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COMING UP | Young Royals

Vamos de viagem até à Suécia para falarmos sobre o aguardado regresso de Young Royals. O inesperado sucesso da Netflix que nos deu um quentinho no coração quando chegou pela primeira vez ao catálogo da gigante do streaming e que agora nesta segunda temporada solta as amarras e puxa os traços de personalidade dos seus personagens ao limite, tornando-se numa das séries adolescentes com uma melhor noção sobre o que, de facto, é ser-se adolescente. 

Por mais que na base de construção Young Royals traga uma espécie de fábula clássica, a série não se fica pela zona de conforto e depois de uma primeira temporada em que os autores foram dando passos dentro do trilho para garantirem que não fugiam demasiado a bolha de segurança, nesta segunda parte rebentaram a bolha e entregaram uma história mais rica, coesa e personagens complexos que são representatividade autêntica. 

Young Royals é uma obra importante para o futuro e um projeto que mesmo com essa dimensão forte não deixa de encaixar na lista de séries fofas. Fica connosco em mais uma edição do Coming Up. Há muitos temas para discutir e muitos acertos para enaltecer. 

Young Royals é uma daquelas séries que une referências clássicas com a modernidade, com os problemas do mundo atual, e que consegue essa união sem parecer que estão a forçar que algo aconteça. 

A base clássica do romance entre pessoas de diferentes classes sociais é, nesta segunda temporada, apenas um detalhe, porque a série dá todo o seu empenho em mostrar como o universo dos adolescentes é um terreno pantanoso onde as emoções e os sentimentos são elevados ao expoente máximo.

Nesta segunda viagem pela vida dos personagens da série somos confrontados com as consequências da exposição do vídeo íntimo de Simon e Wilhelm, com a coroa a desmentir que fosse o Príncipe Herdeiro a estar naquele cenário e recaindo sobre Simon todas as repercussões, pelo menos no que ao lado público diz respeito. 


Temos aqui dois pontos importantes a ter em conta sobre a sociedade de hoje, e ainda só estamos no primeiro episódio. Primeiro, a privacidade cada vez menor que todos tempos fruto da nossa utilização das redes sociais e do facilitismo em tornar tudo viral rapidamente. Em segundo, e não menos importante, o papel que a sociedade tem no que diz respeito à sexualidade do outro, à sua intimidade. 


Já dêmos alguns passos importantes na mudança de mentalidades e fazemos cada vez mais progressos nesse campo, mas aquilo que a sociedade ainda parece demorar a entender é que não cabe a ninguém tomar o passo de tornar pública a sexualidade do outro. Aliás, nem o próprio tem uma obrigação moral ou social de o fazer, e essa necessidade constante de rotularmos o outro na sua “caixinha” é um processo violentíssimo quando estamos a falar de jovens. 


Ainda assim, a série teve uma abordagem cautelosa sobre isto, até se esperava um pouco mais de arrojo, mas teve o necessário para passar a mensagem fundamental que é: Cada um tem de se meter apenas no que lhes diz respeito. Não é, de todo, de admirar que os comportamentos dos protagonistas nas cenas seguintes a esta exposição massiva sejam errantes. 


Além de estarmos a falar de adolescentes com as hormonas a borbulharem falamos, ainda, de pessoas que acabaram de passar por uma experiência um tanto ou quanto traumatizante à qual ainda acrescentam detalhes mais duros dada a posição social de Wilhelm. 


É tudo muito violento, e a série consegue passar essa mensagem sem a necessidade de colocar uma nuvem negra sobre a história que distancie a série do seu público-alvo. É um equilíbrio perfeito.



E falemos das atitudes. Tal como já dissemos falamos de adolescentes, aquela fase complexa da vida onde tudo ganha um peso gigante e onde as nossas emoções parecem mandar mais no nosso corpo do que nós próprios. Young Royals consegue nesta segunda temporada superar as expectativas e ultrapassar séries como HeartstopperNever Have I Haver ou Love, Victor no que diz respeito à construção de personagens adolescentes. 


O fator de identificação está no ponto certo para que qualquer um de nós consiga mergulhar a fundo nos dilemas daqueles personagens e consegue fazer com que exista algum tipo de relação com aquilo que eles estão a viver. 


Seja na impulsividade de Simon, na agressividade de Willie, na verdade de ter um sentimento de pertença de Sara, ou até no comportamento egoísta de August. Sim, estamos a falar de defeitos, mas convenhamos que nesta fase da vida são os aspetos mais negativos da personalidade que saltam mais à vista e aqui estão representados no tom certo, com o contexto indicado para que pareçam fluídos e sem materializar vilões. Na verdade nós conseguimos entender o que leva a que tenham estes comportamentos, conseguimos percebê-los e acabamos por justificá-los na nossa mente. 


São errados, na sua larga maioria e inconsequentes na medida em que afetam várias outras pessoas que estão à sua volta e que são inocentes? Sim, mas tudo isso faz parte da definição sobre o que é ser adolescente e da vontade que nestas idades todos temos de agarrar o mundo com as duas mãos e moldá-lo como se fosse plasticina. 


Falamos em comportamentos e é interessante e importantíssimo ver como a série se debruça sobre estas atitudes dos personagens, deixando que a história de cada um flua de forma que todos eles aprendam uma lição que os leve a crescer e a amadurecer. 


Estamos a ver personalidades a serem esculpidas à nossa frente de uma maneira verídica para uma série de romance adolescente. Pelo meio há ainda espaço para falarmos e debatermos a relevância que o acompanhamento (quando necessário) tem neste percurso e o quão necessária é essa ajuda externa para garantir uma orientação. 


Willie, num dos seus momentos de fúria agressiva é obrigado a frequentar um psicólogo. O protagonista começa por ir contra a sua vontade, com a narrativa a deixar clara a forma respeitosa como o psicólogo trata o adolescente que tem à sua frente, e ao longo da temporada vemos o quanto essas sessões o fazem crescer e o quanto o ajudam a focar e a aprender. 


Isto sem perder o realismo, deixando claro que este acompanhamento não é uma cura milagrosa, daí que Willie ainda continue a ter episódios agressivos nos últimos capítulos da trama, mas, ainda assim, garantindo que o público que assiste entenda que existem avanços, que não é algo que deva ser visto com tabus ou como algo negativo, mas sim como algo que os pode, de facto ajudar. 


E este pequeno detalhe é mais um grande ponto a favor sobre o papel educativo de Young Royals, que nesta temporada se torna num excelente caso de estudo para ser analisado entre os adolescentes. 


Nós entendemos o que os personagens sentem e o que cada um defende na posição em que está, daí que, mesmo quando Simon decide envolver-se com um outro rapaz e continua esse relacionamento deixando-o desenvolver sentimentos por ele, sabendo que continua a estar apaixonado por Willie, não consigamos criticá-lo. 


É fruto das circunstâncias, sabemos que é errado, e que é altamente reprovável que ele brinque com os sentimentos de alguém que, ainda por cima, o estava a tratar de forma cuidadosa, porém, ele está a tentar sair de uma situação traumática sem ter sequer noção completa do que o levou àquela posição. 



Willie está ferido e ele ao contrário de Simon tem a noção perfeita de que a culpa é de August, mas por mais que saibamos quem agiu de forma incorreta aqui não deixamos de apontar o dedo às atitudes de Willie e ao bullying velado que ele faz. Nesse sentido, a série também lhe dá uma chapada leve mostrando que no final aquilo que ele fez, o plano para destruir August, não correu conforme esperado. Ou seja, de uma forma clara, os autores mostram que o caminho não é por ali. 


Já que falamos sobre Willie, é importante referir que por mais que toda a história dele ser o próximo na linha de sucessão ao trono nos pareça utópica, não deixa de ser interessante ver alguns paralelos que Young Royals constrói com aquilo que vemos em The Crown. Apesar de amenizar um pouco as coisas consegue entregar-nos a sensação de que no mundo real realmente poderiam existir exigências destas. 


Os movimentos políticos que envolvem esse arco do personagem são interessantes de analisar com The Crown como contraste para reforçar a visão tradicionalista da monarquia, e como a vida de quem faz parte da corte lhes deixa de pertencer a partir do momento em que nascem. 


E sobre August, bem aqui temos uma das figuras mais marcantes desta segunda temporada, com uma criança que fez asneiras maiores do que a sua consciência lhe permite entender, mas que é usado como peão num jogo de xadrez de adultos. 


Existe a dado momento uma sensação de jornada de redenção que nos deixa a torcer para que no final fique tudo bem, mas depois percebemos que no final das contas o seu lado manipulador e egocêntrico ainda continua lá e que ele está disposto a passar por cima de todos para manter a sua posição e estatuto. 


É, em parte, culpa da negligência dos personagens adultos de Young Royals? Totalmente. Mas isso é outro dos pontos positivos da série: Mostrar como facilmente nos esquecemos do que passamos naquela idade e como rapidamente ignoramos e menosprezamos os problemas que para quem os sente são bem maiores do que aparentam. 


É louvável a abordagem da série sobre o que é, de facto, ser-se adolescente, e merece ainda mais aplausos por introduzir esses traços realistas numa história com uma premissa tão fantasiosa sem deixar que nenhum desses dois elementos perca força em detrimento do outro. 


Para uma série deste género, Young Royals tem uma maturidade digna de referência com temáticas, diálogos e discussões (até nas entrelinhas como o caso de Sara, que mesmo pertencendo a uma classe social bem mais baixa tenta a todo o custo manter o estilo de vida das amigas para se conseguir envolver) que são cruciais para a nossa formação como cidadãos. 


Muito mais que falar sobre representatividade LGBTQIA+, Young Royals é uma história que representa os adolescentes de hoje, com dilemas que são substancialmente diferentes dos nossos devido à era digital e com uma necessidade ainda maior de se afirmarem à ditadura das aparências. 


Além da verdade que transparece nos temas, ainda continua a manter um dos aspetos mais interessantes que elogiamos na primeira temporada, que é ter atores que não obedecem a padrões de perfeição, que são pessoas, adolescentes, reais, com acne, com formas diferentes, algo extremamente raro nas grandes produções, e que só encontra um par à altura em Heartstopper


De maratona fácil, os seis capítulos da segunda temporada tornam este universo de Young Royals ainda melhor e elevam a história, mas sobretudo os seus personagens, para outros lugares, com mais dimensões e personalidade. 


Tudo isto sem podermos deixar de referir que o gancho final nos deixa a desejar por uma renovação imediata. 


Esta é uma daquelas séries que ainda não se esgotou e que é importantíssima para os jovens de amanhã, não nos falhes Netflix, estamos a contar ver mais sobre a história do Príncipe Herdeiro.