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Crónica FORA DO AR: Não há dinheiro! (I)

Na crónica desta semana interrompemos a nossa viagem pelo mundo e regressamos a casa. Na próxima semana zarparemos com destino à América Latina. Até lá, contentemo-nos com a (triste) realidade nacional, sobre a qual digo já... não gosto muito de falar, pois é-nos servido mais do mesmo, não só na oferta televisiva como nos problemas que nos afectam dia após dia, ano após ano, e por aí fora. Ou seja, não existe evolução, o que neste meio é o equivalente à morte!
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No entanto, com alguma relutância aqui vou eu...
Nos últimos anos, instalou-se um verdadeiro flagelo na televisão portuguesa, o paradigma: “Não há dinheiro!”, que serve como justificação para quase tudo, até para a incompetência.

O problema é que o prolongar desta situação tem levado a que cada vez mais se esbata a fronteira entre o que é provocado pela falta de dinheiro e o que é provocado pela incompetência, gerando uma grande confusão na cabeça de todos, nomeadamente, entre os responsáveis máximos das nossas televisões toldando o seu discernimento. Fatalmente (para nós espectadores), nenhuma estação de televisão escapa. Embora pareça um julgamento muito duro da minha parte, não o é, como verão em seguida!

Claro que no cerne desta questão estão os directores de programas, responsáveis máximos pela programação da nossas televisão, e depois destes os presidentes das estações, que têm a decisão final no que toca à continuidade das políticas e estratégias adoptadas, o mesmo será dizer a continuidade em funções dos respectivos directores de programação.

Comecemos pela RTP1, o primeiro canal de Portugal e o porta-bandeira do serviço público. Esta última condição geralmente leva a um agravamento da sentença sobre a actuação do seu director de programas.

Para falar da RTP1 convém primeiro esclarecer um pouco da minha visão sobre serviço público. A meu ver, o serviço público de televisão deve ser realizado por dois canais, como acontece actualmente, um canal mais abrangente e outro canal mais segmentado. Caso contrário, se quiséssemos encaixar tudo num só canal teríamos algo completamente esquizofrénico e muito difícil de assistir. Pois, um dos factores mais importantes numa programação é a sua coesão e conexão entre programas. Não se pode criar uma manta de retalhos e esperar que esta assente bem!

Por outro lado, sou defensor da continuidade da publicidade na RTP1, e a meu ver deveria ser estendida à RTP2 embora com metade da duração, pois são canais geralmente assistidos por públicos diferentes, complementando-se. Convém destacar que isto seria positivo para os anunciantes e para o mercado.

Embora defenda a existência do serviço público de televisão, não o considero um serviço essencial a ser prestado pelo estado e uma vez que se insere num sector de actividade rentável, deve tender para a auto-suficiência, reduzindo-se ao mínimo o seu impacto nas contas públicas.

Para os opositores que a acusam de concorrência desleal pelo duplo financiamento, pergunto se queriam que a RTP1 transmitisse o máximo de publicidade permitido por lei ou a concorrência de outra estação privada; ou se o que realmente têm em mente é uma situação de duopólio, pois o mercado de publicidade seria basicamente dividido entre SIC e TVI?? E ainda aqueles que pensam que as (parcas) receitas da RTP1 seriam absorvidas na integra pelos privados, salivando por isso, sempre que se fala sobre o seu desaparecimento da estação pública, esquecem-se entre muitas coisas, que a maioria dos anunciantes é “obrigado” a publicitar na RTP1 para marcar presença nos 3 principais canais. Caso a RTP1 deixasse de transmitir publicidade esse dinheiro simplesmente seria poupado e não deslocado para as privadas. A receita adicional que esta medida iria provocar na SIC e TVI seria praticamente nula, pois o problema do mercado publicitário não se prende com questões concorrenciais, mas antes com estratégias de captação de anunciantes e de opções de programação (Faltam programas de relevo que os anunciantes se possam associar, isto é, investir o seu dinheiro), que sem mais demoras passo a demonstrar.

No que toca à RTP1, segundo algumas pessoas esta até tem dinheiro a mais, o que entra em contra-senso com o tema desta crónica. Mas quando olhamos para o orçamento da RTP1, e não para o da RTP, vemos que os valores não são tão diferentes dos dispendidos pelas duas privadas, e se pensarmos que apesar de tudo a programação da RTP1 exige maior esforço pela quantidade/variedade de programas transmitidos percebe-se o porquê do valor ser ligeiramente mais elevado.

A meu ver apesar de alguma variedade na programação esta encontra-se bem longe do aconselhável, e o pior de tudo é que não se tem verificado qualquer evolução positiva a este nível. E também não existem indícios de que se vá alterar a médio prazo.

Um outro problema, é a falta de qualidade da oferta da RTP1, o que é mais grave do que o ponto anterior, porque sempre era preferível “poucos mas bons(programas)". E não pensem que quando digo isto estou a pensar em programas “eruditos”. Não, estou a pensar em programas para as massas mas com formatos inovadores, criativos e bem produzidos e realizados.

Basta ver, os mais recentes exemplos na área do entretenimento: Olha Quem Dança!, O Último Passageiro e Família/Família, de uma pobreza de formato e desprovidos de qualquer interesse que deveria envergonhar qualquer representante de um serviço público. E mais uma vez será uma linha para continuar com as estreias anunciadas de Super Miúdos e O Cubo.

O mesmo acontece na ficção. Não existe qualquer critério na escolha dos projectos, as temporadas são encomendadas sem qualquer teste à opinião do espectador, como se este nem fosse o factor chave nesta equação televisiva. Vemos sucederem-se projectos a vulso, sem qualquer linha orientadora, com histórias que não se demarcam do exibido pelas televisões privadas e que pouco contribuem para a evolução deste sector. Uma rara excepção é a série "Conta-me Como Foi".

Mas se acham que a situação não poderia ficar pior, quando olhamos para o tratamento dado a este tipo de produto, mudamos logo de opinião. Parece que estão condenados a serem emitidos a seguir a um programa qualquer de informação que corta logo pela metade as chances de serem bem sucedidos, aparentemente não são dignos de serem emitidos a seguir ao Telejornal, isto é, na “hora de ouro” da RTP1, e mais uma vez quando poderia ser alternativa à oferta da SIC e TVI cuja ficção geralmente começa mais tarde.

E o mal continua na informação, muitas vezes considerada a “menina dos olhos” da RTP. Os programas extra noticiários, são o elemento que faz a diferença e é neste que uma informação se destaca e evidencia as suas mais-valias.

O problema é que na RTP1 estes espaços penalizam e muito a avaliação da sua informação. Existe um excesso de formatos, certamente que a estratégia de colocar um mini-programa deste género diariamente após o Telejornal é uma das razões, pouco desenvolvidos e acima de tudo pouco actuais, feitos à imagem e semelhança da televisão dos anos 90 ou mesmo 80.

Não existe qualquer ponta de inovação e criatividade, e por isso, sou levado a duvidar da capacidade da informação da RTP. O “Prós e Contras” é o representante máximo de tudo o que a informação da RTP tem de pior, mas naturalmente não está sozinho, porque retirando os noticiários os seus programas de informação especializada acrescentam muito pouco.

Por fim, e para encerrar a lista de problemas da RTP1, chegamos à programação estrangeira, nomeadamente filmes, séries e sitcoms. Mais uma vez não existe cuidado na selecção deste conteúdo. Em primeiro lugar o cinema ocupa pouco espaço na programação e os filmes exibidos acusam em demasia a idade e o desgaste pela repetição, nas séries por aparecerem sempre deslocadas nos horários em que são colocadas e também pelas escolhas feitas que são muito duvidosas (Alerta Cobra??!), e quanto às sitcoms esta simplesmente não existem. Mas não existem estrangeiras nem portuguesas. Curiosamente, não existem sitcoms nacionais na televisão. E isto tudo sem contar com a irregularidade dos horários quer seja das séries (Sangue Fresco foi o exemplo máximo) quer seja das sessões de cinema.

Com tudo isto, percebe-se que o problema não é a falta de dinheiro, mas sim aonde e como o dinheiro é gasto. Se este é mal aplicado, é normal que não surjam resultados, ou que estes não sejam positivos. Não se pode plantar cebolas e esperar que cresçam tulipas.

E se o agricultor não percebe isso, então é melhor arrumar as botas e pousar a enxada.

Hoje ficamos por aqui, numa próxima oportunidade abordarei a situação da RTP2, SIC e TVI, que apesar de tudo não são muito diferentes. O que até dá que pensar...

Como sempre, fiquem em boa companhia,
E não se esqueçam de sintonizar na frequência certa para evitar a ocorrência de chuva!

Por Paulo Andrade