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COMING UP | Moon Knight

Terapia continua a ser a palavra forte da Marvel na Phase 4, com Moon Knight a confirmar a tendência com uma narrativa que puxa o existencialismo e a psicologia para dentro do Universo dos Super-Heróis. Moon Knight apresenta-nos a uma longa lista de conceitos enquanto se debate por mostrar a doença mental e tenta criar lógica entre os eventos da série e aquilo que já conhecemos da Marvel nos cinemas e no Disney+. É uma salada russa de elementos bem diferentes e que acabam por tornar tudo um pouco inconsistente. 

Nas suas tentativas de tocar em vários pontos, Moon Knight acaba por se tornar na série mais maçadora da MCU. Tem vários ganhos e acertos, é certo, mas parece ter demasiado conteúdo para apresentar num argumento que não parece ter firmeza suficiente para saber até onde quer chegar. No seu todo, Moon Knight, é um círculo, uma narrativa que dá uma volta gigantesca para no último episódio deixar o seu protagonista na mesma posição frágil que estava quando o conhecemos. 

A sensação que fica é que fomos do Porto a Lisboa, mas passamos primeiro pelo Algarve, em viagens desnecessárias apenas para tentar apresentar o máximo de conceitos num curto espaço de tempo. Falamos-te do bom e do menos bom desta aposta do Disney+ na edição desta semana do Coming Up, fica connosco!

O Egito é, por si só, um poço de cultura infindável, com lendas gigantescas cujos significados ainda hoje muitos historiadores tentam descobrir. E é nesse universo rico que a Marvel monta o palco de Moon Knight, aquele que para quem conhece as Bandas Desenhadas é um dos heróis mais peculiares, dramáticos e polivalentes desta franquia. 


E polivalente porquê? Ora, Moon Knight vai buscar o lado místico situando os Deuses Egípcios como parte integrante de um universo onde super-heróis vivem entre nós e ajudam a combater os problemas do mundo. 


E fá-lo de uma forma bem arrojada, visto que não aborda o lado místico com os tons coloridos de Doctor Strange que parece ter mais ligações com a forma como a ciência e a psicologia tratam o sobrenatural, nem entra pelo caminho de humanizar Deuses como acontece em Thor


Aqui, a construção é feita de uma forma um pouco mais arcaica dando-nos uma real noção de que falamos de divindades, com tudo o que isso acarreta. 


À parte do misticismo, Moon Knight ainda se arrisca a juntar a isso a saúde mental, outro tema impactante, mas ao mesmo tempo sensível, que exige um tratamento muito cuidado na sua abordagem sob pena de parecer um aproveitamento do texto em cima de problemas que são, de facto, sérios. 


Mas, essa abordagem aos transtornos de personalidade de Marc Spector torna-se num dos grandes pontos altos da série. E tudo porque há um respeito enorme pelo personagem e não tentam a todo o custo olhar para o seu transtorno como uma solução para acelerar o argumento. Preocupam-se, sim, em tentar diferenciar as personalidades que existem dentro daquele homem, justificando o porquê desse transtorno existir e explorando os seus traumas (que são vários) sob um ângulo interessante que consegue agradar tanto ao público mais erudito quanto a quem consome franquias mainstream como a saga dos Avengers.



E entre tudo isto, a série ainda tem a “obrigação” de definir a escala de poder de Moon Knight e torná-lo numa figura atrativa que leve o público a interessar-se em ver no futuro uma ligação entre ele e a restante equipe de heróis que já conhecemos. 


Neste ponto, a série tem em mãos uma quantidade gigantesca de problemas e a necessidade de dar respostas em limitador seis episódios, fazendo com que conteúdos tão densos tenham de ficar apenas pela rama sob pena de tornar a série em algo chato. 


E aqui começam os defeitos a surgir. Moon Knight até consegue estabelecer bem os alicerces para fazer a narrativa avançar e explorar os transtornos de Marc, além de nos apresentar dois super-heróis em bónus quando apenas esperávamos conhecer o Moon Knight, mas o ritmo oscila bastante. 


No primeiro, segundo e terceiro episódios parece que estamos num loop constante de apresentações para uma história de origem confusa e em alguns pontos soa desconexa. Parece que estamos a ser massacrados com informação atrás de informação, reviravoltas e plot twists sem termos uma noção clara do que está a acontecer. 


Essa ausência de um barómetro entre o que é real e imaginado acaba por fazer o nosso interesse sobre a história do personagem cair e gerar uma falta de apego grande porque se torna quase impossível termos algum tipo de emoções sobre este personagem quando o vemos ter atitudes contraditórias em todos os episódios. 


A partir do quarto as coisas mudam de figura. Entra a base das Bandas Desenhadas para nos ajudar a mergulhar um pouco sobre esta história. Entra, por fim, a relação entre Marc e Steve, entra depois a verdadeira história de origem para o transtorno do protagonista, entram todos os elementos que fizeram falta no início para nos conseguirmos enquadrar e para entendermos tudo. 


Mesmo sem querem fazer um explicadinho de tudo o que está a acontecer à nossa frente, desta vez a Marvel talvez tenha ousado demais nesta inversão da ordem lógica da narrativa. Sobretudo tendo em conta que nos primeiros três episódios tivemos momentos mortos de sobra para conseguirem introduzir tudo isto aos poucos.


Todo o lado místico do Egito fica descarregado nos primeiros capítulos e quando realmente já começamos a estar um pouco mais à vontade com a abordagem da série a respeito do que é a Eneida, das vontades e obrigações dos Deuses, já perdemos Khonshu de vista. 


Tudo acontece muito rápido e sem termos tempo para entender a importância da ligação entre o Deus e o seu Avatar. Até poderíamos perder Khonshu mas talvez a ordem dos eventos devesse ter sido invertida, para depois de termos consciência de tudo sentirmos a sua ausência como algo de realmente dramático. 


Assim, quando ele desaparece nem temos uma consciência clara sobre as consequências de não o ter por perto. Faltou cuidado no argumento, ou pelo menos faltou ao argumento ter o mesmo cuidado na construção desta ligação entre Marc e Khonshu como teve em estabelecer a parceria entre Marc e Steve, porque essa sim estava no ponto alto que conhecemos da Marvel. 


Parece que toda a atenção na hora de estabelecer personagens foi entregue a apresentar Marc e Steve, deixando tudo o resto de lado, enquanto temos Harrow, o vilão, a ficar com as sobras sem parecer tão ameaçador assim. Tirando o último episódio em que vemos a verdadeira face de Amit, até então, não temos o mínimo vislumbre da ameaça que ela representa. 


Temos o contexto base, mas nada mais do que menções e diálogos aqui e ali, parece, em alguns momentos, que a série se regeu pela base das coincidências forçadas para terem os dois pesos da balança. 


Amit surge única e exclusivamente da necessidade de se cumprir uma fórmula básica e da vontade da Marvel de oferecer um vilão em cada produção, quando na verdade se excluirmos essa dicotomia do argumento teríamos ganho mais espaço para conhecer a relação tóxica entre Khonshu e o seu avatar, em vez de termos tudo colocado às três pancadas.



Moon Knight é a primeira série de origem de um super-herói da Marvel sem ter à cabeceira um outro já conhecido e nesta primeira viagem o saldo do Disney+ fecha no negativo, com um drama pouco trabalho que se subjuga aos estereótipos de colocar um vilão e um interesse amoroso numa trama que já tem tanta riqueza por explorar que não precisava de elementos tão clichê. 


E nessa pegada de defeitos ainda constam as milhentas participações especiais de personagens que acabam por trazer muito pouco à história. Temos várias menções e até a aparição de Anton Mogart, um dos vilões clássicos das Bandas Desenhadas, e até a introdução de Tuéris como personagem original, mas a conclusão que nos é dada pela série é de que estas figuras serviram apenas para preencherem o tempo de série e que ao fim ao cabo não são tão relevantes quanto deveriam. 


E sim, sabemos que uma vez que se trata de Marvel as possibilidades destes coadjuvantes serem integrados em algum projeto futuro é alta, mas convenhamos que sendo este o seu projeto de origem esperava-se um tratamento que os colocasse como pontos de interesse futuros. Como aconteceu, por exemplo com Agatha em WandaVision, sobre a qual, realmente queremos saber e ver mais. 


Tuéris ainda acaba por se conectar com Lila no final, abrindo espaço para que a personagem tenha algum relevo, mas por enquanto ficou apenas marcada como um alívio cómico bastante criativo e nada mais que isso. 


Até porque, ao contrário de Loki, Moon Knight não teve uma segunda temporada confirmada e deixa-nos com ganchos gigantes sem um futuro definido, o que empobrece ainda mais a jornada. 


E falando em jornada, passamos grande parte da série a entender as diferenças e os problemas na relação entre Marc e Steve, e acabamos com uma terceira personalidade a ser revelada que coloca o protagonista no mesmo ponto de medo e incógnita que tinha no arranque da série. 


Ou seja, parece que tudo acaba no momento em que as coisas se tornam interessantes, com tudo em aberto. É o círculo a recomeçar obrigando Steve e Marc a refazerem novamente os seus passos para entenderem que é a outra pessoa com quem partilham o corpo. 


Mas enquanto isso deixa tudo mais empolgante, por outro lado também torna a jornada inglória, parece que ele passou por todo este processo para depois ficar, de novo, entregue aos seus medos. Parece que andamos em círculos e que esta viagem acaba no ponto de partida. 


Nem tudo foi tempo perdido, porque agora ambos têm a consciência de quem é Marc e de quem é Steve, mas as restantes dúvidas mantém-se sem que a Marvel nos deixe descansados com um anúncio de uma nova temporada que mudaria completamente a nossa perspetiva sobre este final ambíguo. 


O último capítulo apesar de nos deixar inquietos com todas as perguntas que deixa em aberto serviu para, pelo menos, vermos uma melhoria significativa nos efeitos visuais que se voltam a aproximar do patamar a que a Marvel nos habituou e para termos uma luta épica que torna a série um pouco mais memorável. 


Isto claro, sem esquecer, o brilhante trabalho de interpretação de Oscar Isaac, que volta a provar aqui que é um ator que chega a todos os registos sem perder o seu sentido de verdade na interpretação. 


Que venha rápido um anúncio sobre o futuro de Moon Knight, porque no arranque de uma nova fase a Marvel não se pode dar ao luxo de ter destinos em aberto. Foi assim que muitos serviços perderam o seu público fiel, fica a nota.