Duplo Clique | "Rédea Solta"

 

A Quinta. Assim se chama o novo reality-show dos domingos à noite na TVI, que tem tudo para funcionar em relação às audiências, e tudo para falhar em relação à crítica e aos padrões do bom gosto. Famosos e anónimos presos numa vida no campo é o que os portugueses querem, sobretudo agora que o país se prepara para atascar em mais uma crise política. A política do pão e circo é de Queluz de Baixo.

Foto: Revista Vip

A estreia de um reality-show na noite de reflexão antes das eleições concretiza imediatamente a ideia de que a televisão serve mesmo para alienar as pessoas. E apesar de Teresa Guilherme, a anfitriã do formato, não querer que as portas abrissem a um sábado, certo é que que esse dia de estreia atípico para este género de apostas não correu nada mal às contas da TVI. Mais de um milhão e 406 mil pessoas ficaram colados à emissão, uma audiência mesmo assim inferior à da estreia d’A Quinta das Celebridades, em 2004.

Foto: Revista Vip

A Quinta onze anos depois já não tem Júlia Pinheiro no comando, mas Teresa Guilherme, a eterna “rainha dos reality-shows”. É ela a apresentadora que tem ideias inconciliáveis com a produção (segundo escreve a imprensa), mas que depois aparece no ecrã com um envolvimento de 200% e a postura que lhe é conhecida. Os monólogos que diz, recheados de trocadilhos, é que já perderam o brilho – e além de se tornarem por demais cansativos ao fim da primeira hora, deixam a sensação de que por momentos Teresa Guilherme está a divertir-se sozinha.  

Foto: TVI

Diversão a rodos é o que promete o guião assinado pelos criativos da produção, que agora contam com personagens humanas e personagens da vida animal. O terreno fértil em cenas ridículas, as condições propícias à promiscuidade entre concorrentes e as intrigas manipuladas estão todas lá. São a palha que vai pegar fogo nas conversas das filas de supermercado e nas “revistas da especialidade”. Os concorrentes anónimos nada têm de especial (para lá dos seus objetivos ocos e a presença televisiva que lhes é fabricada) assim como os concorrentes ditos famosos, que encararam o convite da TVI, muitos deles, como um relançamento mediático contra o esquecimento do público.
 

Foto: Revista VIP

O programa é, na verdade, um rurality-show, que a direção de programas de Bruno Santos julga destinar-se a toda a família. Palavras para quê? A suposição é ridícula, ou ingénua, e mesmo assim alicia as franjas de público mais novo a consumir este tipo de programação televisiva de moral muito questionável. Consiga ou não a TVI sentar as crianças, os pais e os avós no sofá lá de casa, ficará provado, durante os próximos três meses, que o reality-show enquanto formato ainda mostra vitalidade na oferta dos generalistas em Portugal. E isso tem tanto de negativo como de curioso, se, do ponto de vista de uma análise à indústria, percebermos que a TVI atingiu um patamar de profissionalismo e autonomia na produção destes programas de entretenimento.

Foto: TVI

É de puro entretenimento que se fala, e os reality-shows prometem sempre horas intermináveis de companhia às pessoas, permitindo-lhes desafogar o pensamento das preocupações diárias. Perante um público que continua a premiar aquilo que lhe dão – com atitudes mais ou menos hipócritas –, a TVI sabe como investir no aprumo dos conteúdos, surpreender e manter as pessoas fidelizadas. E os anunciantes de marcas de adubos, rações e material agrícola certamente agradecem. 

Todos os dias agora são quinta, disse Teresa Guilherme. E com Peso Pesado Teen em antena na SIC e a estreia de um novo The Voice na RTP, a TVI não deverá ter muita resistência, antes rédea solta. 

A Quinta, para ver aos domingos, às 21h30, na TVI. 

Duplo Clique - 66ª Edição

Uma crónica de André Rosa