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Miúdos que Já São Graúdos - Pedro Moldão


Tornou-se conhecido do grande público pelo seu papel em Os Batanetes, em 2004. Ao longo dos últimos 16 anos, o "miúdo" que nos fez rir na sitcom da TVI cresceu e têm sido muitos os trabalhos que concretizou, tanto na televisão, como no cinema, no teatro ou até na música. Pedro Moldão é o nosso convidado nesta edição do "Miúdos que já são Graúdos". 

Começas a tua carreira como ator em “Os Batanetes”, uma das séries de humor mais populares de sempre na televisão portuguesa. Como recordas esta primeira experiência? Ainda hoje és abordado por este projeto?

Quando me recordo desses tempos lembro-me principalmente de estar entre família, figurativamente e também literalmente, visto que o meu irmão também participava. Quinta-feira de tarde e sábado, para não perder nenhuma aula, ia passar um dia de diversão e aprendizagem, sempre. Como primeira experiência não podia estar num melhor sitio. Era muito bem acompanhado tanto pelos atores, como pela equipa e até família. Foi um choque todo aquele sucesso e principalmente o aprender a lidar com o reconhecimento na rua, na escola principalmente. Mas penso que fui sempre bem encaminhado e que soube gerir bem.

Hoje em dia existe principalmente um “eu conheço-te de algum lado, és de Sintra?”. Mas é engraçado que me reconhecem mais vezes por um projeto que fiz quando tinha 10 anos do que por um projeto que tenha feito nos últimos anos.

Na altura, contracenaste com grandes nomes da ficção nacional: Rita Ribeiro, Vitor de Sousa, Inês Castel-Branco, Anita Guerreira ou Leonor Alcácer são apenas alguns dos exemplos. Que importância tiveram estes colegas de elenco, quer a nível pessoal, quer profissional?

Estar rodeado de pessoas com tanta experiência e vivências só poderia ser algo incrível. Eu era o “puto” da família e era apadrinhado por cada um deles de maneira diferente. Havia mesmo uma sensação de “família” e uma preocupação que ia para além do profissional. Foi bastante tempo de gravações, e numa fase de crescimento que é a pré-adolescência foi muito importante ter pessoas ao meu lado que se preocupavam. A nível profissional, fui obrigado a adaptar-me. Eu vinha do zero e eles estavam no topo. Tanto a nível de representação como o saber estar num decor, foram eles que me ensinaram muito do que sei agora com 26 anos.

Depois desta série, participaste em alguns formatos infanto-juvenis, como é o caso de “Chiquititas”, “Floribella” e “Detective Maravilha”, este último protagonizado por ti. Todos eles tiveram impacto junto do público mais novo. Achas que fazem faltam formatos do género atualmente, em Portugal?

Penso que existe uma altura para tudo e que talvez esses formatos hoje em dia teriam que ser adaptados. Não estão a ser feitos e as pessoas que escolhem os projetos devem saber o que estão a fazer. As crianças de 13 anos já não são iguais aos meus 13 anos. Já não estão tão ligados à televisão, mas sim à internet, ao youtube, aos jogos. O público-alvo das estações já não é essa faixa etária. Mas certamente que com as devidas adaptações, seria algo interessante a fazer, até porque a ideia de “escola de televisão” que eram os “Morangos”, por exemplo, já não existe. Oportunidades para malta jovem e não conhecida do público é muito reduzida em comparação ao que era há 10 anos atrás.

Integraste também o elenco de “Windeck”, gravado parcialmente em Angola. Como encaraste este desafio, que fez também bastante sucesso em Portugal?

“Windeck” foi um dos projetos televisivos que mais gosto me deu a fazer. A oportunidade de viajar, ainda por cima para um novo continente, enquanto trabalho é uma ideia que me fascina. O melhor foi sem dúvida conhecer uma cultura muito diferente, mesmo que de base lusófona. Não sabia bem o que esperar como ator. A equipa técnica era principalmente portuguesa, mas não sabia como seria a receção dos atores português por parte do povo angolano. Felizmente foi um enorme sucesso em Angola, Portugal e também outros países para onde foi vendida a novela como Brasil, Jamaica, etc.

Em televisão, os teus últimos grandes papéis foram em “I Love It”, “Massa Fresca” e “Água de Mar”. Numa altura em que as séries têm vindo a ganhar destaque em Portugal, em que tipo de projeto gostarias de participar com um grande papel? Achas que o formato série vai conseguir destacar-se em relação às telenovelas?

Neste momento, em televisão, gostaria de trabalhar numa série ou minissérie. Isto porque existe mais tempo para fazer algo mais reduzido. Isso dá espaço para explorar mais a personagem e tentar procurar algo que as novelas às vezes, por ser um ritmo alucinante, não nos deixam encontrar, ou tornam mais complicado encontrar. Sonhamos sempre em participar num projeto inovador a nível de escrita, realização, formato, representação e que seja um sucesso. Não consigo pensar num tipo de projeto especifico, ou temática especifica. Todo o tipo de projeto pode ser muito gratificante. Principalmente nestes tempos, qualquer projeto é uma bênção.

Como tem sido provado, cada vez mais, as gerações mais novas consomem mais series do que novelas. Mas o formato de novela ainda tem muito para dar. Acho sinceramente que as series poderão vir a destacar-se, até porque já se anda a chamar série a novelas, mas isso só acontecerá daqui a alguns anos. Acho que antes disso as novelas vão adaptar-se, como já está a acontecer.

O sreaming está também a ser uma aposta cada vez mais forte – para além de estarem a ser preparadas as primeiras produções de ficção para a Netflix em Portugal, a RTP Play tem investido também em conteúdos inéditos e a SIC estreia em novembro a plataforma OPTO SIC. Achas que a forma de consumir televisão vai mudar? Como vês este tipo de apostas?

Estamos na fase de mudança, a tecnologia está a ganhar cada vez mais terreno e o streaming teve um crescimento brutal em relação à televisão. O que não tem mal nenhum, pelo contrário. Existe mais mercado e mais oportunidade para fazer coisas que a televisão não permite. O facto de Portugal estar, finalmente, a seguir esta tendência faz com que cheguemos a mais tipos de público, que surjam mais projetos e que cheguemos a um mercado fora de Portugal. Acho que, nessa área, estão a chegar anos de mudança positiva a Portugal.

Apostaste na tua formação enquanto ator, não só na Escola Superior de Teatro e Cinema mas também noutros países, como os EUA e o Reino Unido. Que importância atribuis à formação de um ator? E sentes que a formação fora do nosso país foi crucial para a tua aprendizagem?

Existe sempre este dilema em relação à importância da formação artística. A minha opinião é que é sem duvida essencial, e foi a melhor coisa que eu poderia ter feito. Acredito, obviamente, que é possível ser ator sem formação, e temos ótimos casos disso em Portugal. Mas se têm o talento, estudar, conhecer coisas novas apenas trará novas aprendizagem e irá potenciar esse talento. É muito importante enquanto artistas, estarmos em constante desafio, estudo e sede de saber mais. Senão ficamos no mesmo sitio. E foi isso que senti antes de ir para a ESTC, que precisava de saber mais. Este tipo de aprendizagem dificilmente conseguimos sozinhos, precisamos sempre de alguém que nos guie por um caminho. E podemos, por vezes, não nos identificar com esse caminho, procuramos outro. E no final temos uma noção melhor por onde queremos ir, algo que dificilmente temos sem formação. Em relação a ter feito workshops pontuais lá fora penso que valeu principalmente pela parte cultural e pessoal. Existe uma ideia de que “estudar lá fora” é algo incrível e que a formação lá fora é sempre melhor que cá. É um mito que gostaria que um dia deixasse de existir. É claro que as melhores escolas do mundo se encontram nos EUA, Inglaterra, Alemanha, mas grande parte das escolas destes países não têm qualidade pedagógica ou artística. Essas escolas são as escolas de mais fácil acesso. Mas estas escolas não conseguem rivalizar com as de difícil acesso que muitos poucos conseguem entrar, principalmente estrangeiros. O estudo lá fora conta muito pela experiência de sair da zona de conforto, mas a nível pedagógico tem que ser muito bem escolhido.

No cinema, pudemos ver-te em algumas curtas-metragens e na longa-metragem “Soldado Milhões”. Em 2020, estreia “Bem Bom”, onde terás uma participação especial. Gostavas de fazer mais cinema? Se te pedíssemos para indicar um género e um realizador preferidos, em Portugal, com quem pudesses trabalhar, quais seriam?

Ainda não tive muita oportunidade de trabalhar em cinema e é sem dúvida alguma um dos meus objetivos. É difícil dizer com quem gostava de trabalhar neste momento porque existem tantos géneros, mas talvez, se tivesse que dizer um nome, Marco Martins.

Estás neste momento em cena com a peça “Última Hora”, no Teatro Nacional D. Maria II. Como encaraste este desafio?

O convite para fazer o “Última Hora”, surge logo depois de estagiar como ator durante um ano neste mesmo teatro. Após um estágio ficamos sempre desamparados sem saber bem o que vamos fazer depois, mas, felizmente, surgiu este convite por parte do Gonçalo Amorim e do Tiago Rodrigues. Esta peça, uma comédia, vem contrastar com tudo o que tinha feito no último ano, o que se traduziu numa ótima experiencia. Trabalhar com Miguel Guilherme, Maria Ruef, o elenco residente do teatro, e o novo elenco estagiário, sob a direção da equipa do Teatro Experimental do Porto, é sem dúvida uma honra. Muitas experiencias e pessoas diferentes. E conseguir estar um mês e meio durante uma pandemia foi uma bênção. 

O teatro assume uma importância muito grande na tua carreira, uma vez que já interpretaste mais de uma dezena de personagens nos palcos, ao longo dos últimos anos. Como vês o atual estado do teatro – e da cultura, no seu todo – no nosso país, sobretudo com as consequências desta pandemia?

Penso que em tempos de crise um dos setores mais afetados é o da cultura, claro que a restauração e o turismo também. A cultura é vista como um luxo e não como uma necessidade. Neste momento entre televisão, teatro e cinema, o teatro é o mais frágil. Por não haver apoios, por não haver estabilidade, por não haver oportunidades. Um jovem sai da escola de teatro sem rumo e possibilidades. Agora em pandemia os espetáculos são cancelados, adiados, reduzidos. Jovens e veteranos artistas são obrigados a procurar trabalhos fora da área para pagar contas, enquanto fazem criações à noite sem qualquer apoio. Trabalhamos a recibos verdes para o resto da vida. De 3 em 3 meses não sabemos o que vamos fazer depois. Passamos temporadas sem conseguir trabalhar na área. Artistas com boa formação e muito talento passam vidas sem conseguir trabalhar. Muitas vezes recebemos “à bilheteira”. E como é que o estado nos vê? Como um luxo. Um luxo descartável que não é uma prioridade. Estamos muito atrasados em relação ao resto da Europa. Os artistas de teatro em Portugal sobrevivem, não vivem.

Para além de ator, és ainda músico e integras a banda “HERA”. De que forma descreves este projeto? E como é que ele surgiu na tua vida?

Este grupo de pessoas foi das maiores surpresas nos últimos anos. Eram meus colegas na ESTC, também atores. Sinto que houve uma conexão natural que nos juntou para formar esta banda. E isso mostra-se na maneira como fazemos musica, é tudo muito natural e, esperamos, sincero. Fazemos músicas originais, em português, não sabemos ainda definir o género. Temos 2 músicas já gravadas e no Spotify, Youtube, etc. Mas neste momento estamos a gravar o nosso primeiro EP que esperamos que saia o mais rapidamente possível.

Se tivesses de referir as tuas maiores influências a nível artístico e pessoal, quais seriam?

A nível pessoal sem dúvida a minha família e a Sofia Espirito Santo, a pessoa que me apresentou ao mundo da representação. A nível artístico começaram por ser artistas de cinema que admirava como Marlon Brando, Daniel Day-Lewis. Agora influenciam-me também professores, colegas, como João Grosso.

Quais são os teus objetivos para o teu futuro profissional?  E o que te imaginas a fazer daqui a 10 anos?

Quero principalmente encontrar uma espécie de estabilidade e progressão. Gostaria muito de conseguir continuar a trabalhar em todas as áreas da representação, principalmente teatro. Em relação à banda consigo imaginar-nos a conseguir gravar mais álbuns e a termos espaço no mundo da música portuguesa para mostrarmos o nosso trabalho.

Para ti, quais são as grandes diferenças entre o Pedro que conhecemos em “miúdo” e o adulto de hoje?

Claro que sim. Tirando a altura, os 4 cabelos brancos, a carta de condução e mais quilometragem nos sapatos, acho que principalmente existe uma certeza do caminho que quero seguir. Continua a vontade e a curiosidade.

Miúdos que já São Graúdos
 com Pedro Moldão

Por André Pereira e Joana Sousa
Novembro de 2020