COMING UP | Katy Keene
O mundo do Archiverse
é como um jogo de SIMS com expansões infinitas e que promete ter uma voz
diferente da maioria das produções que se fazem por aí, mesmo com a influência
de algumas séries e filmes da era atual que se tornaram consulta obrigatória
dentro dos fãs do género mais teenager. Katy Keene é a irmã mais nova do
universo de Riverdale mas já chega com o brilho da ousadia e a certeza
de que vai pisar terrenos bem mais controversos do que as suas companheiras.
Neste terceiro spin-off podemos começar a achar que é um abuso de
popularidade de um show? Talvez, mas até agora cada storytelling
de Roberto Aguirre-Sacasa tem vincado bem a sua linha e provado que no final
todas as séries deste grupo dão um contributo para que tudo se torne credível e
com sentido, o que já vem sendo raro com a quantidade de multiversos que se têm
criado na CW. Katy Keene é um risco contido até agora dentro das
adaptações da Archie Comics, porém chegou a vez de vermos no ecrã um
argumento que transpira liberdade e usa a voz de uma franquia de sucesso para
tentar mais uma vez quebrar barreiras. Temos sucesso à vista? Ou será só um
conjunto de várias inspirações que criaram uma boa história?
Mesmo que
voltada para outro público e sem o peso de pretender ser um ícone, a trama foi
beber à mesma fonte que Sex and the City. A forma como a narrativa dos
vários núcleos nos é apresentada e como depois todos se unem na promessa de um
sonho é bem próxima da novela que acompanhamos no grande e pequeno ecrã com os
amores e desilusões das quatro protagonistas da série dos anos 2000. Mas por
mais que o drama de Sarah Jessica Parker já fosse uma mina de inspiração, os
guionistas não se ficaram por aí e ainda cruzam caminho com outro clássico
moderno: The Devil Wears Prada. E aqui ainda são mais notórios os
pormenores semelhantes, desde os planos da protagonista a chegar ao trabalho e
se maravilhar com a beleza da moda, até ao visual da patroa Glória, para quem
Miranda Priestly é uma clara influencer fashion neste universo. Katy
fica no meio termo entre os talentos e a ousadia dos looks de Carrie Bradshow e
a vontade de mostrar todo o talento, da mesma forma completamente louca com que
Andy Sachs tentava agradar Miranda. E para completar todo as parecenças, há ainda
uma outra empregada que veste a mesma pele que Emily Blunt usou no
filme. É claro que nos baseamos maioritariamente em coincidências, mas Riverdale
já provou nas suas várias temporadas que não há acasos nas suas histórias e por
isso sim, estamos perante uma nova versão de The Devil Wears Prada, com
todo o mérito e responsabilidade que isso pode trazer para o futuro da série.
Saindo da bolha da personagem título, Josie McCoy conseguiu finalmente mostrar-nos que é mais do que uma boa cantora, entregando finalmente alguma profundidade à personagem que andou a marinar durante várias seasons como alguém que servia apenas para dar voz de fundo aos romances de Archie e companhia. Com um elenco tão variado, faltava-lhe espaço para conseguir ser mais do que coadjuvante, todavia nunca lhe faltou o talento para nos oferecer mais do que a voz. A saída de Ashleigh Murray é apenas mais uma prova de que há potencial para algumas das figuras da série crescerem, e por isso não será de estranhar que Kevin seja o próximo a comprar passagem para New York. Aqui Josie ganhou o espaço para que o seu arco seja contado de uma forma muito mais lógica e credível e com momentos que fazem lembrar Empire, será uma estratégia para conseguir conquistar os fãs depois do final da série na FOX? Falando em FOX, num plot onde se fala das várias artes, os momentos musicais ficaram bem próximos das sequências de dança de Glee e Smash, e é nessa onda de nostalgia que encaixa Ginger, aquele que é um dos personagens que com o devido desenvolvimento poderá levantar bandeiras e elevar a mensagem da série por caminhos bem maiores. Ginger, é um travesti, um rapaz confortável com a sua sexualidade que luta por um caminho na Broadway e que vem trazer para a mesa os estereótipos do meio artístico e a eterna discussão do: Talento vs Imagem. E se destes três já temos sumo para antever alguns momentos épicos, Pepper, a influencer, ainda está a lutar para ficar nos mesmo páreo que os restantes coprotagonistas, transparecendo até agora como uma simples figurante que poderia estar colocada neste show ou como uma das amigas de Beck em You.
O quarteto não
tem a mesma alquimia que os seus paralelos em Riverdale, mas mesmo assim
não chega a ser tão insipido como o grupo de amigos de Sabrina em Chilling
Adventures of Sabrina. Falta-lhes alguma envolvência e até algum carisma
que revele uma base de verdade na amizade entre eles. Pode até ser fruto destes
serem apenas os primeiros capítulos e desta ser a primeira vez que o elenco
contracena junto, mas sente-se a falta de ligação que faz com que o que nos é
contado se desvaneça nas suas contracenas. E tudo piora se falarmos do
interesse amoroso de Katy, cuja química entre os dois é nula. Lucy Hale tem a
aparência perfeita para a personagem e o namoro com a câmara é perfeito, mas
sobretudo no pilot existiram momentos em que ficou mal na fotografia.
Sobretudo nos minutos finais do episódio em que lhe é oferecida uma nova
proposta de trabalho, em que o talento da atriz foi “passado a ferro” por uma
versão infantil do encontro entre a Cinderela e a sua Fada Madrinha. Josie,
conseguiu uma melhor conexão, mesmo que fosse a personagem que menos
necessidade tinha de se ligar com os restantes, contudo mostrou que conseguiu
aproveitar toda a bagagem que trouxe de Riverdale. Jorge/Ginger
destaca-se como personagem individual, mas no grupo ficou tão acanhado quanto
as restantes. É sem dúvidas um dos grandes pontos a melhorar no contexto do show.
Riverdale
foi o laboratório para o showrunner entender o que poderia funcionar e,
também, para entender o que faz sentido desenvolver dentro e fora da narrativa
de Archie, Jughead, Verónica e Betty. Se até à chegada de Chilling
Adventures of Sabrina, o guião de Riverdale parecia uma salganhada
de géneros que apontavam em vários sentidos sem nunca se focar realmente num,
agora as ramificações vieram finalmente definir o trajeto que Roberto
Aguirre-Sacasa aproveitando as experiências para dar agora uma identidade única
a cada uma das adaptações. Todo o arco do Gargoyle King foi arrastado e até acabou
por afastar alguns fãs da série da CW, sobretudo pelo lado sobrenatural que não
parece casar com o argumento de Riverdale mas que serve agora de
essência às aventuras de Sabrina Spellman em Greendale, dando espaço ao criador
para dar asas à sua criatividade nesse spin-off e deixando Betty Cooper
muito mais focada naquilo que é a essência de Riverdale: o Mistério. Por
outro lado, os episódios musicais que muitas das vezes acabavam por saturar os
seguidores da história-mãe pelo facto de serem apenas fillers que pouco ou nada
ajudam no desenrolar da trama, podem ter também os seus dias contados, porque Katy
Keene é, sem dúvida, um palco muito mais indicado para a arte.
A CW tem alguns
problemas em gerir os seus sucessos, tentando muitas das vezes espremer sumo
quando já tudo secou. The Vampire Diares já está no seu segundo spin-off,
o Arrowverse continua a estender-se com novas adições de ano para ano, e
Riverdale é apenas o mais recente exemplo deste exercício. Até agora todas
parecem ter alguns pontos que nos façam sentir a diferença entre elas, mas Katy
Keene chega com o lembrete de que poderemos estar próximos da saturação
deste género e de chegarmos ao cúmulo de acharmos que estamos a assistir à
mesma série várias e várias vezes, sobretudo quando, agora, temos uma
personagem comum entre as duas. Katy Keene é bom, tem uma premissa
ousada, contudo poderá sem necessário algum ingrediente a mais para nos fazer
prender ao ecrã por uma temporada inteira. O pontapé de saída e as bases são
boas, mas é hora de trabalhar na diferença!
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