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Fantastic Entrevista | Ruben Gomes [Especial "On C@ll"]

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Foto: Adesiva (direitos reservados)

Nesta edição do Fantastic Entrevista, estamos à conversa com Ruben R. Gomes, criador e argumentista da nova websérie da RTP, On C@ll. Estreada a 6 de maio, a produção conta com 8 episódios e todas as segundas-feiras será lançado um novo capítulo na RTP Play, às 12h. Nesta entrevista com o criador da série, falamos não só da criação do projeto, como da importância de formatos do género em Portugal.

És licenciado em Comunicação e Jornalismo pela ULHT e fizeste uma pós-gradução na ESCS em Storytelling. De que maneira a formação foi importante para o teu crescimento enquanto criador?
Eu acredito que a base do sucesso profissional é a junção de dois fatores: uma propensão natural ou um gosto especial por determinada matéria e uma componente técnica. Eu, desde que me conheço, gosto de criar histórias e sempre soube que o meu futuro passaria inevitavelmente por este ramo. Mas faltava-me a técnica. Eu não sabia como estruturar uma história, não sabia como construir uma cena. Como tal, tirei vários cursos intensivos em escrita para televisão – e, mais recentemente, a Pós-Graduação em Storytelling. Só com essas bases é que me senti verdadeiramente capaz de desenvolver uma série. E a Pós-Graduação foi extremamente importante no caso do On C@ll, porque foi lá que descobri o gosto pela escrita de comédia.

Como surgiu a ideia de produzir uma série com o conceito de "On C@ll"?
A inspiração para o On C@ll surgiu precisamente durante uma aula de escrita de comédia, no âmbito da Pós-Graduação. Um dos exercícios consistia em criarmos uma personagem cómica e, posteriormente, pô-la num tipo de comédia que não tivesse nada a ver, à partida, com a sua personalidade. E assim nasceu aquela que viria a ser a Suzana Com Z, protagonista de uma comédia romântica, que arrancou muitas gargalhadas na turma.

Para além dos oito episódios semanais, marca também presença noutras plataformas como o Youtube e o Instagram. Como é que tudo acontece?
Quanto à mecânica multiplataforma, penso que surgiu naturalmente. Sabia que a Suzana era Youtuber e que o Tiago, o co-protagonista, tinha um perfil falso no Instagram. Então pensei: “por que não criar, de facto, contas para estas duas personagens?”. Depois o desafio foi escrever para três plataformas diferentes (Youtube, Instagram e RTP Play) de forma a que as três tivessem narrativas diferentes, mas que se entrecruzassem e, ao mesmo tempo, funcionassem isoladamente. Assim sendo, temos todas as Segundas-feiras o episódio semanal da série propriamente dita na RTP Play e, de terça a sexta, tanto a Suzana como o Tiago fazem uma publicação diária nas suas redes em jeito de reacção aos acontecimentos do episódio, ao mesmo tempo que lançam o tema para o episódio seguinte.

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Foto: Adesiva (direitos reservados)

Esta é a tua estreia como criador e argumentista de uma série, neste caso uma série online que será emitida através da plataforma RTP Play. De que forma é que o projeto RTP Lab, responsável por esta e por outras séries criadas por jovens talentos, é crucial para o desenvolvimento das mesmas?
O mercado televisivo em Portugal está viciado. São sempre os mesmo actores, escritores e realizadores que chegam ao público. Se não conheceres ninguém, não fores amigo de, filho de, não há lugar para ti. E eu, efectivamente, não conheço produtores, não sou amigo de realizadores conhecidos nem sobrinho de nenhum director de programas. Por isso, se a RTP não tivesse feito uma consulta pública, o meu trabalho nunca iria receber luz verde (porque ninguém se iria predispor a, sequer, lê-lo). Por outro lado, é recompensador saber que cheguei até aqui por mérito próprio.
Neste sentido, acho que é de louvar estas iniciativas da RTP, esforçando-se por chegar de forma concreta ao seu público e fazendo verdadeiramente serviço público ao procurar de forma honesta e sem agendas pelos criadores de conteúdos do futuro.

A série é protagonizada por duas personagens completamente diferentes. Inspiraste-te em pessoas reais para construíres a Suzana e o Tiago?
Pode dizer-se que estes dois personagens e a história do On C@ll se enquadram na máxima “escreve sobre o que conheces”. Sendo eu um jovem adulto, estou por dentro do modo como pensamos, do que gostamos, odiamos e de como encaramos a vida. Neste sentido, percebi que cada vez mais existem dois tipos de jovens: os aspirantes a Youtubers, muito supérfluos, materialistas e expansivos, sempre activos nas redes sociais; e os ditos nerds, muito tímidos e com problemas em expressar-se. A Suzana e o Tiago são uma versão exagerada e caricatural destes dois tipos de jovens. 

O humor é uma das compontentes fortes do "On C@ll". Porquê esta opção?
O On C@ll é uma comédia romântica. Como tal, o humor está fortemente presente. Uma vez que a ideia para o projecto nasceu de uma aula de escrita de comédia, decidi manter esta linha quando o submeti à RTP. No entanto, o tipo de humor mais presente nos episódios é talvez o exagero, sobretudo no modo como brincamos e desconstruímos clichés e estereótipos.

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Foto: Adesiva (direitos reservados)

O elenco assume um papel importante na definição de cada personagem. Foi fácil escolher os atores responsáveis por cada uma delas? Porquê?
Quando submeti o On C@ll à RTP associei-me à Adesiva, uma produtora que tem o seu próprio material e equipa técnica. A produtora tratou comigo de todos os aspectos da pré-produção, produção e pós-produção da série. E foi a Adesiva que me apresentou os actores que tinha em mente para cada personagem. Fizemos um casting com eles e, de facto, mal os actores abriam a boca, eu percebia imediatamente que a pré-selecção tinha sido correcta. Curiosamente, não temos actores famosos no elenco, mas todos eles têm formação de teatro e/ou se fizeram nas tábuas do palco, na tarimba.

Referiste que o "On C@ll" é uma série "multiplataforma 100% moderna, polémica e jovem, que serve de metáfora da emancipação feminina e que critica os millenials". Achas que as temáticas abordadas são importantes para que o público se identifique com a história? 
Pode fazer-se uma história sobre qualquer coisa, desde que haja um tema e emoção, porque é com isso que as pessoas se identificam. Hoje em dia, está muito na moda fazer-se telenovelas em que há explosões, tiros e mortes a torto e a direito, mas não há emoção e tudo parece muito desajustado.
O tema do On C@ll é: “quanto mais nos ajudarmos uns aos outros e expusermos os nossos sentimentos, mais nos descobriremos a nós próprios, podendo, inclusive, abrir as portas do verdadeiro amor”.

Mas, com a personagem Suzana, temos também uma metáfora da emancipação feminina. Acredito que muita gente vá condenar o On C@ll pelo modo como a personagem Suzana se vai apresentar: ela é materialista e muito sexual, usando o corpo para subir na vida. Mas o nosso intuito é apresentá-la como um produto da Sociedade – que, infelizmente, é machista, paternalista, e que objectifica e sexualiza a figura feminina. Mas, no decorrer dos episódios, a Suzana vai fazer uma viagem emocional, culminando, metaforicamente, no momento em que se torna ela própria e rejeita as imposições da Sociedade.

Enquanto criador de uma websérie irreverente e jovem, quais os maiores desafios criativos ao longo da produção da mesma?
Tive a sorte de ter o Rui Pinhão, o dono da Adesiva, como produtor. Ele fez um calendário de produção que foi cumprido à risca e, nesse sentido, só tenho a agradecer-lhe, porque me libertou de muitas preocupações. A Beatriz Teixeira, nossa Directora de Arte e responsável pelo guarda-roupa e maquilhagem, também tratou de toda a logística ligada à aquisição de roupas, adereços e maquilhagem. É preciso fazer-se distribuição de tarefas, por mais pequena que seja a equipa, e confiarmos no trabalho de cada pessoa. O desafio maior acaba por ser o de encontrarmos as pessoas ideais para cada área (e eu encontrei!) e arranjar a melhor forma de fazer um trabalho com qualidade dentro das limitações orçamentais.

Achas que o caminho da televisão irá passar em exclusivo pelas plataformas online, ou a televisão tal como a conhecemos continuará a ter a sua importância, ainda que se adapte à realidade atual?
Essa é a pergunta para um milhão de euros, que nem os grandes profissionais de média conseguem responder. A verdade é que as boas séries de televisão já estão a migrar para as plataformas online. Eu penso que, a longo prazo, o mundo da Internet vai ser mais apetecível para os anunciantes. E, quando isso acontecer, a televisão e o digital vão acabar por unir-se numa só plataforma. A consequência negativa disto será uma standardização dos conteúdos digitais, mais family friendly e com menos liberdade para se arriscar e se fazer conteúdos alternativos.



Fantastic Entrevista - Ruben R. Gomes
Por André Pereira 
Maio de 2019