COMING UP | SONIC
Ainda sem
disfarce para o que resta do Carnaval? Então é hora de vasculhar o roupeiro e
procurar por uma das fantasias que usou em criança, porque um dos maiores
sucessos de sempre da SEGA está de volta e não foi para as consolas! Sonic,
o filme, é mais recente personagem a cruzar a barreira entre os videojogos e
mainstream neste que é um caso de duplo serviço: Temos todo o fan service
que um bom fã dos jogos merece e ainda conseguimos trazer as crianças da
família para o mundo dos clássicos. Sonic é a reunião de pais e filhos
num terreno divertido, mas que não chega a ser tão criativo como a narrativa de
Detective Pikachu, mesmo que garanta uma hora e meia de pura
descontração. É tão condensado quanto os easter eggs obrigam, e mesmo
com todas as referências lá não deixa de se tornar numa película coesa e leve,
com um ritmo apropriado para o Flash do mundo dos games. Do início ao fim
é-nos colocado o travão nas expectativas de quem espera algo de muito elaborado,
porque é fácil de entender que estamos perante o primeiro capítulo de uma
corrida maior do que o espaço de um filme, e que as grandes novidades e reinvenções
que podem surgir neste universo são trunfos a utilizar mais tarde, com o
retorno da opinião dos fãs e o orçamento adequado. Depois de toda a polémica, Sonic
vem mostrar que manter o hype em baixo e ouvir a voz de quem vibra com
um personagem pode trazer bons frutos. Sem medo de errar, Sonic chegou
em alta velocidade, mas será que tem multas nesta estreia?
Quem é gamer
não se vai desiludir, ao contrário do que os primeiros rascunhos faziam prever.
O mundo dos jogos está a rebentar aos poucos dentro da indústria do cinema, e Sonic
parece ser mais um acerto dentro desta nova tentativa de reverter o universo geek
em grandes Blockbusters. Neste caso, todo o prólogo da
longa-metragem carrega a fidelidade que todos temíamos que não fosse acontecer.
Nos primeiros minutos temos logo de caras um dos cenários clássicos a ser
recriado em “live action” mostrando que não vamos assistir às típicas
adaptações totalmente livres, onde a máquina de Hollywood desfaz a mitologia
que o jogador já conhece de antemão. A realidade da fita chega até a ser mais
próxima dos videojogos do que a própria série animada a que assistíamos em
criança na SIC. Aqui, é-nos provado que existe o mesmo multiverso louco, e as
mesmas personagens, a mesma raiz, mesmo que ainda não tenha sido mostrado de
forma equilibrada. Já temos tudo isto, mas parece serviu como um penso rápido
para descansar os fãs e deixar em aberto que tudo será melhor explorado nas
sequências. Até porque por mais interessante que seja a personagem de James
Marsden, convenhamos que ninguém que seja realmente fã quer realmente comprar
um bilhete de cinema para ver os desenvolvimentos amorosos entre o Senhor
Donuts e a Miss Pretzel. Queremos sim mais referências como a dos icónicos
anéis de teletransporte, que foram usados de forma brilhante dentro de uma
aventura com seres de carne e osso. Os argumentistas parecem saber que a nossa
vontade é essa e basta olhar para as cenas pós-créditos para saber que podemos
respirar de alívio nesta parte.
Para quem esta
alienado deste mundo do ouriço azul e procura só um bom filme para passar o
tempo, também vai conseguir uma experiência que valha a pena. Perde, claro
alguns pormenores no background que fazem toda a diferença e elevam a
qualidade do projeto, mas em nenhum momento influenciam o decorrer da narrativa.
Este é de facto um dos maiores acertos da Paramount: Conseguir um filme que
chegue a todos os públicos. Apesar de ser tudo muito raso, até mesmo no humor,
há um bom plot por detrás de tudo. É um tanto ou quanto óbvio e previsível,
mas serve a proposta do filme em entregar uma apresentação do Sonic a crianças
ou adolescentes que podem nunca ter ouvido falar do velocista, ao mesmo tempo
que introduz uma nova franquia no cinema, reaproveitando uma marca que já teve
as suas medalhas de ouro mas parece estar a ganhar pó na vitrine de sucessos do
início dos anos 2000. Não deixa de ser curioso o timing de lançamento, porque
de um momento para o outro e no espaço de semanas temos o nascer de dois novos
produtos que podem ser recordistas de bilheteira num futuro bem próximo. E melhor
que isso, dois títulos vindos do mundo nerd que parece estar cada vez
mais a tornar-se em algo de culto.
No outro lado da
“barricada” temos Birds of Prey que, mesmo que noutra perspetiva, vem
tentar fazer o mesmo caminho que Sonic: Dar início a um sucesso. E chega
até ser curioso comparar alguns dos pontos comuns dos dois filmes. Mas vamos pegar
num pequeno exemplo: O vilão. Quer na adaptação da DC Comics quer na recriação
do universo da SEGA temos um vilão que foge dos padrões comuns e que deixa que
os espectadores não o levem a sério. São jeitos diferentes e abordagens que
servem cada um o seu storytelling, mas mesmo assim cruzam a mesma linha
de mostrar que o vilão pode realmente fazer a diferença quando assistimos a uma
obra. Em Sonic não há restrição etária e isso leva-nos a um vilão
infantil, mas nem por isso a um trabalho pior conseguido. Pelo contrário, Jim
Carrey consegue ser um dos grandes realces da película emprestando toda a sua
loucura a um dos principais símbolos da franquia e conseguindo manter o antagonista
como alguém engraçado sem ser ridículo, mesmo que o próprio argumento não o
ajude nesse sentido. A simplicidade que envolve toda a história acaba por criar
soluções um pouco descabidas, como a escolha de Robotnic como investigador de fenómenos
a mando do Governo. Por mais que os diálogos nos tentem justificar, nada na escolha
daqueles chefes de estado faz sentido. É uma total suspensão da descrença que
leva a algo tosco e que só podia ser salvo por Jim Carrey numa interpretação a
la Jim Carrey. Safo pelo ator, num trabalho um pouco preguiçoso em se
autojustificar e apenas para não se comprometer com decisões que possam ter
consequências menos favoráveis nas próximas tramas que querem explorar.
A construção do
argumento é feita em cima de qualquer rascunho de uma película da Marvel
Studios, mas retirando toda a profundidade, complexidade de realidades, e desenvolvimento
de personagem que existe no MCU. É como se esta fosse uma linha paralela em que
contamos um drama semelhante ao da Marvel, mas para crianças, o público é
cativado pela diversão, pela leveza, excedendo-se na simplicidade deste
primeiro ato. Mas o Copy/Past é notório pela forma como se empregam as
piadas para gozar com a trama e fazê-la avançar, pela forma como Sonic aprende
a lidar com os seus poderes e até pelo simples facto de que tudo nos é vendido
como uma história de origem de um super-herói. Sem mencionar a cena
pós-créditos que revela mais um integrante da brigada, que não deixa de ser um
paralelo interessante com a cena de encerramento do primeiro Iron Men.
No resumo final
das contas, Sonic é um filme que está na média para aquilo que pretende:
Ser o início de algo maior. Feito, claramente, por fãs e guiado pelo coração do
público da franquia, há uma voz ativa em cada easter egg. Não é
necessariamente algo que nos vá surpreender, e não está perto da aposta da
Warner em Pokémon. Mas vale lembrar que no nosso país as animações que
expandiram o universo do ouriço não fizeram de longe o mesmo sucesso que as
aventuras de Ash e Pikachu. Tal como não é preciso uma sondagem para perceber
que na nossa infância o nosso jogo favorito não era Sonic. Talvez por
isso, no resultado final, o encanto e nostalgia não tenham batido no mesmo
ponto que Detective Pikachu. É um projeto feliz e animador para quem ainda
acalenta a esperança de ver alguns videojogos de maior sucesso conseguirem
espaço dentre do Cinema ou das Séries, como The Wicher está a conquistar
na Netflix. Mas provavelmente ainda será precisa uma abordagem menos sarcástica
para não transparecer a marca de água da Marvel na maioria das cenas. É uma boa
média, mas será que tem assim tanto futuro?
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