Header Ads

[Cinema] San Andreas - Crítica


Aquilo que pode acontecer e toda a gente ignora. San Andreas estreou nas salas de cinema na quinta-feira, 18, e promete impressionar os adeptos do cinema-catástrofe com um outro nível de grandiosidade. Trata-se de mais uma obra cliché, mas intemporal, por colocar as perguntas mais básicas – “Onde estarei quando tudo acontecer?”. O lugar-comum das obras de ficção torna-se o lugar decisivo para a vida de milhares de californianos, ao depararem-se com o maior sismo registado naquela zona dos Estados Unidos da América.

http://i.ytimg.com/vi/23VflsU3kZE/maxresdefault.jpg

San Andreas ganhou forma pelas mãos do realizador canadiano Brad Peyton, o qual garantiu o realismo do filme e explicou que os exageros visíveis foram propositados. O produtor Beau Flynn (Viagem ao Centro da Terra, 2008) juntou-se ao designer de produção Barry Chusid (O Dia Depois de Amanhã, 2004) no trabalho de conceção visual, o que explica a evolução da obra face a outros filmes do género. A “consistência real” e “pragmática” dos terramotos torna a ação mais credível que a retratada no filme 2012 (Roland Emmerich, 2009), e cientificamente plausível como foi visto n’O Dia Depois de Amanhã. Além disso, San Andreas não cai no ridículo de mostrar casais de velhotes a despistarem-se a 20km/h nem donut’s gigantes a rebolar na estrada. Ainda que haja sequências de ação favorecidas cinematograficamente, os efeitos dos abalos sísmicos parecem tangíveis: vê-se como a fragilidade estrutural dos edifícios os torna absolutamente indefesos e que as personagens reagem instintivamente, como qualquer anónimo faria.


Importa sobreviver. A narrativa épica, assinada por Andre Fabrizio e Jeremy Passmore, explora a sensibilidade humana num tom consistente e pouco forçado. A rutura não começa na terra, mas sim na família: o divórcio é o pretexto para separar personagens, e a luta pela sobrevivência a razão para as juntar. E como na ficção tudo acaba bem, San Andreas dá o seu contributo para restabelecer a fé na humanidade (ainda que as relações, como os prédios, tenham tendência a ruir).

O filme é protagonizado por Dwayne Jhonson, que interpreta o papel de Ray e revela uma faceta dramatúrgica possivelmente desconhecida do público. Afinal, o ator é capaz de exprimir algumas emoções – basta estar afastado das lutas violentas e dos tiroteios para a sua postura parecer normal. Um bombeiro especializado em resgastes com helicópteros e pai ausente, mas preocupado, assim se apresenta personagem. A seu lado contracena Carla Gugino, no papel de uma mãe e ex-mulher resolvida. A química entre os atores é visível e convincente, ou não fosse de facto uma reconhecia atriz. Alexandra Daddario comprova, igualmente, a aptidão para o papel, relacionando a sua personagem, a filha Blake, com a de um jovem arquiteto em princípio de carreia e o seu irmão mais novo (os atores Hugo Johnstone-Burt e Art Parkinson, respetivamente).


Outro núcleo de intervenientes assume igual ou maior importância no desenrolar da ação, permitindo articular as peripécias da família com os estudos científicos que credibilizam e enquadram os acontecimentos. Paul Giamatti é Lawrence, o sismólogo empenhado na previsão científica dos tremores-de-terra, progresso que vem a cumprir, com a sua equipa, para infelicidade da Califórnia. O ator mostra-se irrepreensível na interpretação, com um papel nada desprestigiante para quem já ganhou dois óscares. Ainda assim, todas as personagens se encaixam desprovidas de contexto próprio, constituindo clichés por demais evidentes neste tipo de filmes.


San Andreas é puro entretenimento, mas nem por isso vazio de instrução. Um filme sobre o maior terramoto da costa oeste dos Estados Unidos projeta, primeiro que tudo, um cenário dantesco e quase inimaginável, mas também passa mensagens úteis. As personagens movem-se por entre os destroços e para isso têm de seguir as regras das autoridades. Durante os abalos, abrigam-se debaixo das mesas e na rua procuram caixas de primeiros socorros. A cultura de risco, deficientemente instituída em Portugal, não educa a população para saber agir em caso de catástrofe, e quando o faz só recebe críticas.San Andreas reforça a importância de ter em casa uma mala de primeiros socorros, lanterna, rádio e comida enlatada, relembrando o público do que acontece quando a terra treme.

 

A falha geológica de Santo André, que atravessa a Califórnia ao longo de 1300 Km, foi já responsável por vários sismos e milhares de mortos, o maior ocorrido em 1906. As cidades de São Francisco e Los Angeles poderão ser arrasadas se o evento se repetir nos próximos 30 anos… mas no cinema não demora tanto. O espetador salta da cadeira no instante em que o sismo assola o ecrã. A Realização e a Edição de Bob Ducsay (responsável no filme Godzilla, 2014) marcam um ritmo de planos quase tão trepidante quanto as placas tectónicas, desviando os enquadramentos para mostrar o horror que se passa em torno das personagens. O gemer da terra irrompe violentamente, amplificado pela sonoplastia, envolvendo o público numa experiência imprópria para cardíacos. A tela quase se torna pequena para a dimensão da catástrofe, pelo que a utilização de grandes planos e até zooms é recorrente e necessária. A música original, do compositor Andrew Lockington, dá o tom épico à narrativa.


A narrativa não se desfaz em elogios ao poderio americano, já que a ação não se centra nos postos militares de comando nem na mesa oval onde se discutem ordens de evacuação (até porque não haveria tempo para isso). Mas o pôr-do-sol na baía de São Francisco com o desenrolar da bandeira americana é por demais nacionalista, o toque que faltava ao filme. É a história de uma família americana normal vítima como tantas outras, de laços unidos mesmo que a falha sísmica divida a Califórnia em dois.


San Andreas é o primeiro filme-catástrofe distribuído em 3D, capaz de proporcionar um cinema-pipoca mais estimulante do que se pensa. Se a sala tiver sistema surround, não são precisos os óculos: a cadeira treme na mesma.

Veja (e oiça) o tema California Dreamin’, da cantora Sia, que dá mote ao filme:


 Um texto escrito por André Rosa
Fotos: NOS Audiovisuais (distribuição)