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'A República das Bananas' - A política em musical


Filipe La Féria regressou às grandes produções no Teatro Politeama, com a revista musical A República das Bananas. A peça passa pelos vários momentos políticos atuais, com recurso a trocadilhos, um conjunto de atores eclético e uma banda sonora original. Em cena desde o dia 23 de setembro promete continuar a divertir os espetadores até 30 de junho do próximo ano. 
 
A noite é de outono. Várias pessoas chegam e começam a formar fila à porta do Teatro Politeama, em Lisboa. Um indivíduo acompanhado pelos seus familiares olha para o cartaz e diz: “República das Bananas, um nome bem sugestivo, sem dúvida”. Muitos são os que se dirigem à bilheteira da sala de espetáculos lisboeta, mas já não há lugar para todos. A sessão de quinta-feira encontra-se praticamente sobrelotada. À medida que se aproxima a hora de abertura de portas, a confusão instala-se no átrio. Um burburinho de fundo ecoa pela sala e os vários espetadores, de bilhete na mão, formam uma espécie de ‘funil humano’ para entrar.


A República das Bananas é a mais recente revista musical de Filipe La Féria e Helena Rocha. Procura satirizar a república portuguesa, com referência a acontecimentos políticos atuais e figuras relevantes da nossa sociedade. O elenco é composto pelos atores Rita Ribeiro, José Raposo, Anabela, Ricardo Castro, Paula Sá, Ricardo Soler, Bruna Andrade, João Duarte Costa, Patrícia Resende, David Mesquita e Paulo Miguel. Os 16 bailarinos são coreografados por Marco Mercier e os figurinos da autoria do Mestre José Costa Reis. A produção musical ao vivo cabe ao maestro Telmo Lopes e a direção de orquestra ao maestro Mário Rui.

Já no interior do teatro, o calor é grande, devido aos focos de luz que se encontram a iluminar o palco ainda vazio e com o pano vermelho corrido. Os lugares da tribuna já estão compostos, sendo preenchidos especialmente por uma maioria de espetadores idosos.

Sentadas na 1ª tribuna estão Fernanda Rebelo e Manuela Apolónia. Ambas residentes no Barreiro, as duas amigas olham para o relógio na expetativa que a revista comece. De 67 anos de idade, Fernanda Rebelo é jogadora habitual no Casino do Estoril e costuma vir assistir aos espetáculos com convite. “Eu jogo a dinheiro há muitos anos e tenho sempre vouchers para vir à revista. Já vi quase todas as peças do La Féria”, explica. Já a sua companheira não tem esse hábito. Viúva e reformada, Manuela Apolónia, 70 anos, só vem ao teatro a convite de Fernanda. “Eu antigamente vinha com o meu marido, mas agora é mais complicado”. 

A República das Bananas como espelho da realidade política portuguesa
Enquanto esperam, ambas conversam e comentam que já ouviram falar da produção teatral na televisão. Na opinião de Fernanda, “o espetáculo trata-se de uma questão de política e é para todos os governos, para os que tiram e para os que põem”. Na ótica de Manuela, “cada governo que vem é pior que o anterior e Portugal está a transformar-se numa república para os governantes. Depois o povo quer uma ‘banana’ e não tem”, diz, soltando uma gargalhada. Deste modo, as duas concordam que a temática do espetáculo não podia estar mais adequada ao clima de instabilidade governativa vivido nos últimos meses, em Portugal.

Ainda antes de as luzes se apagarem e o primeiro quadro surgir em cena, Fernanda e Manuela recordam com nostalgia as idas ao parque Mayer e o convívio com o elenco que extravasava o próprio espetáculo. “Era muito diferente do que é hoje. Nós íamos comer uma mariscada e até convivíamos com os atores”, afirmam.


Finalmente, as luzes apagam-se, as pessoas aconchegam-se nos lugares e a orquestra começa a tocar. No palco, surge José Raposo à frente, acompanhado por um grupo de Cante Alentejano. O cenário é o estabelecimento prisional de Évora. O ex-primeiro-ministro, José Sócrates já saiu e João Araújo rapidamente se junta à cena. Visivelmente irritado, o advogado é confrontado imediatamente por uma jornalista do “Correio da Manha” (entoação satírica), que surge acompanhada por um fotógrafo assumidamente homossexual. Entre cantares e trocadilhos, a primeira cena termina com algumas gargalhadas e aplausos pelo meio.

Em seguida, a história continua com uma cena sobre o leilão de Portugal, um episódio d’ A Gordinha Maravilhosa, os conselhos da Avó Chica, uma divertida atuação de Rita e os seus bonecos, não esquecendo ainda os tributos ao Fado, a Carmen Miranda considerada “a portuguesa mais brasileira do mundo” e a João Villaret. 


Contudo, de todas as performances apresentadas, a atuação de Zorba, personagem interpretada por José Raposo foi a que mais agradou a Fernanda e Manuela. Inspirada no filme de 1965, Zorba, o Grego, a atuação centrou-se no diálogo entre a deusa ateniense e o grego, no qual participaram também Angela Merkel e Christine Lagarde, enfatizando as consequências de uma ‘Grécia em ruínas’ e para a qual não se almeja nenhuma solução. No quadro não faltaram ainda danças típicas e os trajes alusivos à região ateniense.

Dirigido por Michael Cacoyannis, a película da década de 60 do século XX retrata a história de Alexis Zorba (Anthony Quinn), um camponês grego que vive uma história de amor com uma velha prostituta, mas que acaba por morrer nos seus braços, assassinada pelo pai de um dos seus admiradores que se suicidou. “Gostámos muito da dança do Zorba, inspirada num filme grego do nosso tempo. Ele dançava com as prostitutas, era muito giro”, declaram. 

"O teatro não é caro, é ordinário"
Atuação a atuação, o tempo corre veloz e o primeiro ato está concluído. O relógio marca 23h30 e é anunciado que o intervalo será de dez minutos. Nesse período, as duas amigas fazem um “balanço positivo” do teatro, embora lancem algumas críticas ao uso de linguagem mais brejeira. “Eu gosto de vir à revista, mas acho que ainda se dizem muitas asneiras. Antigamente, não se falava abertamente, era tudo codificado e a escrita era mais inteligente”, explica Fernanda Rebelo. Já para Manuela Apolónia, “o discurso banalizou-se, a tal ponto que se diz tudo e mais alguma coisa sem filtro, nas telenovelas, às vezes nem colocam o ‘pi’”. Ao que Fernanda acrescenta, “com o teatro é a mesma coisa: não é caro, mas ordinário”, conclui.  


De volta à cena, os atores ainda têm espaço para mais atuações, como a Balada para um Louco, interpretada por Rita Ribeiro e ainda um quadro representativo de uma enfermaria de hospital que acolhe as chamadas “urgências fadísticas”, no qual surgem Ana Moura, Camané, António Zambujo, José Cid, Mariza ou Carminho a sofrer de patologias nas cordas vocais.


O grande final rapidamente chega. As plumas, os brilhantes e as lantejoulas não faltam e todos os atores se juntam numa coreografia elaborada. Depois de repetido o refrão da canção principal, o elenco agradece e despede-se em apoteose. Corre o pano e volta a subir para o derradeiro adeus. À saída, as duas amigas apertam os casacos e mostram-se felizes com o desfecho das várias sequências. “A próxima será o Tarzan ou a Noite das Mil Estrelas, se tiver convite”, remata Fernanda, enquanto sai em direção à Rua das Portas de Santo Antão.  

Uma reportagem de Carolina Bico
Fotografias: Teatro Politeama

FICHA TÉCNICA
Nome: A República das Bananas.
Género: Revista musical.
Duração: 120 minutos
Local: Teatro Politeama.
Horários: quarta a sábado, às 21h30 e sábado e domingo, às 17h. 
Preços: 10€ (2º balcão); 15€ (1º balcão); 20€ (camarotes); 25€ (2ª tribuna) e 30€ (1ª tribuna e plateia). 
Classificação etária: maiores de 12 anos.