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SETE FILMES POR SEMANA - COMING UP | Never Let Me Go


Never Let Me Go é um filme surpreendente que mistura ficção científica, mistério e romance. Apesar de, inicialmente, dar a ideia que ocorre num mundo alternativo, a história é muito real e prende-nos pela sua crueldade. É cruel porque fala-nos de algo comum a qualquer ser humano: todos nós, enquanto humanos, temos um tempo limitado aqui. E, portanto, a história dos três jovens transforma-se rapidamente na história da nossa humanidade. Este é um filme que nos obriga a observar, porque até os próprios eventos são passíveis de diferentes interpretações e nem os personagens sabem toda a verdade da sua existência. 


A nível técnico, o filme é visualmente bonito, apresenta uma fotografia com planos abertos de belas paisagens acompanhadas da ótima banda sonora de Rachel Portman. Never Let Me Go é um drama social adaptado de um aclamado romance de Kazuo Ishiguro por Alex Garland, com direção de Mark Romanek que nos conta uma história em que o  segredo - escondido à vista de todos - é misterioso, horrível e, ainda assim, aceite. Os destinos das personagens já se encontram traçados e envolvem-nos para nos magoar e inquietar. No início do romance, a narradora Kathy apresenta-se como cuidadora há quase doze anos e explica ao espetador que quer revisitar as suas memórias, mas não explica o programa de doações ou sequer menciona que os alunos de Hailsham são clones. A partir daqui, desenrola-se uma narração em três partes. 



Na primeira parte, Kathy recorda a sua infância em Hailsham, uma escola que funciona em regime de internato, onde estes são educados com regras bastante rígidas. Neste espaço, os jovens não só estudam e formam amizades, como também são estimulados a desenvolverem o seu lado artístico, com as melhores obras de arte a serem selecionadas para a "Galeria" da Madame Marie-Claude (Nathalie Richard). Assim, os primeiros momentos do filme centram-se na infância destes personagens e no estabelecimento das suas personalidades. As interpretações de Andrew Garfield, Carey Mulligan e Keira Knightley são muito competentes, no sentido em que conseguem incutir um realismo notório em toda a trama e nos fazem sentir uma enorme empatia e compaixão pelas suas personagens e pelo destino que lhes foi traçado.

Num segundo momento, a narrativa avança para 1985, quando os personagens completam dezoito anos e deixam Hailsham para irem viver para um espaço rural que conta com a presença de outros elementos mais experientes. Aí, o trio depara-se com uma realidade diferente. Ao ser confrontada com a sua condição temporária, Ruth entra em desespero e é aqui que é introduzida no filme a possibilidade de quem está apaixonado poder adiar a doação durante alguns anos, se conseguirem provar a verdade dos seus sentimentos.


Nesta altura, Tommy percebe que, provavelmente, as obras de arte feitas em criança poderiam servir para analisar as suas almas, o que pode ser um impedimento para si dado que, não só nunca apresentou grande capacidade para o desenho, mas também porque foi sempre claro que o grande amor da sua vida é Kathy. Enquanto isso, a amizade de Kathy com Ruth fica cada vez mais tensa. Logo depois, Kathy envia a sua solicitação de treino para cuidadores e parte. Por fim, o último terço do filme ocorre em 1994 e traz-nos algumas revelações finais sobre estes personagens. É neste momento que Kathy reencontra finalmente Ruth que se encontra em condições físicas débeis. Este reencontro emociona-os e emociona-nos também a nós, espetadores. 

Never Let Me Go é um filme que faz um sábio comentário sobre a nossa existência, o valor da vida humana e o pensamento de que haverá sempre algo por dizer ou por fazer, restando-nos apenas aceitar as nossas circunstâncias. É uma história que se torna credível por ser monótona e incorporada na vida quotidiana, e apresenta uma realização simples, o que nos permite que nos concentremos na história que nos é contada e no trio de protagonistas, transmitindo diálogos interessantes sobre temas como o amor, traição e aceitação. Com esta história e o seu final surge, essencialmente, uma questão que nos faz pensar: Como seria a vida dos personagens se não tivessem sido destinados a doarem os seus órgãos? 

Joana Sousa