SETE FILMES POR SEMANA - COMING UP | Black Swan
Falar sobre
perfeição sem se tornar clichê é um desafio difícil, mas há lugar no Cinema
para uma longa-metragem que fala exatamente sobre o tema sem vacilar ou
resvalar para um texto óbvio. É pela lente da linguagem controversa de Darren
Aronofsky que chega uma trama que promete ser um verdadeiro quebra-cabeças se
olharmos para as entrelinhas do drama de uma bailarina em ascensão. Há dança,
atuações incríveis e um tom negro enquanto mergulhamos no íntimo da protagonista
para vermos espelhada a ambição que todos temos de sermos melhores no que
fazemos, e nas conquistas a que nos propomos. O talento é de sobra e a obra é,
isso mesmo, uma obra de culto que não pode passar batida entre os cinéfilos.
Espere pela música e deixe-se embalar connosco em Black Swan.
Natalie Portman
é um dos maiores nomes da indústria cinematográfica de Hollywood. Com Closer
e V for Vendetta entre os títulos do seu invejável currículo, poucos
papéis lhe assentaram tão bem quanto este em que veste a pele da aparentemente
tímida Nina. Este é o verdadeiro aperitivo de uma carreira de êxitos que
arrancou a sério depois desta película e ainda rendeu um Oscar à
artista. No argumento de Black Swan, Nina carrega nas costas a densidade
psicológica de uma mulher que não se define como boa ou má, é humana com todo
os seus objetivos, desejos, ambições, vontades, numa jornada de autodescoberta
que é feita em conjunto com o espectador ao longo de uma hora e quarenta e oito
minutos. Aqui há um retrato real do que somos em público e em privado no nosso
momento mais íntimo, deixando cair as máscaras que a sociedade nos exige para
deixarmos o nosso inconsciente tomar conta da nossa vida.
Vendida como a
personificação da bondade, lealdade e justiça, Nina é um estereotipo criado na
filosofia do filme para entendermos que o ditado “no melhor pano cai a nódoa”
não está tão errado assim. Lily, personagem de Mila Kunis, é o reverso da
moeda, que tal como no bailado que dá origem à fita faz sombra a Swan Queen.
São contrastes de personalidade, mas também uma forma de representar as
tentações da vida, e como facilmente podemos ser consumidos pelas más
intenções alheias. É na dualidade das duas protagonistas que nasce toda esta
trama que exige atenção e concentração para que se entenda cada detalhe e não
nos passe a mensagem de uma história rasa. Aqui Mila Kunis oferece a melhor
interpretação da sua carreira e pode surpreender aqueles que estão acostumados
a vê-la rir em comédias românticas ou filmes um tanto ou quanto duvidosos.
Desta vez consegue ser um páreo à altura para Natalie Portman, que neste
projeto consegue roubar toda a luz dos holofotes para si. A contracena entre as
duas atrizes é um enamoramento constante em que se sente a proximidade da
relação entre Nina e Lily a cada diálogo, ajudando a tornar o mistério final
numa conclusão muito mais épica do que podíamos esperar.
Há espaço para
abordarmos a dedicação que o mundo das artes necessita, o desgaste físico e
mental que só ajudam a criar a curva de loucura de Nina durante a história. O
objetivo é claro: Ter o seu lugar ao sol, a todo o custo, mesmo que isso
signifique deixar de parte tudo à sua volta ou desistir da sua personalidade
para ser invadida pelos dramas da personagem a que quer dar vida neste bailado.
É o sonho de uma carreira ter o seu nome como protagonista numa das mais
importantes e badaladas produções da história do Bailado, em que nada menos que
a perfeição é pedida. Não há espaço para falhas, erros ou deslizes, ao mínimo
passo em falso o papel poderá ser entregue a uma concorrente rival. Lily é essa
concorrente, e apesar de ser entregue ao público como uma mulher que procura
prejudicar quem está à volta apenas para conseguir chegar ao topo de uma forma
menos trabalhosa, não é de todo esse o caminho que o argumento tem para ela.
No final das
contas, e com os devidos alertas de SPOILERS, entendemos que
durante todo o tempo fomos envolvidos numa teia do subconsciente de Nina. Foi
uma armadilha para quem assiste, estamos o tempo todo a assistir à discussão
entre anjos e demónios numa narrativa que se preocupa em explicar cada ponto
que diferencia as suas personagens para mostrar como em conjunto formam aquilo
que todos somos: Imperfeitos. Oscilamos entre atitudes que batem em cada um dos
polos sem que isso faça de nós melhores ou piores pessoas. Claro que em Black
Swan, a dualidade é elevada ao extremo da loucura, mas isso já é um serviço
do argumento. É um distúrbio desta personagem, da mulher que foi vendida como
perfeita quando estava corrompida por dentro.
O último ato é
filosofia em estado puro. Nina consegue entregar a performance da sua vida. A
dança perfeita que toca o coração de todos. É infalível. Para de seguida
entender que todo aquele espetáculo e palco são na verdade um sonho. Ela acabou
consigo própria, chegou ao limite, e só por isso é que foi perfeita. Mas como
sempre nos foi dito: Não existe perfeição, e nesse sentido era impossível que
um momento como aquele tivesse acontecido. Não há lugar no mundo para uma
perfeição, porque tudo se tornaria muito menos interessante. Faltariam
objetivos, faltariam sonhos, apenas ídolos e isso é perigoso nos tempos que
correm. Black Swan não é um projeto que vá conquistar tudo e todos, mas
merece ser visto com o olhar de quem gosta de espreitar para lá da cortina, e
entender um pouco mais sobre como funciona a psicologia do ser humano. Não
espere encontrar o mesmo entendimento que o seu colega teve, porque um dos
fatores que torna Darren Aronofsky num sucesso é a capacidade de nos contar
histórias que são muito mais do que uma coisa só. Está aberto o debate, o que
vos diz Black Swan?
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