COMING UP | Conta-me Como Foi
As crianças
da música de José Cid tornaram-se adultas e como diria Luís Vaz de Camões,
“mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. A família Lopes também cresceu e
também se mudou, dez anos depois eles estão de regresso à RTP para nos dar uma
aula sobre como as coisas eram antigamente. Já longe da ditadura e com os
excessos dos anos 80 na batuta do argumento os personagens principais regressam
para provar que ainda são uma família portuguesa, com certeza, e que agora que
os filhos estão criados é que chegou a hora de maior trabalho. A essência é a
mesma, cheia de maneirismos e tradições sem perder de vista o contexto
histórico. Está dado o primeiro passo para um dos regressos mais aguardados da
última década.
Destes dez anos
que passaram vieram as cores que dão agora mais dinamismo ao genérico
representando a evolução da televisão à década. Vieram as músicas que preenchem
os cenários, cheios de referências à cultura Pop dos anos 80 e ao rock
nacional. Vieram as discussões sobre a liberdade e segurança e os choques de
gerações na descoberta de um mundo completamente novo, longe dos fantasmas e
ambições do passado. Chegaram novas profissões e até novos elementos à família.
Pois é, apesar do Padre Vítor ter falecido, Isabel procura uma nova
oportunidade no amor, e um parceiro para educar a sua filha. Prometendo ainda
levantar várias questões morais sobre quão aceite é um segundo matrimónio num
país conservador. Toni também não ficou atrás e no meio das suas investigações
jornalísticas, o filho mais velho dos Lopes também encontrou o amor e foi pai.
Já nem Carlos
mora na casa de família. O caçula da família deixou de parte as aspirações de
se tornar escritor e trabalha agora como copy numa agência de
publicidade, enquanto trabalha por fora numa rádio pirata. Mas o ninho de Guida
e António não ficou abandonado, aliás um novo elemento juntou-se à família
durante estes últimos dez anos. Susana foi adotada pelo casal pouco depois dos
acontecimentos da última temporada e é agora a única filha do casal a dividir o
teto com os pais e a avó Hermínia. Mas apresentações feitas, vamos ao que
interessa: A história. Apesar do guião se aproximar um pouco mais do género de
telenovela do que as seasons anteriores, Conta-me Como Foi ainda consegue
ser o ponto de encontro de todas as famílias portuguesas.
Ver a
representação do dia 31 e do almoço de ano novo é um exercício constante de nos
questionarmos: “Quem nunca?”. O retrato é fiel e tão próximo que nos enche a
alma. A Dona Hermínia e toda a sua preocupação com o cabrito é um exemplo
perfeito de como não há história tão real como aquela. Ela é a avó de todos
nós, porque por muito diferentes todas são fruto daquela cultura e daquelas
vivências, e afinal ainda há tradições que nunca podem falhar. Todo aquele
almoço em que pouco corre bem é o espelho das mil histórias que toda a gente
tem para contar sobre as celebrações do Natal, da Páscoa, do Ano Novo, também
tem uma não tem?
Não foi só o
elenco que regressou à série, as personagens realmente foram transportadas com
cuidado e carinho por quem as escreve, não deixando perder detalhes de
personalidade importantes. Mesmo que mais maduros, a essência do Toni, Carlitos
ou Isabel está lá. Quer no gosto de Toni por se envolver em assuntos perigosos,
ou na relação mais ou menos conturbada entre Guida e Isabel. Pequenos elementos
que nos fazem sentir que o último episódio podia ter sido exibido ontem que
tudo ainda continua amarrado da mesma forma. Este é um dos grandes méritos da
série, a par do elenco que somou alguns novos personagens que prometem
fazer-nos soltar gargalhadas, mas que ainda tiveram pouco espaço de antena na
estreia.
Fica sempre a
sensação de perda quando algo tão emblemático não traz de volta tudo exatamente
como estava antes. Faltam algumas figuras na história, algumas que ainda podem
fazer pequenas participações, mas uma grande maioria que faleceu no intervalo
de tempo entre a 5 e a 6 seasons. A mudança de casa e de bairro veio dar
um novo colorido à história e possivelmente mais segredos se escondem por ali,
mas não deixam de fazer falta alguns locais clássicos, como o salão Clara, a
tasca do Fanan ou a fábrica de Ramiro. Mesmo com todas estas faltas, no
primeiro episódio, a nostalgia do regresso desta família e a maneira como tudo
o que é essencial se manteve intacto já é meio caminho andado para nos
esquecermos destes pormenores. É o regresso esperado, e neste primeiro episódio
a missão não poderia ter sido melhor cumprida.
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