COMING UP | Little Women [OSCARS]
Little
Women é o sucessor direto de A Star Is Born nesta 92ª edição dos Academy
Awards. A diferença é que aqui a respiração do clássico foi mantida na
época e no guarda-roupa do filme, trazendo inovação na abordagem e no casting
repleto de estrelas de Hollywood em ascensão. Esta é uma película sobre
mulheres, mas ao contrário das outras adaptações da obra, desta vez o objetivo
é romper preconceitos sobre o que é, de facto, ser Mulher. Toda a envolvência é
feita com a mesma mensagem feminista que Suffragette entregou em 2015,
mas contada de um jeito muito mais subtil e menos política. Esta é a premissa
de Little Women: Quatro irmãs, quatro visões, mas sobretudo o olhar para
quatro mulheres do passado e entender quais as decisões que tomariam se
vivessem em pleno século XXI. Não é uma completa adaptação da história original
aos dias de hoje, mas não deixa de nos entregar uma releitura bem original e
até ousada, porque todos sabemos que nem sempre a academia e público têm paciência
para alterações de guião. Mas com tudo isto, merece uma estatueta? Vamos entender!
Este é o plot
certo, no momento certo, para mostrar que por mais que os anos avancem algumas
ideias conservadoras ainda estão bem presentes nas nossas vidas. “You aren’t
pay to think” ou “you can do it, after you have a good marriage” são
só algumas das linhas que nos mostram que os diálogos das anteriores versões de
Little Women estão ali para serem discutidos. E só por este pormenor já
faz sentido que o remake venha ao de cima, sobretudo quando finalmente
estamos a conseguir um equilíbrio da balança entre sexos a nível mundial. Hollywood
pela mão de Greta Gerwig parece ter encontrado a melhor maneira de expor as
mudanças que os anos trouxeram com esta atualização. De pequeno só há mesmo o
título, porque todas as protagonistas têm o seu auge em algum ponto da trama. Têm
espaço para, à sua maneira, romper um preconceito e até colocar o dedo na ferida.
Florence Pugh e a sua Amy são a principal arma do filme mostrando o reverso da
moeda e despindo algum do romantismo tipicamente feminino nas suas contracenas.
“Temos algum poder em quem amamos”, mesmo que nesta personagem a distância
entre o guião deste ano e os anteriores não seja tão notada, foi bonita a nuance
de apresentar a personagem como uma mulher que utiliza as suas próprias armas
para escolher o melhor caminho. Claro que há toda a jornada de redenção, mas
não deixa de ser um dos pontos altos da trama.
A estrutura da família
central do storytelling é outro dos grandes acertos que se vem mantendo
ao longo dos anos e que agora se afirmou ainda mais. Cada uma das quatro irmãs
tem um talento, uma arte que define não só as suas ambições, mas que dá cor às
personalidades. É como se desde os primeiros minutos nos fosse ensinado o que
esperar de cada uma das jovens. Temos Amy e a sua paixão pela pintura, que
deixa no ar a sua independência, a individualidade que é depois mostrada quando
ela diz que temos algum poder em escolher o que amar. Encontramos Meg que
ambiciona ser atriz e que nos entrega um gosto refinado e uma queda para o
dramatismo, deixado claro em cada discussão com o marido. Conhecemos ainda a
inocente Beth e a sua paixão solitária pela música clássica. E por fim, o nosso
primeiro contato com esta novela: Jo March, a autora, a narradora que nos
relata cada momento e a mulher recheada de sonhos que procura uma realidade
diferente sem se comprometer com uma única história. É um subtexto trabalhado
em paralelo com uma maestria que só faz o resultado final ficar ainda melhor.
Bem, mas falando
em personagens, vamos ao elenco que conta com Meryl Streep e a nova Meryl
Streep. Com as devidas ressalvas, Saoirse Ronan é realmente uma diva que se
está a cimentar de produção em produção, que volta a não chocar ninguém ao ser
mais uma vez indicada a um Oscar. Jo March é apenas mais uma prova do
estofo que tem para elevar uma protagonista e do quão bem-sucedida é a parceria
entre ela e a realizadora. Mas voltando à “maior entre gigantes”, Meryl volta a
conseguir aquilo que é aparentemente impossível: Num filme em que pouco aparece
consegue roubar cada uma das contracenas para si, com algumas das melhores
citações da obra a pertencerem-lhe e a confirmar que poderia muito bem ter
conquistado mais uma nomeação no seu currículo. Mas não, desta vez foi hora de
ceder lugar aos novatos e Florence Pugh conseguiu lugar entre os novos nomes a
ter em atenção nos corredores dos grandes estúdios. Amy é louca, ousada, porém
talvez seja um dos papeis mais exigentes dentro do leque de clássicos que Little
Women carrega consigo. Assim como Timothée Chalamet que nos oferece química
com todos os seus pares românticos, com a mesma verdade com que nos surpreendeu
em Call Me By Your Name. Por fim, neste casting Emma Watson foi
quem perdeu. Meg tem background, no entanto tudo se resume a algo bem
simples, deixando pouco espaço para conseguir fazer descolar a sua carreira
para o lugar que merece. É a reunião inversa ao que acontece em The Irishman,
aqui encontramos as rising stars no comando da ação, e não deixa de ser curioso
ver os dois projetos a concorrerem entre si.
Apesar desta ser
uma produção da Sony Pictures e de o tema ser bem mais pesado do que o de normal
um clássico da Disney, a longa-metragem não deixa de deixar no ar o tom mágico com
uma banda sonora incrível de Alexandre Desplat. Assim como os destinos cruzados
entre Laurie e todas as meninas do filme. É um excesso de coincidências que
poderia cair no ridículo se não estivéssemos a falar de um filme despretensioso
que se assume como um romance do início ao fim. Lady Bird foi o grande
pontapé de saída para Greta Gerwig no papel de realizadora, e esta nova
adaptação só vem confirmar a mesma visão que o anterior: É feminino sem se
comprometer com bandeiras, tem um elenco jovem, mas sem se basear em dramas mais
infantis, e sobretudo um cuidado clínico em apontar o dedo a qualquer tipo de
preconceito. Nesta narrativa a solução por não chocar demasiado foi a melhor
opção. Toda a impressão digital da realizadora esta lá no subtexto, para lá do
pano de fundo, mantendo as bases do plot e aventurando-se a desconstruí-lo
nas camadas que deu a cada um dos membros do elenco, dando-lhes o devido espaço
para se destacarem em cima do guião. E tudo isto já é mais que suficiente, numa
obra que poderia sobreviver inteiramente nas costas dos intérpretes.
Little Women parte
para a corrida aos Academy Awards com três grandes injustiças que são as
ausências de Greta Gerwig na nomeação a Best Achievement in Directing e
Meryl Streep e Timothée Chalamet a falharem as merecidas indicações como Best
Supporting Actors. Três grandes ausências que merecem ser colmatadas com a
vitória do galardão de guarda-roupa e Best Adapted Screenplay. Apesar
das seis conquistas, nas contas finais esta é uma película merecia uma atenção
ainda maior nesta season de premiações pela visão diferente que
apresenta, pela abordagem e pela recriação. É o cimentar de vários inícios de
carreira, e ainda a prova de como Hollywood tem muito por onde se expandir.
Visitar o passado é sempre um risco, mas Little Women é uma prova
superada com distinção.
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