personagens
se torna pouco credível. Eles são uma equipa sim, mas era necessário perdermos
tanto tempo de filme a encaixar pormenores? A limar arestas? É que na primeira
meia hora parece, muito, que estamos a iniciar uma nova série. O estilo do
argumento é feito na mesma medida que X-Men: Apocalypse que se preocupa
em desenvolver o contexto histórico de Magneto para nos entregar justificações
para os seus atos. Aqui a diferença está no timing em que os arcos se
desenrolam. Porque se na franquia original estamos habituados a tramas que têm
duas horas ou mais de tempo de ecrã em The New Mutants estamos
condicionados a apenas uma hora e meia e essa diferença de meia hora torna
absurda a necessidade que os criadores têm de nos introduzir Danielle desta
forma tão específica. Até porque esse período do filme obrigou a um
desenvolvimento da relação entre a protagonista com Rahne fosse completamente
acelerado, brusco e com zero química a transparecer para o público. Ninguém
teve tempo de comprar aquele amor. Ao fim de três dias de confinamento na
instituição, as declarações que tinham uma para com a outra eram demasiado profundas
e quase fazem lembrar aquelas relações de Reality Shows que começam ao
fim de 15 minutos de programa.
O atraso na
estreia trouxe as expectativas altas e ainda atrapalhou alguns diálogos que
seria perfeitamente amarrados, mas que três anos depois já não têm o mesmo tipo
de impacto. O caso mais gritante acontece com Anya Taylor-Joy, em que a sua
personagem transmite o que pensa sobre a instituição e refere-se a Dr.Reyes com
uma predadora que gosta de ter pessoas enjauladas, ela chega mesmo a referir que
já conheceu homens como ela numa clara referência à sua personagem no filme Split,
um sucesso à época mas que atualmente já não é um tema tão recordado assim na
cultura Pop e que até perdeu alguma da sua fanbase depois do lançamento
de Glass, que não agradou a uma grande parte do público. Além deste
detalhe, junta-se ainda o facto de ser quase impossível que este universo
criado agora venha a ter uma continuação no futuro. The New Mutants
surgiu como uma história paralela aos X-Men da FOX que não parecem ter
espaço dentro MCU, e apesar de não ter nenhuma referência direta é bastante
improvável que se venham a encaixar na timeline de Avengers. O
que nos leva a questionar mais uma vez o espaço que teve a apresentação dos
protagonistas, porque no fundo o contexto gigante é bom para a trama deste
filme, mas há coisas que são desnecessárias e que existiram apenas para dar
início a algo maior. Fica a sensação de que há tempo perdido que poderia ter
sido útil quando focado noutras direções. E isto se nos desligarmos dos factos
importante para o universo Marvel que são apresentados ao longo do projeto,
porque ter Essex em pano de fundo não é mais que uma porta de entrada para
Mister Sinister como principal vilão na sequência.
Já falámos dela,
mas é impossível não dedicarmos mais espaço a Anya Taylor-Joy que como Illyana
só confirma o seu talento e nos mostra que é um dos grandes nomes do futuro de
Hollywood. A mutante a que dá vida é cheia de meandros e hipóteses de exploração,
mas muito do seu potencial vem do traquejo de interpretação da atriz. Ela
carrega a segunda metade da película nas costas, sobretudo quando falamos de
ação. Ela encarou o desafio de ser uma guerreira de uma forma muito mais
atrativa para este tipo de projeto do que o restante elenco, aliás ela não
passa longe da visão de Tom Holland com o seu Peter Parker, e ainda parte com a
desvantagem de não assumir a identidade de uma personagem que já reúne o
carinho e afeto do público. Illyana nos primeiros segundos de ecrã já consegue
dividir opiniões entre o seu carácter que é quase vilã, mas que muitos
interpretam apenas como uma menina bitchy, essa dualidade só ajuda a
conquistar ainda mais quem vê e a fugir do estereótipo sem ser forçado ou
descabido. Pelo contrário, o cunho é tanto que chega a ser ela o motor do hype
gerado em torno do projeto. Agora há uma grande questão, porque é quase
ofensivo que não exista uma continuidade na exploração deste personagem. E
dificilmente se encontra outra personalidade tão carismática quanto esta ao
ponto de nos fazer esquecer da versão de Anya. Está aqui um bom desafio para a
Disney, e sinceramente há possibilidade de a incluir de várias formas nas novas
fases do MCU, mesmo que isso não implique trazer a restante equipa.
A inconsistência
na linha narrativa estende-se também ao elenco, porque longe de Anya, a
protagonista Blu Hunt cai diretamente nos destaques negativos pela falta de
força na hora de construir a sua Dani. Aliás não há nada de memorável na sua
atuação e torna-se num completo contrassenso quando esta é a história que mais
espaço de desenvolvimento tem. Tudo bem que esta é suposto ser singela e amedrontada,
mas há pouca pujança nas cenas em que entra. Além da contracena com Maisie
Williams só prejudicar a ação. Não estamos a falar do facto de tudo na relação
entre as duas ter sido fundamentado em algo abrupto e sem o contexto que
merece, mas sim na falta de entrega das duas atrizes. Maisie, que se tornou
numa das maiores presenças de Game of Thrones, não passou além de um
casting mediano com pouco interesse e limitada. Os diálogos não ajudam entre
eles e até custa a querer que tenham saído das mesmas mentes que nos entregaram
Illyana. Há aqui um fator que talvez desculpe a fraca força das duas. Sendo
Maisie o nome forte de Hollywood que é, estaria certamente em vista uma entrada
triunfal dentro da academia de Xavier. Os cortes das cenas que ligavam a
produção à franquia podem ter ditado esta falta de empatia que se baseia no
bordão “demónios não entram em igrejas”, e pronto este é o resumo da
participação de uma das cabeças de cartaz que mais chamou a atenção da
audiência para The New Mutants. Charlie Heaton e Henry Zaga estão
claramente uns furos acima das colegas de elenco, contudo com uma abordagem tão
superficial que mereciam um segundo filme para poderem brilhar no ecrã.
É difícil julgar
The New Mutants no seu todo, porque esse todo não chega a existir.
Passamos do início para o final sem um meio. E o pior é que tudo isto é feito
com duas identidades na hora de montar, o que se nota pela introdução mais cheia
e sombria ao estilo FOX e termina com as piadas engraçadas nos momentos de ação
que parecem ter saído dos Guardians of The Galaxy. À parte disto os links
para uma continuação estão nos sítios indicados e deixam adivinhar que existia
potencial para uma série em torno dos personagens e isso até justificava a
aposta em lançar o filme no cinema e não em colocá-lo diretamente no streaming,
não é apenas uma questão de respeito com o público, existe algo de estratégico
dentro da Disney para que esta tenha sido a opção. Até porque o projeto foi
remontado tantas vezes que o facto de terem mantido essas conexões para o
futuro soa muito pouco a um mero acaso. No fundo, as expectativas não foram
alcançadas e de filme de heróis com terror pouco tem, a fórmula já foi utilizada
mais vezes e até com melhores visões, mas em resumo The New Mutants é bom,
mas não chega a convencer. Há futuro? Pelo menos no lado do argumento, espaço
para isso não falta. Resta entender qual é o fio condutor que melhor consegue
explorar estes personagens e não se ficar pela descrição rasa. A Banda
Desenhada já oferece as fichas, resta apostar. Em último caso, não há boatos de
novos Avengers a caminho? Illyana tem senha prioritária para entrar na
formação.
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