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Duplo Clique | "Quem os viu e quem os ouve"

   
Do chuveiro para o palco e do palco para a televisão. Concorreram mais de 12 mil candidatos ao programa-playlist-RFM da SIC. “Factor X” abriu, sem surpresa, a rentrée televisiva de Carnaxide e é sintoma de que a oferta dos canais portugueses em entretenimento vai suspirando as últimas notas. O mesmo se passa no canal ao lado. A grande diferença é que cantar faz bem à saúde pública – mesmo que a “estrela” musical grave um CD e nunca mais ninguém se lembre dela –, enquanto fabricar mais uma pseudo-personalidade dos bares e das montras tabloides não acrescenta rigorosamente nada ao país. Como diz o ditado, “quem canta seus males espanta”. 

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A indústria musical portuguesa não afina pela mesma nota que a do Reino Unido, por exemplo, mas os canais por cá insistem na mesma tecla e querem lançar, à força, jovens talentos no mercado. Num país em que as receitas de música sofreram uma quebra de 17% em 2012 (em contraciclo com a tendência mundial), a produção de programas como “The Voice”, “Factor X” e “Rising Star” no mesmo ano só se explica pelo modelo de gestão financeira das estações televisivas. O público gosta, comenta e partilha. Os anunciantes ganham. Mas onde estão os vencedores das edições anteriores de “Ídolos”? O contrato com a Sony Music Portugal paga-lhes a gravação do CD e não passa daí. Não lhes gere as carreiras que ainda mal começaram, caso contrário teriam uma presença mais frequente junto do mercado e dos ouvintes – salvo a merecida exceção de Filipe Pinto (“Ídolos”, 2009), que estudou na London Music School durante seis meses e tem originais a passar na rádio. E a futura “mega estrela portuguesa”, será ou não cadente?  

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Ainda não se sabe. O episódio de estreia de “Factor X” ainda afina os acordes. Surgiu dinâmico, ligeiro e bem conseguido, fazendo dos concorrentes e das suas vozes os protagonistas de um serão familiar. João Manzarra regressa com pouco sal na fase das audições, pouco acrescenta como apresentador e é o narrador monocórdico das VTs de um programa de música. Iguais a si próprios, Sónia Tavares, Paulo Junqueiro e Paulo Ventura compõem a mesa, nesta edição, na companhia de mais um ícone, Miguel Guedes. O alargamento do painel de jurados é um ponto positivo, se pensarmos que as apreciações mais crispadas são um pingue-pongue suspeito de ser encenado, mas acima de tudo acrescenta outra visão da música e daquilo que o programa procura. Algo que, por maior discórdia que suscite, já se sabe que é um novo produto pop-comercial. É o que vende.

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Intercaladas as atuações com as histórias de vida potencialmente traumáticas e emocionadas dos concorrentes, mesmo assim o programa não foge ao compasso da monotonia. Apesar de não criar grandes momentos de televisão, a realização hábil procura a atmosfera épica que a música merece. A música que “corre nas veias” dos concorrentes e jurados é também a melodia de vários discursos bonitos mas ocos, entoados em lugares comuns, “arrepiei-me muito”, “foste a melhor coisa que aconteceu esta noite” ou “obrigado por seres como és”. Preto no branco, o talento ou se tem ou não se tem – de resto cabe ao público filtrar as mensagens que quiser, à medida que se vai enlaçando emocionalmente com os seus preferidos. Quanto às audiências, a evolução de “Factor X” já não depende do efeito novidade: dependerá da qualidade dos concorrentes e da estratégia dos episódios, incluindo as galas, algo em que o canal falhou na última edição.

Enquanto a SIC anda à procura da pólvora, os concorrentes querem fazer da Música a sua vida. “Factor X” é para ver e ouvir aos domingos à noite, na SIC. 

Duplo Clique - 18ª Edição
Uma crónica de André Rosa