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Segunda Opinião | "Humor em câmara lenta"


Nelo e Idália regressaram à televisão portuguesa, cerca de quinze anos depois de terem surgido no Herman SIC. A expetativa era grande, sobretudo para os fãs da dupla, uma vez que as duas personagens sempre foram das mais icónicas criadas por Herman José.

Na nova sitcom, o casal surge acompanhado das duas filhas, do namorado de uma delas, de uma empregada e da senhoria da casa onde vivem. É este o mote para as novas aventuras de Nelo e Idália, a mais recente aposta da estação pública para as noites de sexta-feira.

Vítimas da austeridade, Nelo e Idália mudaram-se para casa da mãe de Idália, em Mem-Martins. Carla, a filha mais velha do casal, autoproclama-se independente, mas não consegue viver sem a ajuda dos pais. Aidinha, a filha mais nova, sonha tornar-se uma cantora popular. O namorado de Aidinha, Elias, é um "pinga amor" e trabalha como DJ. O dia-a-dia da família é assombrado pela presença da senhoria, Anália, uma mulher amarga e desconfiada, que faz de tudo para os tirar da casa.

Ver o mestre do humor em Portugal regressar no papel de Nelo, ao lado de Maria Rueff como Idália, é sempre um bom começo. O problema é quando tudo o resto parece não resultar tão bem… É aqui que a sitcom da RTP1 começa a falhar.

A nível técnico, Nelo e Idália está longe de ser perfeito. A realização opta por alguns planos à mão, muitos deles com um enquadramento estranho. Diferentes do habitual, é certo, mas com ângulos não muito bem conseguidos e que ficam mais próximos de um vídeo amador. Por outro lado, à semelhança do que acontece, por exemplo, com Treze, a qualidade de imagem não é a melhor.

As histórias de Nelo e Idália seguem uma estrutura muito próxima das sitcoms dos anos 90. O facto de estarem tão presas a um formato já ultrapassado, muitas vezes faz com que os textos pareçam ridículos demais e as situações criadas caem no exagero. Em contrapartida, existem diálogos a roçar o genial e que demonstram uma tentativa, por parte dos guionistas, de inovar. Um dos exemplos é quando Herman José sai de personagem e dirige-se a Maria Rueff, tratando-a pelo nome real. 

Ainda no campo da escrita, nota-se que o formato conta com vários guionistas, uma vez que Herman José, Joana Marques, Mário Botequilha, Maria João Cruz e Susana Romana acabam por ter um tipo de humor diferente, entre si. Tudo isto faça com que haja um equilíbrio e as histórias resultem, até porque todos os guionistas da série contam já com experiência em formatos de humor, sempre bem conseguidos no seu guião.

No fundo, Nelo e Idália consegue entreter o público e a essência daquela família está lá. Mas as personagens, apesar de terem o mesmo nível de protagonismo, acabam por não resultar tão bem de igual forma. Inês Sobral traz-nos uma Aidinha crescida e engraçada, com vontade de ser cantora pimba e vingar no mundo da música popular como a “nova Rebeca”.

Já Ana Rita Tristão, no papel de Carla, parece um bocado descolada da família. A atriz acaba por ser demasiado teatral no seu papel, o que por vezes cansa os telespetadores. Também Elias, interpretado por Martinho da Silva, acaba por não evoluir de episódio para episódio, passando a vida a ligar às amantes por telemóvel e a trata-las por “senhor Silva”, entre outros. Destaque para Márcia Breia que consegue aqui trazer-nos uma mulherzinha mesquinha e bastante irritante, pronta a despejar toda a família da casa em Mem-Martins.

Herman José e Maria Rueff são, sem dúvida, o destaque da série. Curiosamente, Herman José foi acusado, durante muito tempo, de querer o protagonismo para si em todas as produções em que participava. Em Nelo e Idália ficamos com a sensação que o ator e humorista anda perdido no meio do resto do elenco, faltando mais cenas entre este e Maria Rueff. A atriz, que na sitcom interpreta um duplo papel, consegue trazer-nos com Idália e Pandora dois universos completamente diferentes, com a primeira a ser rodeada de uma áurea completamente dramática e a segunda numa vertente mais cómica.

Nelo e Idália continuará, pelo menos, ao longo de 25 episódios, a ocupar as noites de sexta-feira da RTP1. Contudo, o público português parece não estar agradado com a aposta. De semana para semana, os resultados de audiência são cada vez pior e, ao terceiro episódio, apenas 273 mil espetadores (com uma quota de mercado de 6,3%) acompanharam as aventuras do casal. Se o ritmo continuar, Nelo e Idália fará um percurso penoso, como se se tratasse de um filme em câmara lenta, algo que a equipa da sitcom não merecia.
 
Segunda Opinião - Edição 46
André Oliveira (Fantastic Televisão)
Uma rubrica em parceria com o Diário da TV