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COMING UP | Onward



Os autores da Pixar têm uma capacidade quase única de fazer pulsar a alegria e a tristeza em poucos segundos de filme. É a marca registada que criou a nossa nostalgia e nos deu franquias tão incríveis quanto Toy Story, Fiding Nemo ou The Incredibles. A Onward falta-lhe a alma para ser um clássico, numa epopeia cheia de contrastes entre algo muito bom e uma pelicula secante. É tão indefinido quanto parece, mesmo que a premissa passe uma mensagem essencial e ainda nos consiga levar às lágrimas. Entramos num mundo fantasioso com dois irmãos, enquanto falamos das mudanças de passado e futuro e do quanto nos desligamos uns dos outros pelo facilitismo do que nos rodeia. É uma ideia interessante, mas fica-se pelo embrulho bonito, num argumento que se despe da imagem que temos da Pixar, para se tornar na, provável, animação  com pior construção da produtora. Falta-lhe atenção, mas tem controvérsia suficiente para nos fazer discutir. Confuso? ‘Bora lá entender o que se passa.

A ciência e tecnologia deitaram por terra os mitos que nos faziam acreditar em histórias como a da fada madrinha da Cinderela ou deuses como Hércules. A magia passou a ser deixada de lado, e neste universo até os Elfos, Pegasus ou Pixies se converteram ao comodismo. O passado das grandes aventuras e sacrifícios deu lugar a uma cidade em que mesmo quem tem asas conduz carros, e os gigantes se converteram a empregados de mesa. Nada que nunca tenhamos visto antes em Shrek, por exemplo. E é aqui que a pelicula encontra o seu maior problema. Por melhor que seja o embrulho, a narrativa transparece como uma manta de retalhos de várias fórmulas que funcionaram antes sem nunca se comprometer a ser verdadeiramente original ou nos fazer pensar para além do óbvio. O primeiro arco do filme narra durante longos e arrastados minutos aquilo que qualquer pessoa pode entender na própria sinopse do projeto, e não foge à matemática básica de um protagonista tímido com dificuldade em se integrar e que procura uma oportunidade para se soltar e ser diferente. É bonito, mas já vimos, e isso só ajuda a tornar Ian numa personagem estereotipada demais e chata.


Por outro lado, Barley é um motor que parece ter sido construído por uma mente completamente diferente da que criou o irmão mais novo. Por mais que seja logo desde inicio carimbado como o gozão que só faz trapalhadas representando a classe sedentária e até aqueles que ainda não encontraram um lugar em sociedade onde se encaixar, consegue a proeza de ser o link perfeito entre passado e futuro e realmente sustentar a troca de humanos por seres místicos dentro da narrativa. O humor pode não ter as melhores saídas, contudo há momentos em que se sente uma ode ao estilo nerd pouco usual dentro da Pixar. É o humor dos geeks que amam Star Wars, Avengers e outros que tais, um fã transportado para um personagem. Barley é um alívio dentro dos momentos em que a ação se enrola, e talvez seja um dos únicos pontos em que conseguimos realmente encontrar uma marca de água da Pixar neste texto. Ainda que no início da história nos pareça que estamos a ver o Burro do Shrek na versão da Disney, com dificuldade em encontrar o tom em que se quer expressar.

A emboscada é lenta e repetitiva, e por mais que a partir de meio do filme toda a nossa emoção já esteja embrenhada com as saudades que protagonistas têm do seu pai, não conseguimos desculpar o quão ridículo se torna o facto de passarem metade do filme a falar com as pernas do seu progenitor. Há soluções descabidas nesta aventura que bem espremida resulta numa releitura de Frozen mas desta vez com dois irmãos, que acabam por entender que aquilo que tanto procuram é na verdade um ao outro. Pelo caminho toda a proposta inicial sobre acreditar na magia, e na autoconfiança torna-se fraca, salvando-se a mãe de Ian e Barley que além de nos fazer rir, ainda serve de exemplo de mãe coragem e de uma mulher que mesmo depois de mãe continua ser mulher, um passo interessante dentro das típicas animações onde o “felizes para sempre” implica que duas pessoas estejam agarradas uma à outra até ao fim dos seus dias.


Já que falamos em mensagens, Onward é o consolo para quem por algum motivo não conseguiu ter um dos seus progenitores na infância entender que mesmo que seja impossível substituir a sua ausência, há sempre quem se importe connosco e nos faça avançar. Nem sempre o que mais queremos acaba por ser aquilo que mais precisamos, e mais tarde ou mais cedo, o destino acaba por nos dizer isso. É o que acontece com Ian, que por mais que quisesse cumprir todos os seus desejos, opta por ceder o seu lugar, a quem precisava de um encerramento. Apesar de tudo, este personagem teve sempre alguém que lhe amparasse as quedas, mesmo que não fosse quem ele queria. O destino volta a unir mãos com a Pixar no final do filme, fazendo do último ato um retrato feliz do que é a vida e das surpresas que ela nos reserva. É um momento de levar às lágrimas, nas emoções expostas ao género que procuramos durante toda a fita. Mesmo que tenha tardado, o final faz com que, em parte, tenha valido a pena assistir à obra. O momento entre Barley e o pai com Ian a assistir, seguido do abraço dos dois irmãos é algo quase poético e uma bonita carta de amor a quem em algum momento se sentiu sozinho.

Com todos os ingredientes no lugar certo, Onward é a prova de que falta um respiro de novidade até mesmo nas animações, e que não serve de nada um plot perfeito se o desenvolvimento se contentar com algo mediano e sem força. Os personagens são bem conseguidos, a mensagem é importante cheia de plot twists que de fantasia têm pouco (o que é ótimo e bem característico), porém acaba por desaguar numa salada russa em que Frozen e Shrek são os ingredientes principais. É tudo terrível? Não, o projeto ainda apresenta uma forma interessante de abordar as diferentes personalidades e fala sobre aceitação, mas não é o bastante para salvar todas as outras soluções narrativas. Queremos mais da energia que a Pixar deixou no final desta longa-metragem. Afinal de contas, queremos que a Teoria da Pixar nos faça discutir as nossas emoções por muito mais tempo. Hora de recarregar baterias, enquanto se preparam as pipocas para a estreia de Soul, a próxima obra original do estúdio, e que parece ter muito mais conexões com os sucessos de Inside Out ou Coco. Em hora de epopeias, saltamos esta.