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COMING UP | YOU



Depois de uma temporada amarrada como um círculo perfeito, You regressa na mesma essência sexual e psicopatia que nos faz torcer pelo Anti-Herói. Contudo, a Netflix parece não ter sabido gerir a fórmula e ofereceu aos fãs mais do mesmo com pouco sabor de novidade…. Ou pensávamos nós até que todos os plot twists rebentam ao mesmo tempo sem nos dar tempo para respirar e absorver toda a informação. You engana-nos do início ao fim, num loop psicótico que torna a trama numa das melhores séries dentro do género de mistério, e oferece real sentido ao ditado de “lobo em pele de cordeiro”. Há um antes e um depois das duas partes desta nova temporada, porque sim, há uma clara divisão feita para nos iludir e nos fazer criar expectativas para depois nos deixar sem chão. Colocada no universo de streaming, a linguagem inicial de You até poderia parecer sem sentido, até entendermos que todo o plot precisa de ser maratonado para ser o verdadeiro murro no estomago que rivaliza com as reviravoltas da escrita de David Fincher. Greg Berlanti até pode ser conhecido pelas séries do Arrowverse, mas You é claramente a sua masterpiece.

Mas vamos começar pela visão de quem assistiu aos primeiros episódios apenas. Tudo parecia seguir a mesma linha, com a mesma exata estrutura. Mudam-se os jogadores, mas as personagens deste jogo de Xadrez pareciam ter as mesmas funções. Tudo soa a repetição atrás de repetição, chega até a ser estúpido pensar que podiam existir alguns erros de casting no que diz respeito ao novo elenco, quando os mesmos produtores acertaram no ponto ao escolherem Penn Badgley como protagonista. É provavelmente a única interpretação de um serial killer em TV ou no streaming que consegue realmente rivalizar com Dexter e ainda conquistar a afeição do público com todos os seus defeitos. Mas não é ele o problema. Love é de facto um problema para quem compra o bilhete para a montanha russa de You. Esta nova mulher tenta oferecer aos fãs a mesma harmonia obsessiva que existia entre Joe e Beck, mas soa apenas como a substituta, sem o mesmo impacto e com uma fragilidade quase entediante, que nos faz desejar que o seu suposto destino chegue mais cedo. É chato, mas necessário. Victoria Pedretti assume exatamente a mesma pele que Rosamund Pike tem em Gone Girl. Apesar de não ser uma cópia, os paralelos estão à vista de todos, e só temos de agradecer por isso.


E já que falamos em elenco, na lista de paralelos Ethan foi substituído por Forty, Paco por Ellie, Peach por Candace, enquanto Karen e Claudia fundiram os seus papéis para gerar Dalilah. Pode parecer ridículo, mas está lá o mesmo padrão dentro de cada uma das linhas narrativas, a mesma função, apenas com um pouco mais de destaque, carisma e empatia que desliga o spotlight de Joe/Will, para aliviar um pouco da tensão e tornar a série menos solitária. Todas as adições foram boas, mas a melhor, talvez tenha sido Robin Lord Taylor e o seu Will. A atuação esquizofrénica com claras marcas do Pinguin de Gotham não deixam o público indiferente e no meio de toda a loucura, ainda consegue servir como voz ativa dos espectares nas suas conversas com Joe. Além de ouvirmos o pensamento do protagonista, finalmente tivemos oportunidade de argumentar, mesmo que regado com uma dose de insanidade.

Enquanto navegamos no mesmo loop, e achamos que tudo faz parte de uma jogada sagaz para nos provar que há um padrão nos comportamentos de Joe e que todas as semelhanças servem para recriar a mente de um psicopata, cheia de Síndromes Obsessivo Compulsivos e regras metódicas ao estilo da história real de Ted Bundy ou de OJ Simpson, percebemos que tudo muda a partir do episódio 8. Toda a ação foi guardada para aquele exato episódio em que, mesmo com algumas coincidências e contratempos convenientes, consegue oferecer algo de verdadeiramente novo, que não deixa nenhum Sherlock Holmes de trazer por casa indiferente. Temos de entender o que se passou naquela noite, quase como se a estabilidade emocional de quem assiste dependesse disso. Mas ninguém estava preparado para a reviravolta mais surpreende das duas temporadas. Embrulhada com muito mais lógica do que o regresso de Candace, que já deixou todos surpresos.


De um momento para o outro, o guião dá um nó de laço perfeito para nos fazer entender que não há apenas um Joe no mundo e que ele é, na verdade, a vítima dentro do seu próprio jogo. Se no final da primeira temporada, o bibliotecário falava de karma, o argumento acabou por lhe entregar a prova viva de como mentes obscuras se podem atrair. Love, a mulher que nos foi desenhada como um “pão sem sal” é na verdade a dona de uma mente ainda mais distorcia e assustadoramente pior que Joe. Há algumas semelhanças entre eles que obviamente existem por se tratar de uma obra de ficção, mas chega a ser impressionante o quão lógico tudo se torna depois da grande revelação. E até um pouco insultuoso, porque qualquer fã de mistérios pensou: “Como é que não vi isto?”.

É uma loucura, nos vários sentidos da palavra, numa temporada surpreendente em que as referências sexuais talvez tenham sido demasiado excessivas, até mesmo para uma série que gira em torno do sexo. Existem minutos a mais, é um facto que torna a segunda season imperfeita, com muitos pormenores e arcos que poderiam ter tido menos espaço no ecrã, como Candace que foi trazida de volta para depois ter pouco impacto nos traços gerais da história. Não é uma série viciante do início ao fim, o que pode ser um problema para conquistar novas pessoas, e ainda perde alguma da sua magia por ignorar grande parte dos acontecimentos que antecedem a chegada de Joe a Los Angeles. Mas mesmo assim, conseguimos retirar um plot twist brilhante e garantir uma nova personagem para amar.

Dentro da sua vida desequilibrada, Forty consegue o coração de quem assiste pela sua ingenuidade quase infantil ao mesmo tempo que garante algumas das melhores soluções desta temporada. No comparativo, a segunda série mantém o equilíbrio e hype que a primeira deixou, sem deixar transparecer como algo forçado derivado do sucesso da primeira parte da história. A Netflix parece, agora, estar a coordenar melhor os seus hits, afinal de contas nem Élite, Stranger Things, The Crown ou La Casa de Papel parecem ter desiludido nas suas sequências, You é apenas o mais recente exemplo. Será que a qualidade voltou a ser um tema no catálogo do gigante do streaming?