Duplo Clique | "Ídolos: Vozes à sombra"
“Isto sou eu” foi o tema da
primeira gala do Ídolos, cujo
primeiro direto aconteceu no dia 21 deste mês. O programa, que mais edição,
menos edição, qualquer dia é tão antigo quanto a Praça da Alegria, da RTP,
mostrou uma produção ao nível da exigência de “domingo à noite” e assim
permanecerá na grelha, tornando musicais as noites de verão. Os “magníficos
concorrentes” enfrentaram as câmaras “ao vivo e a cores”, proporcionando
atuações de elevada qualidade. Entretanto, para a SIC, a lacuna da concorrência direta é como um geladinho de verão…
que vai derretendo.
Começar
por dizer que Ídolos é “mais do
mesmo” na oferta televisiva é, por si só, uma argumentação preguiçosa. A ideia
ganhou especial relevância quando se soube que Ídolos ecoaria até setembro. Golfinhos
com as Estrelas poderia ser um grande programa, algo nunca visto em
Portugal, tanto pelo local do espetáculo como pelo interessante elenco de
concorrentes famosos. Mas os golfinhos ficaram em terra. Reconhecendo o azar
que bateu à porta da direção de programas de Carnaxide, ao ter de lidar com os
pareceres ambientalistas desfavoráveis à produção de Golfinhos com as Estrelas, deve compreender-se com maior
solidariedade a decisão de esticar o Ídolos.
Longe vão os tempos em que a
programação portuguesa seguia os ventos e as marés da época de verão. Em dias
longos, com o sol a pôr-se às nove da noite, jantaradas na praia e noites
amenas, apetecerá muito ver um programa de inverno? Na emissão de estreia, 855
mil e 800 espetadores (ou)viram, em média, o portento artístico do talent-show, resultado final obtido
depois da novela da TVI libertar a
audiência para a SIC. Ídolos é bem produzido, mas escuro e
fechado demais para o verão (não é por acaso que estreia regularmente em
setembro, terminando no ano novo). Apesar disso, será o único grande formato de
entretenimento a ocupar o horário nobre de domingo – e nesse sentido, a SIC tem nas mãos uma oportunidade que
não deverá desperdiçar.
Quem não deita por terra a
ocasião de brilhar é João Manzarra. Está visto que não precisa de dividir o
teleponto com nenhuma co-apresentadora, até porque é visível o à-vontade que o
apresentador tem durante a condução do programa. João Manzarra imprime
boa-disposição ao formato, estabelece a ponte com o painel de jurados (onde
Paulo Ventura lhe dá contracena) e até consegue tornar natural a conversa de
“encher chouriços” com os concorrentes (sempre necessária para a produção). O
momento Twitter também é divertido,
nem que seja pelos nomes dos utilizadores serem impronunciáveis.
Os jurados apresentam-se mais ponderados
– tanto em presença quanto em poder de decisão. Pedro Boucherie Mendes, Maria
João Bastos e Paulo Ventura comentam as atuações, desta vez, com maior moderação
e não cobrem de elogios todos os concorrentes, pelo menos como se todos fossem
a última voz no planeta. Os concorrentes merecem elogios, sim, pelas prestações
exímias em palco e pelas vozes com que arrebatam o público. Fica a sensação de
que este top de candidatos é o mais
genuíno (como se viu nas VTs de apresentação, criativas e bem realizadas), e o
menos assediado e disputado pelas histéricas claques de fãs.
Enquanto espetáculo musical, Ídolos não desilude. O palco é igual ao
da edição anterior e apresenta outras cores além do azul, o que torna o cenário
mais atrativo. A sua dimensão mais pequena, logo, mais à escala humana,
favorece atuações mais intimistas e permite não deixar tanto espaço nu, com a
introdução do corpo de baile. A banda ao vivo, que produz o instrumental de todas
as atuações, é um sinal do esforço em tornar os diretos mais verdadeiros, como
de resto aconteceu na anterior temporada. Nota menos positiva para a Realização:
apesar de manter o ritmo, ignora completamente a parcela esquerda do cenário,
onde está a banda, mergulhada na escuridão.
A sexta temporada de Ídolos, além de confirmar o ditado “vira
o disco e toca o mesmo”, mantém a coerência de uma programação de
entretenimento apostada em descobrir os melhores artistas de Portugal em várias
áreas. Nessa missão não existe nada de negativo, não fosse o enfado que estes
formatos já provocam nos telespetadores – e cujas audiências, que não atingem
sequer um milhão, são um indício inegável. Ídolos
tem galas bem produzidas e talentos indiscutíveis, mas só irá prender do
princípio ao fim quem torcer fervorosamente pelo seu candidato. O
restante público continuará a ver no Cabo
a salvação das noites que se avizinham bem quentes… a menos que dediquem o
resto da temporada aos clássicos da silly-season.
Ídolos
(T6), para ver
aos domingos, às 21h30, na SIC.
Duplo Clique - 54ª Edição
Uma crónica escrita por André Rosa
Fotos: Fremantlemedia
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