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Duplo Clique | "A Casa é Dele"


A porta do prédio onde existe uma casa comprada por duas famílias, que terão de viver irremediavelmente juntas, já está aberta aos espetadores da TVI. A Casa é Minha – ou melhor, é deles – e como programa, o maior valor que apresenta é ser uma homenagem ao mestre da televisão Nicolau Breyner. Uma homenagem que não impede que se levante a pergunta: por quanto mais tempo ficaria esta série na gaveta da direção de programas se o ator não tivesse desaparecido?

Série de humor, elenco irrepreensível e direção de atores de Nicolau Breyner. Não foi o seu último projeto na TVI – A Impostora está mesmo a caminho e aí poderemos ver a sua última interpretação no ecrã –, nem deverá ser o que mais ficará na memória dos portugueses. Mas é o “registo” interpretativo em que pai da ficção nacional mais brilhou e divertiu as audiências: a comédia. 
  
A comédia, no entanto, é bastante frouxa em A Casa é Minha. Duas famílias são enganadas por um agente imobiliário “chico-esperto” – diz a sinopse – compram a mesma casa e chegam à conclusão que nenhuma está disposta a desistir do imóvel, passando a viver juntas até o caso estar resolvido. E até o caso estar resolvido, há um rol de piadas, anedotas e episódios cómicos para discorrer, pouco habilidosos a fazer rir o espetador.


O problema não é do elenco, em que se destacam Nicolau Breyner, Maria João Abreu, José Raposo, Rita Salema, António Machado e Tiago Delfino. São nomes sonantes da comédia em Portugal e de provas mais do que dadas em todos os domínios, que assumem o texto com naturalidade e convicção. Por isso, pode gostar-se mais ou menos de donas de casa histéricas ou de miúdos mimados; se os desempenhos forem verosímeis, não há problema. 
A questão é que a narrativa se constrói sobre anedotas e tiradas intelectualmente pouco estimulantes (pequenas coordenadas que poderão ajudar a perceber a natureza das personagens). Um tipo de texto acessível, pouco temperado e por vezes infantil que acaba por não surtir o nível de entretenimento desejado. Por outro lado, o espaço em que se desenrola a ação peca por ser sempre no mesmo, e a convivência entre personagens – e entre as personagens e o espetador em casa – torna-se assim cansativa.


Sitcoms televisivas, comédias de portas e outras séries de humor é o que não tem faltado no historial da programação generalista portuguesa. Recordemos Camilo e Filho, Aqui Não Há Quem Viva, A Família Mata, Giras e Falidas e, mais recentemente, Agora a Sério. Tendo tipos de comédia mais ou menos sofisticados e níveis diferentes de produção, são exemplos de como as séries deste género podem resultar apesar de terem os mesmos constrangimentos orçamentais (e, talvez, criativos). 
A verdade é que A Casa é Minha foi gravada em 2012 e alvo de sucessivos adiamentos na exibição, mantendo as portas fechadas até ao dia 28 de março deste ano, quando estreou. De pouco adianta estudar o contexto no qual a TVI encomendou este e outros produtos para depois os manter guardados. A verdade é que nos últimos anos se notou o desinvestimento dos canais privados nas séries de humor, em contraciclo com a aposta em novelas dramáticas da “vida real”. Os portugueses são assim tão deprimidos?


Recuperar em antena, ou mesmo estrear produções quando os artistas deixam para sempre o seu público é inquestionavelmente um gesto louvável, em sinal de homenagem à sua vida e obra. E assim como Nicolau Breyner era um dos mestres do humor no país – sendo eternamente recordado como o “senhor contente” – também a TVI devia pensar numa forma de dar continuidade ao seu trabalho e espírito de vida, apostando em projetos de comédia televisiva sustentados, irreverentes e sedutores de audiências. 
A Casa é Minha é uma boa forma de manter acesa a chama e o talento de Nicolau Breyner, e vai para o ar de segunda a sexta ao final da noite. Oxalá as famílias se resolvam… e a TVI decida investir na comédia. 
A Casa é Minha, para ver de segunda a sexta-feira, às 25h55, na TVI. 

Duplo Clique - 75ª edição
Uma crónica de André Rosa