COMING UP | How To Get Away With Murder
Esta é a
série campeã das reviravoltas e a mãe dos plot twists. How To Get Away
With Murder até pode ter perdido o rumo em alguns momentos ou ter tido um
declínio de popularidade, mas uma coisa que nunca vamos poder dizer é que nos
faltou sumo para comentar. De argumento que já levou atores ao Emmy até à queda-livre
em que nada parecia realmente encadeado, esta finale season foi
uma tentativa de retorno às origens, que talvez não tenha corrido da melhor
forma. Num turbilhão de crimes e de uma justiça que parece cega, How To Get
Away With Murder despede-se com pouca glória e muito romance num texto bem
mais próximo do estilo Shondaland do que foi até então. Mantém-se a identidade,
mas perde-se a essência. Abre-se o debate, e a acusação é simples: A série foi
esticada, puxada e levada ao extremo, em que o cansaço e a repetição falaram
mais alto. Mesmo assim, conseguiu encontrar forma de oferecer aos fãs uma
temporada final digna. Muito confuso? Não é para menos. Vamos explicar!
Quando uma
temporada final ainda perde tempo a dar contexto a novos personagens é de desconfiar.
Por mais interessante que Teegan seja, o timing para ela aparecer foi
totalmente errado. Ela é provavelmente uma das figuras mais interessantes da
série, mas chegou tarde demais roubando espaço aos arcos principais, que a poucos
episódios do fim ainda pareciam ter um desenvolvimento bem superficial que pouco
ou nada de novo nos tinha acrescentado. Teegan é mais uma das power woman
apresentadas por um guião que sabe como construir uma mulher de sucesso sem a
tornar em alguém rude, ou machista. Tem os seus complexos e problemas bem
definidos, e um passado que parece ser bastante interessante, num casamento
falhado com uma agente do FBI enquanto trabalha para uma empresa que serve de
fachada a vários golpes. Tudo isto dá-lhe um background que justifica,
claramente, o seu bilhete para o elenco fixo de uma nova season, caso
não estivéssemos a apresentar os capítulos finais de uma história que já é um
puzzle gigante, com uma quantidade enorme de nomes envolvidos, e com muitos
arcos que necessitam de uma larga ginástica de texto para serem encerrados de
forma coerente. Agradecemos a oportunidade de conhecermos alguém como Teegan, e
aplaudimos o trabalho de Amirah Vann, mas os autores deviam tê-la incluído
noutra fase da história!
O caso torna-se,
ainda, mais preocupante quando o tempo de tela entregue a novas personagens
como Teegan, Cora ou até à irmã de Asher, poderia ter sido utilizado para dar
alguma envolvência e justificação ao arco de Laurel. Apesar da trama ter pedido
alguma capacidade de reinvenção e ritmo depois da morte de Wes, tudo parecia
seguir a mesma linha consistente que foi criada até ali. Até que chega o final
da quinta temporada, e Laurel desaparece sem deixar rasto, sem que isso fosse espectável
para aquela personagem. Todos os elementos do Keating 5 têm devaneios ao longo
da narrativa, atos impulsivos e até comportamentos inconsequentes, mas nada
disso parece ser plausível na hora de entendermos o desaparecimento de Laurel.
Por mais que o pai a atormentasse e que o medo que algo acontecesse ao seu filho fosse grande, não há momento nenhum
durante os episódios que nos faça acreditar que ela está a planear fugir, que
ela pretende abandonar o grupo, ou que ela está, sequer, pronta para começar de
novo. Até podíamos justificar que a surpresa seria mesmo essa, mas neste caso
há uma falta de coerência que não liga uma coisa à outra. Soou como uma jogada
de bastidores, um possível afastamento do show por parte de Karla Souza.
Porém, acreditando que seja esse o caso, numa série que fala sobre morte e
assassinato, teria sido uma jogada muito mais segura eliminarem a personagem do
que manterem-na apenas como um instrumento do famoso Deus Ex Machina.
Viola Davis ganhou
um outro estatuto perante o público com Annalise Keating, para além do carinho
e dos galardões da crítica, a atriz teve uma entrada direta para os tops das
listas de favoritos de quem assiste produções de Hollywood. Ela foi a grande
espinha dorsal de How To Get Away With Murder que, mesmo em momentos em que
o texto traiu a confiança e qualidade que lhe foi dada nas primeiras três temporadas,
conseguiu fazer-nos render à sua brilhante interpretação. Como já é marca
registada do show, os discursos feministas continuaram, e o monólogo
interior de Annalise no 14º capítulo é, provavelmente, um dos melhores momentos
de toda a série. É um crescimento de personagem que foi feito debaixo dos
nossos olhos. Todas as dúvidas e interrogações que Viola entoa são coisas que,
enquanto espectadores, já tínhamos perguntado ao ecrã. Para quem é um fiel
seguidor, sabe que um dos momentos mais impactantes aconteceu quando Annalise retirou
pela primeira vez a peruca, mostrando-se como é, por detrás da mulher poderosa
que nos apresentou até ali. Agora, voltamos a bater nesse tema, mas desta vez
acompanhados pelo discurso da protagonista que desmonta o peso que a imagem tem
sob o público, ou neste caso sobre os juízes. Há espaço para avançarmos na
história, há tempo para uma abordagem semiótica e, ainda, espaço para encontrarmos
no texto o peso do que é, de facto, ser mulher, tudo isto num monólogo de
vários minutos que é uma ode ao talento de Viola Davis e um balão de oxigénio
para os espectadores que já perderam a esperança de encontrar a mesma linguagem
do início, este foi o bombom dos argumentistas.
Dentro e fora do
ecrã, Aja Naomi King tem-se confirmado como uma excelente aprendiz ao seguir os
passos da sua mestre, Viola Davis. A série até pode ser toda centrada em
Annalise, e Viola até pode ser a grande fonte para mantermos o interesse na
história, contudo, nesta última season, quem reinou foi Michaela. Por
mais que fosse desnecessário introduzir agora o pai da aspirante a advogada,
este foi um ótimo pretexto para percebermos que Aja Naomi tem fôlego suficiente
para aguentar as cenas sozinha. A evolução de Michaela já se notava desde a morte
de Wes, mas agora foi o auge da personagem, e um bom reencontro com as suas
ambições iniciais. Finalmente voltamos a ver a Michaela que não deve nem teme.
A Michaela que vai até ao fundo para alcançar os seus objetivos e que tem um
foco bem definido sobre aquilo que ela vê como o seu destino. A química com
Asher foi uma das maiores descobertas da série e, apesar de não ter seguido o
caminho que devia, ofereceu-nos cenas ótimas que nos deixam a desejar uma produção
com Aja Naomi King a solo. Por outro lado, Connor, que durante a luta de
Annalise com a Suprema Corte foi um destaque positivo, voltou a perder-se no
enredo, sem um lugar definido e voltando ao seu papel de pingue-pongue entre a culpa
e o medo. Foi tão relegado para segundo plano que a relação que tanto apoiámos
com Oliver tornou-se em algo completamente banal e secundário. Valeu-lhe o
final, talvez o mais surpreendente de todos, para nos deixar memória do
personagem que no início era um dos que mais pano tinha para mangas. Connor
tocou num assunto importantíssimo nesta fase: A ansiedade, e as consequências
que podem causar no nosso corpo. Um bom ponto que se perdeu na aceleração dos
últimos capítulos e que vale a pena mencionar, mas que, também, teria valido a
pena explorar com a devida atenção.
No resultado
final, o encerramento ofereceu-nos tudo aquilo que esperávamos. Deu-nos plot
twists, que se adequam ao estado atual da narrativa, que está numa fase em
que é mais uma telenovela que uma série, e fez jus ao título, com os anti-heróis
a safarem-se dos crimes que cometeram. Tudo isto estaria ótimo, se não sentíssemos,
até ao último capítulo, que estamos a correr em contrarrelógio num ritmo muito
estranho e que em nada dignifica o caminho que How To Get Away With Murder fez
até chegar aqui. Não entrega algo completamente sem nexo que nos deixe dúvidas,
mas parece pouco para um argumento que nos obrigou a pensar dezenas de vezes
com milhares de equações diferentes, durante várias temporadas. É mais uma
produção que entra para a lista de séries que nos conquistam com um início bombástico,
mas que terminam com mais pontos negativos que positivos. Um potencial deitado
por terra que, apesar de tudo isto, não invalida que esta seja uma boa sugestão
na hora de aconselharmos um novo show, até porque Connor, Annalise,
Michaela, Wes, Laurel, Asher, Oliver e companhia, merecem a justiça de serem
vistos!
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